O produto gera renda para centenas de famílias na região e o governo de Minas Gerais prepara regulamento técnico do queijo para conquista de novos mercados
Em sua propriedade rural em Pedra Azul, no Vale do Jequitinhonha, Minas Gerais, o casal José Valério de Souza Filho e Paloma Souza produzem o Bonança, um queijo tipo Cabacinha, iguaria tão tradicional nessa região que já ganhou o título de Patrimônio Cultural e Imaterial de Minas Gerais.
Como eles, no Vale, cerca de 300 famílias vivem dessa produção, legado passado de geração em geração, conforme estimativa da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural de Minas Gerais (Emater-MG).
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O queijo tipo Cabacinha, iguaria tão tradicional nessa região que já ganhou o título de Patrimônio Cultural e Imaterial de Minas Gerais Foto Emater MG/Divulgação
Fazenda Bonança
Na Fazenda Bonança, o dia começa bem cedo, com a ordenha feita no sistema bezerro ao pé, pensando no bem-estar animal. Assim que o leite é coletado, já vai para a queijaria. No tanque, ele é aquecido e recebe o coalho e um pouco do soro coletado da produção anterior, para começar a se formar a massa.
Depois da massa pronta, é que se inicia a parte mais mágica e também mais difícil da produção do Cabacinha: torná-la maleável para ser moldada à mão, no formato de uma cabaça. A cabaça é um vegetal que, desidratado e aberto, apresenta a forma de uma espécie de cuia e já foi muito utilizada como utensílio doméstico no Vale do Jequitinhonha. É desta forma que vem o nome do queijo Cabacinha.
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Depois da massa pronta, José Valério moda a massa do queijo à mão no formato de uma cabaça Foto Emater MG/Divulgação
Assinatura
Paloma Souza destaca que cada produtor tem seu jeito próprio de fazer o Cabacinha, o formato do queijo é como se fosse uma assinatura, a identidade de cada iguaria. “A gente sempre escuta: o queijo de fulano é assim, o de sicrano é desse jeito. Mas é porque cada um tem sua forma, tanto que não tem molde, o molde vem das mãos”, observa.
História e reconhecimento
O José Valério começou a fazer o queijo Cabacinha em 1994 mas, na época, trabalhava também como bancário, então, não foi possível conciliar as duas atividades.
Só depois que se aposentou, em 2018, retomou o sonho de ser queijeiro, ao lado da companheira de vida, a Paloma, que também ajuda em todas as etapas. Afinal, o queijo Cabacinha, como uma tradição no Vale, sempre esteve presente na vida do casal.
Paloma conta que desde criança, todos os sábados, sua mãe e sua tia, levavam para eles comerem. “É tradição comer o Cabacinha, em Pedra Azul”, lembra a. produtora.
José Valério relata que o Cabacinha era feito das rebarbas do queijo parmesão. “Naquela época , não havia muito jeito de armazenar, refrigerar e o Cabacinha tinha uma facilidade maior pra ser maturado, porque pode ser pendurado pelo ‘pescoço’, e isso ficou incutido na mente e na cultura do nosso povo”, explica.
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Ao se aposentar em 2018, o produtor retomou o sonho de ser queijeiro, ao lado da companheira de vida, a Paloma, que também ajuda em todas as etapas de produção do cabacinha Foto Emater MG/Divulgação
Sabor diferenciado
O Cabacinha é um queijo feito de leite cru, massa cozida, filada, que ganha salga em salmoura. O sabor é suave, semelhante à muçarela. Além da versão tradicional, ganha sabores elaborados com a criatividade dos produtores do Vale.
Na Fazenda Bonança, por exemplo, eles fazem queijo condimentado com alho e recheado com goiabada. Ele é comumente consumido fresco, mas pode ser maturado, adquirindo assim sabor mais marcante.
Trajetória do cabacinha
A trajetória do queijo Cabacinha vem de longe, já são mais de oito décadas que seu modo de fazer é passado de geração em geração no Vale do Jequitinhonha.
Recentemente, o governo de Minas Gerais deu mais um passo no processo de reconhecimento e valorização dessa cultura, concluindo o estudo de caracterização da iguaria.
O trabalho envolveu técnicos da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural de Minas Gerais (Emater-MG) e pesquisadores da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig), além de empresas públicas vinculadas à Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Minas Gerais.
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Na Fazenda Bonança, no Vale do Jequitinhonha, o queijo cabacinha é condimentado com alho e recheado com goiabada Foto Emater MG/Divulgação
Comercialização
Lucianara Guimarães Miranda, coordenadora técnica regional da Emater-MG destaca que o estudo servirá de base agora para a regulamentação junto ao Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA), que deve nos próximos meses lançar o regulamento técnico de identidade e qualidade do Cabacinha, o passo que faltava para retirar essa produção da informalidade e permitir que a iguaria seja comercializada em todo o Brasil.
“Dos que produzem constantemente, devem ser uns 300 produtores em nove municípios. Com a regulamentação, esses produtores vão poder comercializar com mais tranqüilidade”, afirma Lucianara.
Ela acredita que esse é um passo importantíssimo tanto para a economia, para a parte cultural e para o turismo. “Alguns produtores já estão abrindo as propriedades para serem visitadas. Então é uma riqueza que a gente não consegue mensurar”, ressalta a coordenadora da Emater-MG.
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Associação
Para acompanhar e fortalecer todo esse movimento no Vale, foi criada, com apoio da Emater-MG, a Associação dos Produtores de Queijo Artesanal Cabacinha do Jequitinhonha (Aprocaje), da qual José Valério é o presidente.
Atualmente, a associação agrega pouco mais de 30 produtores, mas o objetivo é reunir muitos outros, de todos os portes, para terem a oportunidade de crescer e assim desenvolver todo o Vale.
“Pode ser que um produtor pequenininho tenha uma preciosidade lá. É preciso que ele abra para as outras pessoas conhecerem. E acreditar, porque pode mudar a realidade da sua família, seus filhos. Sucesso traz a sucessão familiar, e as gerações futuras têm que trabalhar o queijo Cabacinha, porque tem um potencial enorme”, reforça José Valério.
Fonte: Emater-MG
Foto abertura: O casal de produtores José Valério de Souza Filho e Paloma Souza Foto Emater MG/Divulgação