O que antes era uma necessidade na dieta de pessoas com doença celíaca, hoje é uma tendência para quem busca ter uma alimentação saudável. Médicos,no entanto, alertam para os riscos de deficiência de vitaminas e minerais para quem adota essa prática
Atualmente, as prateleiras dos supermercados e de lojas de produtos saudáveis estão cada vez mais cheias de alimentos e embalagens que estampam a frase “sem glúten” ou “gluten free”. Até mesmo restaurantes têm se preocupado em oferecer opções sem glúten.
Para pessoas que possuem a doença celíaca e por isso são intolerantes ao glúten, uma proteína encontrada no trigo, centeio e cevada, essa abundância é uma bênção. Porém, ultimamente, tornou-se uma tendência pessoas que não sofrem da doença buscarem produtos sem a proteína.
Com base em pouca ou nenhuma evidência que não seja depoimentos na mídia, as pessoas têm mudado para dietas sem glúten para perder peso, aumentar a energia, tratar o autismo ou geralmente se sentirem mais saudáveis. Segundo o médico, Daniel Leffler, isso não faz muito sentido.
“As pessoas sensíveis ao glúten se sentem melhor, mas uma parcela maior não terá benefícios significativos com a prática. Eles simplesmente desperdiçam seu dinheiro, porque esses produtos são caros ”, diz Leffler, que é diretor de pesquisa clínica do Celiac Center no Beth Israel Deaconess Medical Center, um hospital de ensino da escola de Medicina de Harvard e professor assistente de medicina em Harvard.
Como o glúten causa problemas
Pessoas com doença celíaca não toleram o glúten, nem mesmo em pequenas quantidades. Apenas 50 miligramas da proteína são suficientes para causar problemas.
Nessas pessoas, a proteína desencadeia uma resposta imune que danifica o revestimento do intestino delgado. Isso pode interferir na absorção de nutrientes dos alimentos, causar uma série de sintomas, como dor abdominal, diarreia, flatulência, distensão do abdômen, e levar a outros problemas como osteoporose, infertilidade, danos no sistema nervoso e convulsões.
Uma condição relacionada chamada sensibilidade ao glúten ou sensibilidade não celíaca ao glúten pode gerar sintomas semelhantes à doença celíaca, mas sem o dano intestinal. Hoje, a doença celíaca pode ser identificada com um exame de sangue quanto à presença de anticorpos contra uma proteína chamada transglutaminase tecidual. Uma biópsia do intestino confirma o diagnóstico.
Os desafios da dieta
Evitar o glúten significa mais do que desistir de pães, cereais, massas, pizza e cerveja tradicionais. Ele também se esconde em muitos outros produtos, incluindo vegetais em conserva, molho de soja, alguns alimentos feitos com “aromas naturais”, temperos prontos, suplementos vitamínicos e minerais, alguns medicamentos e até creme dental. Isso torna extremamente desafiador seguir uma dieta sem glúten.
Se você está decidido a ficar sem glúten, é importante saber que isso pode causar algumas deficiências nutricionais. No Brasil, por exemplo, a farinha de trigo é fortificada, sendo uma importante fonte de ferro e ácido fólico (Vitamina B9). Embora os pães feitos com arroz branco, tapioca e outras farinhas sem glúten estejam se tornando mais comuns, eles geralmente não são enriquecidos com vitaminas. Isso pode ser um problema para qualquer pessoa, mas é especialmente preocupante para mulheres grávidas ou que podem engravidar, alerta o médico.
“Elas precisam de vitamina B9 para prevenir defeitos de nascimento. Tomar um suplemento multivitamínico-multimineral sem glúten é uma boa idéia para quem tenta evitar o glúten. O trigo integral também é uma importante fonte de fibra alimentar, necessária para o funcionamento adequado do intestino”, diz Daniel Leffler.
Prejudicial para as crianças
A médica pediatra, também de Harvard, Claire McCarthy, explica que a adoção de uma dieta sem glúten, sem o devido acompanhamento médico, pode causar problemas às crianças. Ela afirma que em uma alimentação gluten free “pode estar faltando nutrientes importantes. Grãos integrais que contêm glúten têm muitos nutrientes cruciais – incluindo vitaminas do complexo B, antioxidantes, ferro, selênio e magnésio”.
De acordo como a especialista, “eles também têm fibras, o que é importante para uma boa digestão. É possível obter esses nutrientes e fibras sem comer glúten, porém é preciso algum esforço”. Para suprir a falta de fibras, é necessária consumir outros grãos, como arroz integral ou quinoa, frutas, legumes e feijões.
“A dieta também pode ser muito baixa em calorias para crianças em crescimento. Elas precisam de calorias saudáveis para crescer, e quando você corta alimentos feitos com trigo ou que contêm glúten, pode ser mais difícil obter essas calorias”, afirma McCarthy.
Se você acha que pode ter doença celíaca ou sensibilidade ao glúten, é melhor consultar um médico antes de ficar sem glúten. Além disso, depois que uma pessoa evita o glúten por um tempo, torna-se difícil determinar se ela tem doença celíaca, sensibilidade ao glúten ou nenhuma.