São João del Rei, município brasileiro da região do Campo das Vertentes, pertencente ao estado de Minas Gerais, é reconhecido pela produção de peças artesanais em estanho do Brasil
Um processo que levou quase cinco anos, os produtores ligados à Associação dos Artesãos de Peças em Estanho de São João del Rei (AAPE) passaram a contar com o selo de Indicação de Procedência-IP em suas peças no início de 2012.
Todo processo começou em 2006, como resultado de um trabalho de pesquisadores do Laboratório de Pesquisa e Intervenção Psicossocial da UFSJ. A partir dos resultados obtidos, foi sugerido pela Comissão de Propriedade Intelectual da UFSJ, o desenvolvimento de um projeto de extensão com objetivo de conseguir o reconhecimento da cidade como Indicação de Procedência.
A Conquista
Em setembro de 2010, foi depositado o pedido de registro no Instituto Nacional da Propriedade Industrial-INPI. Além de artigos acadêmicos, o projeto enviado contou com a participação e reunião de oito das dez empresas que atuam na cidade, reforçando a importância do produto para a cultura local.
Os associados da Associação dos Artesãos de Peças em Estanho-AAPE criaram uma regulamentação onde estão elencadas todas as características que o processo de produção das peças deve ter para receber o selo de Indicação de Procedência “São João del Rei”.
O controle de qualidade é feito pelos associados e representantes de entidades sanjoanenses que apóiam a produção artesanal na cidade.
A logomarca para identificação se inspirou no sino — símbolo tradicional de São João del Rei — e na taça, peça significativa do artesanato em estanho.
História e Tradição
O estanho já era produzido nos municípios mineiros de São João del Rei e Tiradentes desde o século XVIII. O uso de estanho na confecção de utensílios domésticos e litúrgicos foi muito difundido na região no período colonial. Porém, com o advento das peças de alumínio e outros materiais, o estanho foi substituído, sendo o seu uso mais restrito à liga do bronze.
A chegada de John Leonel Walter Somers, um antiquário inglês, a São João del Rei, resgatou a produção de peças de estanho, devido ao seu interesse pelas esculturas antigas. Segundo artesãos locais, a vinda de John Somers para a cidade foi “um marco, uma benção.”
Uma das maiores cidades setentistas mineiras, São João del Rei é marcada pela religiosidade, mantendo viva toda a tradição das procissões, do culto e do soar dos sinos. As peças artesanais em estanho carregam um sentido de natureza simbólica, que remete à identidade cultural sanjoanense.
As produções conservam as mesmas características coloniais do século XVIII, mantendo uma continuidade com o passado. As peças artesanais fabricadas em estanho representam a tradição local e a identidade histórico-cultural da região.
Procedência
Registro IG 201010 INPI
Associação dos Artesãos de Peças em Estanho de São João del Rei
Indicação de Procedência 2012
Abrangência: O município de São João Del Rei abrange os distritos de Arcângelo, Emboabas, Rio das Mortes, São Gonçalo do Amarante (Ex-Caburu) e São Sebastião da Vitória, tendo como limites municipais os municípios de Nazareno, Conceição da Barra de Minas, Ritápolis, Coronel Xavier Chaves, Tiradentes, Santa Cruz de Minas, Prados, Barbacena, Ibertioga, Piedade do Rio Grande, Madre de Deus de Minas e Carrancas, todos no Estado de Minas Gerais.
Email: aape.estanho@yahoo.com.br
ONDE ENCONTRAR:
Cidade histórica
Escolhida como capital brasileira da Cultura, em 2007, São João del Rei é uma das principais cidades históricas de Minas Gerais, com um vasto patrimônio histórico e cultural. Está posicionada com destaque no Circuito dos Inconfidentes e na Estrada Real.
O conjunto arquitetônico e urbanístico da cidade foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, em 1983. As ladeiras, capelas, igrejas, casarios, os casarões coloniais, as pontes e os Passos da Paixão, são magníficas edificações do barroco com composições do gosto rococó, guardando a riqueza do ciclo do ouro.
A decadência
O artesanato, ou a indústria de estanho no Brasil existiu no período colonial, quando ourives e prateiros, vindos da Europa, precisavam se sustentar. No entanto, as matérias-primas destes ofícios eram confiscadas pela Coroa portuguesa. Os artesãos usavam o material mais próximo e disponível para fazer os seus trabalhos, assim, o estanho ganhou força.
Como o Brasil era um país jovem e sempre ávido pela vanguarda da moda, quando a porcelana foi introduzida nas mesas européias, não demorou a chegar ao País. A novidade fez com que a indústria de peças utilitárias e decorativas de estanho, caísse em desuso. Além do mais, os artesãos já tinham acesso à sua matéria-prima.
O ressurgimento
Somente a partir da década de 1960, com a insistência de John Somers, que a fabricação de peças de estanho finalmente se consolidou.
Observando os altares das igrejas barrocas e a mão de obra local, Sommers percebeu que era possível se produzir estanho de qualidade, nos moldes do século dezoito, porém, com tecnologia moderna. Ele aprendeu a fabricar as peças e ensinou o ofício a outras pessoas. Logo, fábricas de produtos de estanho proliferaram pela cidade mineira, que hoje constituem-se na identificação cultural e incentivam o turismo na tradicional cidade mineira.
As peças artesanais em estanho remetem à identidade cultural sanjoanense
A liga
O estanho é um metal beneficiado a partir da cassiterita, muito macio, o que impede de ser utilizado puro. Por isso, é feita uma liga denominada “pewter”, que contém de 90 a 98% de estanho, sendo o restante composto por 1 a 8% de antimônio e 0,25 a 3% de cobre.
Este detalhe é significativamente importante, pois é a garantia que as empresas dão aos seus clientes de que seus artigos, principalmente para uso alimentar, são fabricados por essa liga reconhecida como “pewter”.
O estanho é um metal quimicamente estável, razão pela qual é usado em utensílios de mesa, porque não altera o sabor ou a propriedade dos alimentos.
O artesanato em estanho de São João del Rei tem características barrocas. Peças sacras e utensílios domésticos possuem design colonial o que reforça a identidade cultural da cidade. Nas peças sacras, são mantidas as formas arredondadas da religiosidade sanjoanense, aspecto que agrega valor ao produto.
Desenvolvimento regional
A cidade possui hoje 10 fábricas, com uma produção de 5 mil peças por mês. O faturamento médio das empresas é da ordem de R$ 150 mil por mês, gerando, pelo menos, 80 empregos diretos, além do montante de R$ 15 mil mensais de impostos para o município.
Acabamento
O processo de fabricação é todo artesanal, feito por profissionais qualificados. As peças são fundidas em moldes metálicos, geralmente ferro fundido, e depois torneadas. Por fim, recebem dois acabamentos:
- O polido: é a cor original do estanho, com alto grau de polimento, onde a peça fica toda brilhante.
- O fosco: seu envelhecimento é conseguido artificialmente com banhos de imersão em solução ácida. A peça torna-se fosca e algumas têm um friso polido, revelando um contraste muito bonito.
As peças em estanho são a expressão de um patrimônio imaterial relacionado ao saber-fazer artesanal, com as características identitárias e culturais próprias da cidade de São João del Rei.
O selo traz consigo uma garantia de qualidade e, segundo os produtores, o turista se sente mais seguro em comprar o produto com o reconhecimento de Indicação Geográfica. Com a certificação, foi possível o fortalecimento do grupo de artesãos, pelo aumento da competitividade e maior atratividade do produto. Todos esses aspectos consolidam a tradição, favorecendo assim, o desenvolvimento regional.