A agrissilvicultura com Palmeira Real é uma alternativa tecnicamente viável, economicamente rentável, que auxilia na recuperação de áreas degradadas e possibilita o desenvolvimento sustentável da cadeia produtiva do palmito de qualidade
A Agrissilvicultura é uma ciência que envolve técnicas para a prática de cultivo conjunto entre árvores e culturas agrícolas, em um mesmo ambiente, também denominada Sistemas Agroflorestais (SAFs). Quando utilizada em áreas desmatadas, possibilita a inclusão de plantas de interesse econômico e ambiental, favorecendo, ao mesmo tempo, ao meio ambiente e ao agronegócio.
O palmito é uma alternativa de renda muito interessante para o agronegócio brasileiro. É um produto muito apreciado pela gastronomia mundial e tem elevado valor agregado, principalmente quando apresenta características sensoriais desejáveis, como textura macia, gosto delicado e cor branca. Geralmente é comercializado sob forma de conserva, e, recentemente, in natura, em churrascarias e restaurantes especializados.
Opção ao palmito do Açaí
O produto foi inserido no mercado de alimentos a partir dos anos 30 do século passado. Inicialmente, a oferta comercial do palmito brasileiro tinha origem no extrativismo florestal, que levou à devastação das palmeiras Juçara – atualmente protegidas – da Mata Atlântica, seu bioma natural. Atualmente, 90% da oferta de palmito são provenientes da palmeira do Açaí, originária da Amazônia, que além de causar impacto nos palmitais nativos, apresenta características sensoriais inferiores. Outro importante aspecto negativo é seu balanço energético, considerando a distância de seis mil quilômetros entre a extração, beneficiamento e consumo, percorridos em caminhões a óleo diesel. Além disso, as conservas trazem água da região Amazônica, desprezada antes do consumo do palmito.
Palmeira Real: alternativa viável
Como uma alternativa, a região Sul do Brasil, que já produzia a Palmeira Real como planta ornamental, deu início a um projeto objetivando, também, o aproveitamento do palmito. Diante da potencialidade e adaptação da cultura, há 10 anos os estados de Santa Catarina e do Paraná produzem e comercializam o palmito de Palmeira Real, inclusive com incentivos, provenientes de recursos públicos, para o plantio.
Os bons resultados das explorações sulinas despertaram o interesse na região Sudeste, onde já existem plantios em São Paulo, Minas, Espírito Santo e Rio de Janeiro.
No Rio de Janeiro, o despertar para essa inovação no Agronegócio se deu ainda em 1999, quando um grupo originado de ONGs e da Associação de Moradores do Morgado (Guaratiba) deu inicio ao “Projeto Portal Sul do Parque Estadual da Pedra Branca” – um dos maiores parques urbanos do mundo – de forma a demonstrar essa alternativa ambiental e econômica para dezenas de milhares de famílias, remanescentes da antiga área rural do entorno do Parque. Até então, essa comunidade sobreviveu da subsistência com a bananicultura, que apresenta baixo retorno econômico, grande potencial de erosão do solo, perda de água e risco de incêndio para a Mata Atlântica, protegida pelo Parque Estadual Pedra Branca (PEPB).
A palmeira real é uma cultura que se desenvolve bem em áreas sombreadas, proporcionadas, inicialmente, pela bananicultura ou capões, e substituída, continuamente, pelo plantio de espécies florestais naturais da Mata Atlantica, proporcionando a formação de uma floresta rala e a recuperação de áreas degradadas.
Características conservacionistas
No projeto piloto, a inserção da Palmeira Real, plantada em 10 hectares no Portal Sul do Parque Estadual da Pedra Branca, demonstrou sua grande potencialidade quanto ao fator ambiental para preservação e proteção, por meio da criação de um cinturão verde agroflorestal, que funcionará como um cordão de isolamento, impedindo a proliferação dos focos de incêndio, e ainda promovendo o aumento da produção de água e a recuperação das nascentes, resultado da maior infiltração e armazenamento de água – que não se perdeu pelas enxurradas – no subsolo. Atualmente, o plantio da Palmeira Real tem sido utilizado em vários locais para a recuperação de áreas degradadas e de nascentes – cujo volume hídrico diminuiu devido a décadas de desmatamento.
