Após o terceiro adiamento, a demora na votação do Projeto de Lei 735/2020, chamado de PL Emergencial da Agricultura Familiar, aumenta o risco de desabastecimento de alimentos nos próximos meses no Brasil, segundo organizações e movimentos do setor.
O texto propõe, entre outras ações, o auxílio emergencial de R$ 3 mil para os trabalhadores e trabalhadoras do setor, como forma de enfrentar a pandemia do novo coronavírus. Espera-se que o projeto seja votado nesta quinta-feira (9) ou na terça-feira (14).
Responsável pela produção de mais de 70% dos alimentos consumidos no país, a agricultura familiar sofreu impactos econômicos e logísticos severos, desde o início da pandemia, principalmente devido às medidas de restrição de circulação, do fechamento de comércios e feiras livres e à suspensão de compras públicas por estados e prefeituras.
“É urgente que o Congresso Nacional vote as medidas de apoio à agricultura familiar, para que produtores de todo o país tenham recursos para se planejar e garantia de que haverá mercado para os alimentos que produzirem”, diz Denis Monteiro, agrônomo e secretário executivo da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA).
Sem perspectivas de aprovar destaques no plenário da Câmara, as bancadas de apoio à agricultura familiar estão fazendo pressão para que o relator incorpore as demandas dos movimentos do campo diretamente ao relatório. “Mesmo que a gente não tenha sucesso nessas emendas e destaques, o relatório, de certa forma, é um avanço, considerando a conjuntura no Congresso Nacional e o governo Bolsonaro”, comenta o deputado federal Nilto Tatto (PT-SP).
Para o secretário executivo da ANA, “o Brasil não pode correr risco de ter falta de alimento, e o poder público vai ter um papel importante na distribuição de alimentos para as famílias que tiveram perda de renda, o que agravou a níveis alarmantes o estado de insegurança alimentar de parcela significativa da população”, explica Denis Monteiro.
Risco de desabastecimento cresce
Estudos com base em dados oficiais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e outras instituições já dão conta de que os estoques médios de alguns alimentos no Brasil estão aquém do índice mínimo de segurança alimentar necessário para o país, que gira em torno de 20% do consumo anual.
A pandemia, somada à crise econômica, causa uma vulnerabilidade acentuada do abastecimento alimentar, provocada principalmente pela inflação da comida, que afeta as famílias mais pobres.
Segundo o IBGE, o IPCA-Geral, no acumulado do período de janeiro a abril deste ano, variou 0,22%, enquanto o da categoria da ‘alimentação no domicílio’ variou 3,94%, ou 18 vezes mais que o índice geral.
Em alguns alimentos, como a cenoura, por exemplo, ressalvada a sazonalidade da produção, o preço pago pelo consumidor final chegou a ser 441 vezes maior que o IPCA-Geral. O tomate, a batata, o feijão e a banana, que estão na dieta principal das famílias brasileiras, tiveram um salto de 52%, 42%, 23% e 20%, respectivamente, no preço pago pelo consumidor. Sem a implantação de medidas de fortalecimento para a produção de alimentos, a probabilidade é que a inflação continue a aumentar, indicam as organizações do setor.