Embrapa desenvolve equipamentos simples e de baixo custo que contribuem para boas práticas na fase de pós-colheita para seleção, classificação, limpeza, armazenamento e transporte de frutas e hortaliças, valorizando o produto comercializado pelo agricultor
Quem pensa que a tecnologia está a serviço somente das inovações avançadas no campo, está enganado. Ela pode e é uma ferramenta importante na redução das perdas de alimentos no País, por exemplo, a partir de soluções simples e de baixo custo ao produtor rural. Antes de entrar neste assunto, cabe ressaltar uma estimativa alarmante, que consta no estudo “Desperdício de alimentos no Brasil: um desafio político e social a ser vencido”, coordenado pelo pesquisador Antônio Gomes Soares, da Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ).
Entre os anos de 1997 e 2000, cerca de 30% das 17,7 milhões de toneladas de frutas frescas, comercializadas no País, sequer chegaram à mesa do consumidor. As perdas de hortaliças foram ainda mais preocupantes: aproximadamente 5,6 milhões, de um total de 16 milhões de toneladas, também foram parar no lixo, antes do consumo.
Para Soares, é desfavorável aumentar a produção agrícola sem reduzir suas perdas. “Se produzimos mil toneladas e as perdas são de 30%, jogamos fora 300 toneladas. Caso dobremos a produção para 2 mil toneladas e continuemos com o mesmo índice, o prejuízo também dobrará. Desta forma, o correto é primeiro diminuir as perdas, para depois pensar em aumentar a capacidade de produção”, orienta o pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária.
Todo o montante de alimentos desperdiçados no Brasil, ressalta o pesquisador, além de desequilibrar a cadeia produtiva, impacta na qualidade do produto que chega às feiras e prateleiras dos estabelecimentos comerciais.
Do campo ao consumidor final
Dados da Embrapa revelam ainda que as principais perdas de frutas e hortaliças estão concentradas na hora do manuseio e transporte (com 50%), além da comercialização (média de 30%). Já o desperdício no campo e de consumo somam 20%.
Para auxiliar aos agricultores, principalmente os familiares e pequenos produtores rurais, a estatal tem estudado e oferecido soluções práticas e baratas. Segundo a pesquisadora da Embrapa Hortaliças (DF) Milza Moreira Lana, tais propostas têm como objetivo melhorar e diminuir os efeitos negativos de cada etapa da cadeia produtiva, passando pela produção, manuseio, processamento, mercado e distribuição, até chegar ao consumidor final.
Unidade Móvel de Sombreamento
No caso das hortaliças e das frutas, as perdas são motivadas pela falta de infraestrutura e manuseio adequado ao longo da cadeia produtiva. Para sanar este problema, uma das sugestões da Embrapa é construir uma Unidade Móvel de Sombreamento (UMS) ou casa de embalagens, feita de ferro e lona, que serve de abrigo após estes alimentos serem removidos do solo.
“A exposição ao sol, mesmo que por períodos curtos, acelera a desidratação e o amadurecimento, tornando as hortaliças e frutas mais suscetíveis à podridão e menos atraentes ao consumidor”, alerta Milza, salientando ainda que a menor durabilidade não reduz somente o tempo disponível para o agricultor escoar a produção, mas prejudica também sua renda, já que produtos deteriorados têm menor valor comercial.
A “cabana”, considerando também a importância da saúde do trabalhador rural, funciona como barreira que diminui a incidência de calor e de raios ultravioletas na pele. “A exposição prolongada à luz solar é um risco físico para o agricultor e pode originar doenças, como câncer de pele e catarata. Por isto, a utilização do equipamento repercute na qualidade do trabalho e na proteção da saúde dele”, avalia o médico do trabalho Osvaldo de Azevedo Monteiro Neto.
Mesa separadora
A postura inadequada e o carregamento de peso excessivo também podem prejudicar a saúde do produtor, que não dispõe de recursos para a compra de maquinários. Para amenizar os riscos à sua saúde, a Embrapa desenvolveu uma mesa para seleção de frutas e hortaliças.
“O produtor pode utilizar uma peça de madeira inclinada (uma espécie de mesa separadora), semelhante a um cavalete, para conseguir escoar o produto selecionado”, informa Milza.
Os pés reguláveis desta mesa permitem que o trabalhador faça os ajustes necessários, levando em conta, principalmente sua altura. Ainda facilita a visualização das frutas e hortaliças doentes, de forma que não entrem em contato com as saudáveis.
Carrinho
Mais uma opção no processo de manuseio de frutas e hortaliças é utilizar um carrinho para transportá-las do campo até a casa de embalagens ou Unidade Móvel de Sombreamento. “Com o manuseio mínimo, o produto será menos machucado, sofrerá pouco com as condições ambientais e, de antemão, os produtores terão melhores condições de trabalho”, orienta a pesquisadora.