O projeto, que a princípio tratava a Palmeira Real como uma alternativa local para os bananicultores da região de Guaratiba, no Rio de Janeiro, cuja renda vinha sendo cada vez mais reduzida em virtude do empobrecimento e da erosão dos solos, doenças da bananicultura e escassez da mão de obra familiar, foi além disso. Envolveu profissionais da Embrapa, Emater-Rio, MDA, MAPA, Associação dos Engenheiros Agrônomos do Estado do Rio de Janeiro, ONG Work, Ong Orgânica Brasil e Tropiflora, que estão trabalhando nessa inovação para diversos municípios fluminenses, principalmente para os da região Serrana (Petrópolis, Teresópolis e Nova Friburgo), onde a retenção hídrica é crucial nos vales, que abrangem vários quilômetros quadrados de áreas desmatadas, com riscos anuais de novos desastres, como os ocorridos nas chuvas de verão em 2011.
Estima-se que, atualmente, o Brasil tenha cerca de 60.000 hectares de Palmeira Real plantada exclusivamente para a produção de palmito. No do Estado do Rio de Janeiro, os municípios que já produzem Palmeira Real no sistema de agrissilvicultura são Angra dos Reis, Conceição de Macabu, Silva Jardim, Bom Jardim, Cachoeiras de Macacu, Nova Iguaçu, Silva Jardim e Petrópolis.
Alguns atrativos da agrissilvicultura com Palmeira Real:
- Custo de implantação da lavoura relativamente baixo;
- Baixo custo de manutenção;
- Superiores características organolépticas e de textura do palmito;
- Maior precocidade de produção – em média, 36 meses após o plantio efetua-se o corte;
- Boa produtividade de palmito por área e com bom rendimento no processamento;
- Boa resposta de plantio dentro da mata ou capoeira;
- Renda dez vezes maior se comparada à bananicultura;
- Aumento da área de sombra, o que permite o aparecimento de espécies nativas;
- Estímulo ao agricultor para preservação da mata nativa;
- Melhora no nível de mananciais, por reter água no subsolo e evitar as enchentes nas baixadas;
- Futura produção de biomassa, já que o caule pode ser utilizado como carvão;
- Aproveitamento das folhas para ração animal (gado) ou recuperação do húmus e matéria orgânica no solo;
- Geração de créditos de carbono (pois não há corte completo da área plantada e a floresta rala se perpetuará).
Dados Econômicos
– Em Santa Catarina, na região Sul, a densidade de plantio chega a 16.000 plantas por hectare.
– Nos plantios em áreas montanhosas do Rio de Janeiro, como em bananais degradados, a densidade varia de 8.000 a 10.000 plantas/hectare.
– O custo de implantação da Palmeira Real associada a plantas nativas (mudas mão de obra, insumos e manutenção) para o plantio de 10.000 plantas/ha, no sistema convencional, fica em torno de R$ 15 mil, em três anos.
– Já o mesmo custo, considerando a agricultura familiar e a produção das mudas no local, cai para R$ 5 mil.
– Por ser uma cultura rústica, na implantação da produção, a palmeira real recebeu somente calcário e adubação orgânica no berço.
– Pesquisas realizadas pela Epagri (Santa Catarina) e pela Embrapa mostram que adubações químicas aumentam o desenvolvimento e o peso do palmito.
– A receita estimada para a cultura, considerando a densidade de 10.000 plantas/ha, a partir do terceiro ano de cultivo, com corte de 1/3 das plantas por ano, é de R$ 10.000,00/ano (venda para envasadoras de palmito particulares). No caso de venda direta para restaurantes, a receita é de R$ 20.000,00/ano.
– Com o cultivo da banana, a agricultura familiar tem uma receita anual que não passa de R$ 1.000,00/ha. Consorciando com a palmeira real, a renda é 10 vezes maior.
Ingo André Haberle, José Leonel C. D. Rocha Lima, Enio Fraga da Silva e Lilian Grace Aliprandini, engenheiros agrônomos e membros da Associação dos Engenheiros Agrônomos do Rio de Janeiro (AEARJ)