Acordo de livre comércio entre os países africanos dever alavancar a agricultura do continente e afastar quase 100 milhões de pessoas da pobreza
A agricultura responde por cerca de um terço do PIB (Produto Interno Bruto) da África, e fornece meios de subsistência para 50% da população, além de alimentar centenas de milhões de pessoas no continente e fora dele também.
O papel fundamental que a agricultura desempenha na economia do continente só deve crescer em força e tamanho sob o acordo da Área de Livre Comércio Continental Africana (AfCFTA), firmado em fevereiro de 2021 e agora em pleno andamento.
Dos 55 países membros da União Africana, apenas a Eritreia não assinou o acordo. E a falta de entendimento sobre as regras de origem para algumas linhas de produtos fez que apenas dez dos signatários ainda não tenham ratificado o compromisso de participar da área de livre comércio.
De acordo com o relatório do Fórum Econômico Mundial, a área de livre comércio, uma das maiores do mundo em número de pessoas e tamanho econômico, está projetada para abrigar 1,7 bilhão de pessoas e movimentar US$ 6,7 trilhões em gastos de consumidores e empresas até 2030.
“A Zona de Comércio Livre Continental Africana tem potencialidade para aumentar as oportunidades de emprego e os rendimentos, ajudando a expandi-las a todos os africanos. A AfCFTA deverá retirar cerca de 68 milhões de pessoas da pobreza moderada e tornar os países africanos mais competitivos”, afirma Albert Zeufack, economista chefe do Banco Mundial para a África.
Além disso, espera-se que com o acordo outras 30 milhões de pessoas saiam da extrema pobreza.
Transformação da economia
O acordo deve ser transformador para muitas das indústrias africanas, mas, dado o papel já central da agricultura na economia do continente e seu enorme potencial de crescimento, ela poderá ser a principal beneficiária.
De acordo com o Banco Mundial, a agricultura tem um potencial excepcional para aumentar o comércio intra-africano, atender à demanda local, acelerar o crescimento do PIB, criar novos empregos e melhorar a inclusão devido às ligações entre produtores, fornecedores e consumidores.
Isso aumentará a agregação de valor, atenderá à nova demanda local e trará pequenos agricultores – que são responsáveis por 80% da produção de alimentos da África – em cadeias de abastecimento mais amplas.
“Será fundamental uma execução bem-sucedida, incluindo uma monitorização cuidadosa dos impactos em todos os trabalhadores – mulheres e homens, qualificados e não qualificados – em todos os países e sectores, assegurando o benefício pleno do acordo”, ressalta o economista do Banco Mundial.
Agroindústria em ascensão
A agroindústria tem implicações importantes para a segurança alimentar africana, criação de empregos e redução da pobreza. Impulsioná-la agrega valor a um setor agrícola que já é competitivo.
Países em toda a África vem aumentando seu foco no agroprocessamento em resposta à insegurança alimentar e aos picos de preços causados por interrupções comerciais causadas por choques globais, como a guerra da Ucrânia.
Com capacidade aprimorada para processar seus próprios produtos agrícolas – sejam grãos, fertilizantes ou qualquer outra coisa – os países africanos podem explorar a enorme vantagem que muitos deles têm em seus setores agrícolas estabelecidos para gerar riqueza e criar novos empregos por meio da agroindústria.
A expansão do segmento também tem impactos positivos de inclusão. As mulheres representam 70% do emprego no setor agrícola geral e a maior parte da força de trabalho da agroindústria é feminina.
Novos investimentos, novas oportunidades
Este crescimento na agricultura e agroiondústria pode levar a novos investimentos externos, dentro e fora do continente.
O mercado comum introduzido pela AfCFTA deve alavancar as diferenças regionais nos pontos fortes e na competitividade da diversidade intra-africana nas suas cadeias de valor alimentar, especializações e produtos-chave.
O aumento do comércio intra-africano através da AfCFTA ajudará a reduzir a dependência de insumos agrícolas estrangeiros. Atualmente, o continente importa cerca de US$ 50 bilhões em produtos agrícolas por ano.
Até 2030, o comércio agrícola intra-africano deverá aumentar em 574% se as tarifas de importação forem eliminadas, o que representa uma grande vitória para um continente historicamente prejudicado pela dependência desnecessária de economias externas.
As empresas pertencentes e geridas por africanos irão se beneficiar deste impulso comercial intra-continental. A indústria de fertilizantes, por exemplo, deve crescer. Espera-se que a nova atividade agrícola requeira um aumento de 800% na aplicação de fertilizantes para os principais nutrientes.
Além disso, na irrigação deverão ser investidos cerca de US$ 65 milhões, enquanto também serão necessários mais de US$ 8 bilhões em investimentos em armazenamento.
Iniciativas de grandes companhias
Um exemplo da agroindústria é a Coca-Cola, empresa que já atua há anos na região e emprega 50 mil pessoas em toda a África, e que também obteve sucesso trabalhando com fornecedores locais e desenvolvendo cadeias de valor como componentes-chave de sua estratégia no continente.
Juntamente com os parceiros de engarrafamento, a presença da Coca-Cola na África é um negócio próspero, devido à população jovem da África.
Segundo a empresa, o AfCFTA ajudará a Coca-Cola a desenvolver ainda mais o fornecimento e a produção, bem como as embalagens nos mercados africanos, e reduzirá os custos, dando a mais países oportunidades iguais de serem fornecedores da Coca-Cola.
Entre os produtos agrícolas utilizados pela companhia para fabricação dos seus produtos, estão a cana-de-açúcar, beterraba sacarina, milho, frutas, café, chá e soja.
Outro exemplo é o da Yara International ASA, empresa norueguesa de fertilizantes para nutrição de culturas, que atua em 12 países africanos.
A companhia obteve sucesso ao continuar a mover partes de sua cadeia de valor para o continente, incluindo uma instalação de mistura, uma empresa química e um escritório de vendas – especialmente porque as reduções tarifárias do AfCFTA reduzem o custo de infraestrutura, transporte e produção.
A Yara também incorporou uma estratégia de impacto social em seus negócios na África para enfrentar os desafios específicos dos pequenos agricultores nas comunidades em que operam, dialogando e entendendo as necessidades locais.
O ponto central da estratégia da companhia é o foco “África para a África” na construção uma cadeia de valor abrangente, continental, do campo ao garfo, continuando a investir em agricultores, varejistas, distribuidores, desenvolvedores de tecnologia e agroempresários atuais e aspirantes.