Fenômeno ocorre principalmente nos Estados Unidos, em intervalos variáveis, durando dois a três anos
Por que as abelhas estão desaparecendo? Como resolver esse problema? Essas duas perguntas estão intrigando as pessoas, assim como notícias como as relacionadas ao Distúrbio do Colapso das Colônias (DCC, ou CCD, na sigla em inglês).
O assunto chamou tanta atenção, que a revista Time dedicou uma matéria de capa ao fenômeno, com a seguinte manchete: “Um mundo sem abelhas” (http://bitly.ws/smuV). O desaparecimento cíclico das abelhas é um enigma que persiste há 200 anos.
O engenheiro agrônomo Décio Luiz Gazzoni, pesquisador da Embrapa Soja, membro do Conselho Consultivo Agro Sustentável e do Comitê Científico, afirma que os cientistas continuam estudando para elucidar o fato. “De posse da resposta, será fácil encaminhar as soluções”, comenta.
Segundo o pesquisador, até o momento, o que se sabe é que um conjunto de causas, como perda de habitat, estresse de movimentação, distúrbios nutricionais, pragas e doenças das abelhas e produtos usados para o seu controle, assim como agrotóxicos usados indevidamente, são suspeitos de, atuando cumulativamente, serem responsáveis pelo desaparecimento das abelhas.
“O fenômeno parece restrito ao Hemisfério Norte, principalmente nos Estados Unidos, onde costuma ocorrer em intervalos variáveis, durando dois a três anos, tornando a aparecer décadas depois”, informa e acrescenta que não há registro do fenômeno no Brasil.
Mortalidade
Mesmo em casos de mortalidade de abelhas não associadas ao DCC, as soluções não são fáceis, de acordo com Gazzoni. “Por exemplo, as colônias de abelhas da espécie Apis mellifera são atacadas por um ácaro devastador (Varroa destructor), mas os acaricidas que controlam o ácaro também são perniciosos para esses insetos”, explica. “Até surgir um acaricida seguro para as abelhas, será necessário usá-los, ou o ácaro as extermina”, alerta.
Para o pesquisador, a era proibição do uso de agrotóxicos não parece uma boa ideia, pois pode até parecer que resolve o problema, mas pode criar outros, por vezes mais sérios. “Proibir inseticidas neonicotinoides, como ocorreu na Europa, levou os agricultores a usarem pesticidas mais antigos, mais tóxicos para as abelhas e outros animais, incluindo o homem. A emenda revelou-se pior que o soneto”, argumenta.
Há diversas causas para a morte de abelhas, o mau uso de pesticidas é uma delas, segundo Gazzoni. “Há questões sanitárias (pragas que atacam as abelhas), base genética estreita, mudanças climáticas, entre outras. E, em nossa opinião, se há uma política pública que pode auxiliar a resolver o problema, esta seria a de proteger o habitat natural das abelhas”, analisa. “Por conta da expansão das cidades, da infraestrutura, de rodovias e da agricultura, as abelhas estão perdendo o seu habitat nativo”, completa.
Livro
Para o especialista, recuperar essas áreas será fundamental, em especial com o uso de plantas que favoreçam os polinizadores. “Nesse particular, a Embrapa está finalizando a publicação de um livro denominado ‘Plantas que os polinizadores gostam’, que estará disponível para o público até dezembro de 2022”, relata.
Conforme explica, o tema é complicado para cientistas e ainda mais para leigos. “Recomendo desconfiar de novas informações, a menos que sejam de uma fonte lastreada em boa ciência. Não confunda um blog adepto da teoria da conspiração ou contra o desenvolvimento tecnológico com dados científicos reais”, alerta.
Ele também orienta a desconfiar de um artigo científico isolado. “Em ciência só a repetitividade convence. A ciência evolui, nosso conhecimento de abelhas mudou radicalmente em 10 anos, muitas teorias foram descartadas conforme novas evidências surgiram. Mesmo tudo o que eu já escrevi pode mudar porque, para um cientista, a verdade é a última verdade comprovada”, atesta.
O pesquisador diz que episódios de DCC não foram elucidados, mas não deverá desembocar em um grand finale ou um clímax. “Muito provavelmente, descobriremos que se trata de um fenômeno multifatorial, complexo e cheio de personagens entrelaçados. De sua elucidação dependerá o encaminhamento dos estudos para sua solução”, prevê.