A utilização de recursos biológicos na agropecuária brasileira ganha um novo impulso a partir do lançamento nesta quarta-feira (27) do Programa Nacional de Bioinsumos pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). O foco é aproveitar o potencial da biodiversidade brasileira para reduzir a dependência dos produtores rurais em relação aos insumos importados e ampliar oferta de matéria-prima para setor.
O programa foi instituído pelo Decreto 10.375 e pelas Portarias 102 e 103, publicados nesta quarta-feira (27) no Diário Oficial da União. Em cerimônia virtual, a ministra Tereza Cristina lançou o programa, acompanhada dos secretários de Inovação, Desenvolvimento Rural e Irrigação, Fernando Camargo, e de Defesa Agropecuária, José Guilherme Leal.
A ministra destaca que o programa nasceu de uma antiga necessidade do setor produtivo (agrícola, aquícola, florestal e pecuária) de se alinhar com práticas mais inovadoras. Ressalta que o programa possibilitará a entrada de fato da agricultura na bioeconomia e que todos os produtores, como orgânicos, tradicionais e de demais segmentos, serão contemplados.
“Todos têm a ganhar, produtores de todos os tamanhos têm a ganhar”, afirmou Tereza Cristina, acrescentando que 40 milhões de hectares no país já são cultivados com bactérias promotoras de crescimento de plantas, um exemplo de bioinsumo.
Biofábricas
![](https://alavoura.com.br/wp-content/uploads/2020/05/article-10.jpeg)
Pesquisa da Embrapa quer transformar microalgas em biofábricas de enzimas para etanol. Foto: Embrapa
Tereza Cristina disse ainda que o Plano Safra, a ser lançado, trará recursos para financiamento de biofábricas (veja mais abaixo). Para a ministra, o programa vai reforçar a missão do Brasil de ser um provedor de produtos agropecuários e alimentos de qualidade para a população brasileira e mundial.
O secretário de Inovação, Desenvolvimento Rural e Irrigação, Fernando Camargo, destacou a parceria com diversas entidades do setor agropecuário, especialmente da Embrapa, na elaboração do programa.
“Esse era um programa acalentado há muitos anos e finalmente vamos fazer essa entrega. Os bioinsumos e a bioeconomia se baseiam em um binômio: a utilização da nossa grande biodiversidade, que é a maior do mundo, e a possibilidade da redução da dependência de insumos fósseis, trabalhando então com insumos biológicos”. Segundo o secretário, estima-se, com o programa, aumentar em 13% a área agropecuária com uso de recursos biológicos. Atualmente, 10 milhões de hectares usam bioinsumos para controle de pragas.
Já o secretário de Defesa Agropecuária, José Guilherme Leal, lembrou a importância de se criar um ambiente regulatório favorável para as empresas trabalharem em pesquisa de produtos biológicos. “Esse programa vai levar a nossa agricultura a outro patamar de sustentabilidade, além de consolidar o Brasil como uma referência em agricultura tropical”.
Bioeconomia
![](https://alavoura.com.br/wp-content/uploads/2020/05/Bioeconomia-uma-tendencia-global.jpg)
A cesta de bioinsumos é ampla e abrange desde inoculantes, promotores de crescimento de plantas, biofertilizantes, produtos para nutrição vegetal e animal. Foto: Divulgação
O programa é um dos pilares da visão de bioeconomia que a pasta está desenvolvendo, visando o acesso, o desenvolvimento e o uso sustentável da rica diversidade biológica brasileira. A proposta é contribuir para o desenvolvimento de novas soluções tecnológicas, como também gerar renda, riqueza e qualidade de vida para os produtores, inseridos nos diferentes elos das cadeias produtivas do agronegócio e toda a sociedade.
“O setor produtivo e o mundo clamam por mais tecnologias sustentáveis. Temos na agricultura a base da nossa economia e a bioeconomia será a grande alavanca para manter o Brasil como protagonista no agronegócio global”, avalia Cléber Soares, diretor de Inovação do Mapa.
A cesta de bioinsumos é ampla e abrange desde inoculantes, promotores de crescimento de plantas, biofertilizantes, produtos para nutrição vegetal e animal, extratos vegetais, defensivos feitos a partir de micro-organismos benéficos para controle de pragas, parasitos e doenças, como fungos, bactérias e ácaros, até produtos fitoterápicos ou tecnologias que têm ativos biológicos na composição, seja para plantas e animais, como para processamento e pós-colheita.
“Esse programa nasceu a partir da demanda crescente da sociedade, em especial, de dois públicos: consumidores e também dos produtores rurais que buscam por insumos e produtos de menor impacto econômico e ambiental, que seguramente irão beneficiar todo o agro brasileiro”, avalia a coordenadora do programa de Bioinsumos do Mapa, Mariane Vidal.
Em função dessa amplitude do conceito, esclarece Mariane, é objetivo do programa envolver não somente produtos, mas processos e tecnologias de origem biológica – animal, vegetal ou microbiana – que tragam resultados positivos no desenvolvimento e no mecanismo de resposta para esses mesmos elementos e em sustâncias derivadas. “Nossa expectativa é abarcar um grande número de processos, produtos e tecnologias para fomentar um conjunto de práticas sustentáveis relacionadas aos bioinsumos”, afirma a coordenadora.