O pequeno veículo ajuda a reduzir o estresse físico do agricultor, que não precisará carregar caixas pesadas nos ombros. “O carrinho permite colher mais rapidamente, preserva as caixas limpas e, ao evitar o contato com o solo, reduz a contaminação e a transmissão de doenças para as hortaliças”, explica Milza.
Embora os equipamentos sugeridos pela Embrapa sejam simples e baratos, o maior desafio não é o uso do carrinho e/ou a construção da UMS e da mesa separadora, mas transformar a mentalidade do produtor. “Precisamos implantar uma nova cultura de como tratar o produto”, ressalta a pesquisadora da Embrapa Hortaliças.
Causas e sugestões para reduzir as perdas no campo
Principais causas de perdas de frutas e hortaliças* | Dicas de redução de perdas de frutas e hortaliças |
Manuseio inadequado do campo | Melhoria nos tratamentos pré e pós-colheita |
Embalagens impróprias | Adequação do ponto da colheita em relação ao mercado consumidor |
Transporte ineficiente | Padronização das dimensões das embalagens |
Comercialização de produtos a granel | Adequação da embalagem ao produto hortifrutícola |
Não utilização de cadeia de frio | Reeducação e treinamento de todos os envolvidos na pré e pós-colheita |
Contaminação | Melhoria nos meios de transporte |
Comércio no atacado ineficaz | Melhor integração entre varejistas, atacadistas e produtores |
Excesso de “toque” nos produtos por parte dos consumidores | Desenvolvimento de subprodutos industrializados que possam permitir o aproveitamento dos frutos |
Acúmulo de produtos nas gôndolas de exposição de varejo | Estabelecer um critério nacional para classificação de produtos que atendam à realidade do comércio nacional |
Deficiência administrativa nos centros atacadistas e varejistas |
Cooperação conjunta
Diminuir as taxas de perdas e desperdícios de alimentos não é uma tarefa fácil. A solução é complexa e incide justamente em uma ação integrada com todos os atores da cadeia produtiva. Em outras palavras, é preciso uma cooperação conjunta tanto do produtor quanto do consumidor final.
Para o pesquisador Antônio Gomes Soares, da Embrapa Agroindústria Alimentos, não há uma resposta imediata para o problema das perdas de alimentos. Mas existe uma série de procedimentos que, se adotada, pode contribuir para a redução destas taxas, tais como: melhoria nos tratamentos da pré e pós-colheita das frutas e hortaliças; padronização das dimensões da embalagem; melhoria nos meios de transporte; melhor integração entre varejistas, atacadistas e produtores; entre outros.
Em sua opinião, a mudança logística também pode agilizar as informações sobre a qualidade do produto, permitindo intervenções de ajuste mais rápidas e precisas. “Diminuindo o desperdício de frutas e hortaliças, os impactos em curto prazo para o País seriam enormes”, comenta Soares.
Vantagens
Como outras vantagens, que surgem a partir do controle das perdas de alimentos em território nacional, “podemos citar melhor remuneração ao produtor rural, maximização da oferta de alimentos, diminuição de custos operacionais, aumento da disponibilização de alimentos saudáveis ao consumidor, maior estabilização de preços ao consumidor e diminuição do lixo jogado no meio ambiente”, ressalta o pesquisador.
Fontes: Embrapa e Portal Brasil
Grupo de caixas diminui perdas
Com o objetivo de reduzir as perdas na fase de pós-colheita, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária lançou também um grupo de caixas para facilitar a comercialização de hortifruti. Nesta etapa da cadeia produtiva, as embalagens inadequadas e o manuseio excessivo, de acordo com a Embrapa, são os principais responsáveis pelos danos nos produtos e pelo elevado percentual de perdas pós-colheita.
A utilização do “Grupo de Caixas Embrapa” constitui uma boa prática agrícola, uma vez que favorece o manuseio mínimo e a rastreabilidade na cadeia de produção.
“A recomendação é de que sejam evitadas as trocas de embalagens entre os elos da cadeia. Assim, as caixas utilizadas para a colheita na propriedade rural são as mesmas que expõem os produtos no local de comercialização”, explica a pesquisadora Rita Luengo, da Embrapa Hortaliças (DF), ao pontuar que se espera evitar o retrabalho na logística de distribuição entre as áreas de produção e de consumo.
Intervalo menor
Segundo Rita, com o uso das caixas, as hortaliças são comercializadas em um intervalo menor de tempo e chegam mais frescas ao consumidor final. O grupo é composto por quatro caixas de diferentes tamanhos, que são paletizáveis e, por isto, facilitam o transporte em empilhadeiras.
Elas também permitem diferentes encaixes entre si e a composição de palete misto, o que é uma vantagem para os comerciantes que distribuem uma grande diversidade de espécies de hortaliças e frutas.