O Programa Nacional de Bioinsumos se propõe a disponibilizar um conjunto estratégico de ações para o desenvolvimento de alternativas para a produção agrícola, pecuária e aquícola, considerando dimensões econômicas, sociais, produtivas e ambientais. Visa estimular a adoção de ativos sustentáveis baseados no uso de tecnologias, produtos e processos desenvolvidos a partir de recursos renováveis, por meio da ação integrada dos setores de ciência, tecnologia e inovação, além do o setor produtivo e o mercado.
Biodiversidade
Responsável por abrigar a maior biodiversidade do mundo, o Brasil tem condições para se tornar o maior protagonista mundial na área de ciência, tecnologia e inovação em bioinsumos. Com essa oferta abundante de matéria-prima, a meta do programa é desenvolver trabalhos em várias frentes, envolvendo produção vegetal, animal, processamento e pós-colheita. Neste contexto, está incluído também o desenvolvimento de produtos e processos para a produção aquícola.
Neste caminho, a proposta do programa governamental, elaborado em parceria com o setor produtivo, é fomentar e promover o desenvolvimento de bioinsumos, a partir de matéria prima local e regional, gerando divisas, emprego, renda e organizando – a médio e longo prazo- novas cadeias produtivas em todo o país.
O programa Bioinsumos foi elaborado por um grupo de trabalho formado por integrantes de diferentes secretarias da pasta e com ampla consulta ao setor produtivo. A partir dessas diretrizes, a próxima etapa é organizar o marco legal do segmento e facilitar o acesso de produtores rurais do país – sejam pequenos, médios ou grandes, orgânicos ou não – aos diferentes insumos biológicos, incluindo os já autorizados para a produção agropecuária.
Para a coordenadora Mariane Vidal, os bioinsumos representam um novo paradigma para a agricultura brasileira e mundial. “Alimentos produzidos de forma sustentável tornam produtos desta natureza mais competitivos no mercado internacional, especialmente os europeus, compradores dos produtos agrícolas brasileiros”, avalia a coordenadora.
Diretrizes
O programa deverá ser implantado em etapas e está estruturado em eixos temáticos relacionados a: produtos fitossanitários para controle de pragas e doenças de plantas; biofertilizantes; nutrição de plantas e tolerância a condições ambientais adversas; produtos veterinários e para alimentação animal, pós-colheita e processamento de origem animal e vegetal e, ainda, produção aquícola.
Outro objetivo é criar ambiente favorável para o fomento e financiamento de infraestrutura e de custeio – por meio da oferta de crédito e de outros benefícios econômicos para o setor – e também para a inovação tecnológica em bioinsumos.
Outra ação visa propor a elaboração de normas e protocolos para a instalação de unidades produtoras de bioinsumos – as biofábricas – e discutir tratamento legal específico para otimizar os processos de registro de produtos e garantir segurança jurídica aos produtores.
Nas etapas de implementação, estão previstos ainda levantamento de dados sobre o setor; lançamento de editais de fomento a inovação; elaboração de protocolos de produção para os agricultores e um catálogo nacional de bioinsumos, entre outras ações.
Mercado
![](https://alavoura.com.br/wp-content/uploads/2020/05/defensívo-agrícola.jpg)
Há um universo que totaliza mais de 10 mil linhagens de bactérias, fungos e vírus controladores de pragas e doenças de plantas. Foto: Divulgação
O número de defensivos biológicos registrados no Mapa tem avançado. Atualmente, são 265 produtos registrados, entre bioacaricidas, bioinsecitidas, biofungicidas e bioformicidas.
Em 2019, o mercado de biodefensivos nacional movimentou R$ 675 milhões, crescimento da ordem de 15% em relação a 2018, e acima da média estimada de crescimento internacional. Os dados são da Croplife Brasil, associação que representa as indústrias de desenvolvimento e inovação nas áreas de biotecnologia, germoplasma, defensivo químico e biodefensivo. A média global de novos produtos biológicos registrados, por ano, aumentou de três para 11 na última década.
Ainda, de acordo com a associação, em 2018, o setor realizou uma pesquisa, envolvendo usuários de biológicos em 15 estados e em 11 culturas diferentes. A conclusão foi que 96% dos pesquisados acreditam que o uso (taxa de adoção) de biodefensivos irá crescer nos próximos cinco anos.
A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), vinculada ao Mapa, conta com um extenso trabalho de pesquisa dedicado ao controle biológico. São 632 pesquisadores trabalhando em 73 projetos relacionados ao tema e distribuídos em 40 unidades. Por reconhecer a importância do tema, foi constituído um portfólio de projetos específicos para o assunto de forma a fortalecer e correlacionar as iniciativas.
Adicionalmente, a instituição dispõe de diversos bancos de germoplasma microbiano dedicados exclusivamente à preservação e caracterização de micro-organismos, agentes de controle biológico de pragas e promotores de crescimento de plantas. Um universo que totaliza mais de 10 mil linhagens de bactérias, fungos e vírus controladores de pragas e doenças de plantas e mais de 14 mil linhagens de micro-organismos fixadores de nutrientes e promotores de crescimento de plantas, mantidos em pelo menos sete unidades da empresa.
O registro de um biodefensivo, no Brasil, passa por procedimentos de avaliação de eficácia e aplicação no campo avaliados pelo Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa). Em relação ao grau de toxicidade para humanos, a análise cabe à Agencia Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a avaliação de impactos toxicológicos ao meio ambiente é de responsabilidade do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
Vale destacar que os órgãos federais competentes pelo registro consideram especificidades e características das diferentes categorias de produtos, como as dos biodefensivos e dos produtos químicos, para estabelecer os critérios para a avaliação. Esses critérios são estabelecidos em regulamentos específicos para cada tipo de produto.
Fonte: Mapa