Crescimento da produção e o aumento da demanda elevam a competitividade dos produtos orgânicos frente ao mercado convencional. Com preços mais atrativos e com grandes empresas investindo nesse nicho, orgânicos abandonam o status de produto marginal e ganham cada vez mais espaço na lista de compras do consumidor
Pelo menos uma vez por semana, a cenógrafa Teresa Devulsky vai até a uma feira orgânica no bairro onde mora, em Ipanema, zona sul do Rio de Janeiro, e volta com o carrinho cheio de produtos que, segundo ela, “no sistema tradicional de produção recebem muitos aditivos químicos”. Adepta da alimentação natural há trinta anos, Devulsky percebeu a evolução do mercado orgânico ao longo do tempo.
“Naquela época, era bastante caro e não existiam muitas opções, então, eu consumia poucos produtos. Hoje, a oferta é maior e mais variada. Já consigo encontrar alface orgânica por R$ 1,50, preço similar à convencional”, afirma.
Teresa encaixa-se perfeitamente no perfil brasileiro do consumidor médio de alimentos orgânicos que, segundo pesquisa realizada pela Organic Services, é composto de mulheres acima dos 40 anos, com alto grau de escolaridade e maior poder aquisitivo. Além disso, ela já percebeu – como consumidora atenta ao mercado e ao bolso – que a tendência é de queda na diferença dos preços entre orgânicos e convencionais.
Orgânicos x convencionais
E Teresa não está sozinha. Quem também faz coro com essa teoria é o diretor comercial da rede de supermercados Zona Sul, Pietrangelo Leta. Quando perguntado se os orgânicos serão, um dia, competitivos com produtos convencionais, ele é enfático: “Pelo menos, no Zona Sul já são. Fazemos promoções semanais com mais de 20 itens. Acredito que o maior desafio, hoje, seja a cadeia de produção e o processo logístico. Ou seja, ter produto em loja, pronto para consumo, 365 dias do ano”.
De acordo com o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), o mercado de produtos orgânicos movimenta hoje, no Brasil, em torno de meio bilhão de reais. Esse mercado cresce entre 15% e 20% ao ano. Por conta do aumento na demanda, além de atuar no varejo de orgânicos desde 1998, o Zona Sul criou, há dois anos, uma marca própria, a BioVida, que inclui verduras e legumes certificados e cresce 60% ao ano.
Outros grandes grupos também começaram a deixar o conservadorismo de lado. Marcas como União, Pilão e o Grupo Pão de Açúcar, também já atuam na produção, distribuição e venda de orgânicos.
O problema é de escala
O preço não tem sido um entrave para o aumento do consumo orgânico. Pelo menos é o que afirma quem está do outro lado da cadeia produtiva. “A principal dificuldade é o crescimento, isto é, como aumentar a capacidade interna de produção, sem que isso afete na qualidade final do produto”, afirma Adilson Lunardi, coordenador da Cooperagreco – Cooperativa de Agricultores Ecológicos das Encostas da Serra Geral, em Santa Catarina, que faz parte do projeto OrganicsNet, da SNA. Na cooperativa, 200 famílias trabalham na produção e beneficiamento de produtos orgânicos em 21 unidades espalhadas por oito municípios da região.
A cooperativa, que viu o número de associados quase triplicar nos últimos dois anos e fechou o faturamento do ano passado em R$ 4 milhões, vê com bons olhos a entrada de grandes empresas no mercado orgânico. “Com a adesão dessas grandes marcas, aumentam-se as oportunidades. O orgânico, então, deixa de ser um produto marginal para ganhar visibilidade do consumidor”.
Orgânicos mais caros: um mito?
A discussão em torno dos preços dos orgânicos vai longe. Essa dúvida aparece principalmente em pessoas que deixam de consumi-los, exatamente por este fator: o preço. Segundo a Euromonitor, especialista em pesquisas de mercado, no Brasil, orgânicos são de 60% a 100% mais caros que os produtos convencionais.
Esse fato não é exclusividade do país. Na pesquisa Healthy Eating Consumer Trend Report, realizada este ano, nos Estados Unidos, sobre tendências no consumo de alimentos saudáveis, foram ouvidos 1500 consumidores, e apenas 11% dos entrevistados disseram estar dispostos a pagar além de 5% a mais em um produto orgânico, enquanto 23% pagariam “um pouco mais” (até 5% mais caro). Entre os 289 que nunca compraram orgânicos, 79% argumentaram ser “muito caro”.
Lunardi aponta um equívoco na comparação de preços em grande parte das pesquisas realizadas. “Não se pode comparar um produto orgânico com um produto convencional, sem qualquer tipo de qualificação. Orgânicos são certificados e têm alto padrão de qualidade”. O coordenador da Cooperagreco explica que este tipo de comparação provoca distorções no resultado final da pesquisa. “Se compararmos, por exemplo, uma geleia orgânica com uma geleia convencional, sendo a última feita a partir de frutas importadas, encontraremos preços semelhantes”.
Outro ponto levantado por Lunardi é a margem de lucro de alguns setores. “Alguns canais de venda praticam altas margens de lucro. Isso ocorre principalmente no varejo, que possui margens elásticas”, diz Lunardi, referindo-se principalmente às grandes redes de supermercados. Quanto a isso, Teresa, nossa personagem lá do início da matéria, dá a dica: “Uma boa opção são as feiras, elas oferecem produtos com um preço mais atrativo, pois permitem que se compre direto do produtor”.
Já o diretor comercial do Zona Sul nega a prática de sobrepreço, pelo contrário, segundo ele, “ter produtos orgânicos é um diferencial, e por isso fazemos o possível para que o negócio seja sempre viável. Portanto, ter margens menores para um grupo de produtos que acreditamos no potencial faz parte do nosso dia a dia, da negociação à execução.” E complementa: “Internamente usamos a seguinte frase: problema do fornecedor mais problema do supermercado é igual à solução para o cliente”.
Mito ou não, o fato é que durante o fechamento dessa matéria, o jornalista bebia um suco de laranja orgânico comprado por R$ 12,59 (1 litro). No mesmo supermercado. O suco convencional, com a mesma quantidade, que anuncia possuir “gominhos de laranja”, sai por R$ 5,77. E, por mais que o consumo desses produtos venha aumentando a cada ano, também é fato que muitos fatores contribuem para o encarecimento da sua produção. E é justamente este tema que traremos na próxima edição da A Lavoura.
O Centro de Inteligência em Orgânicos (CIO), da SNA, com o apoio do Sebrae, se mobiliza diariamente para trazer conteúdo de qualidade sobre o mercado e a produção de orgânicos no Brasil. Através da reunião de artigos, publicações, dissertações e textos técnicos, produzidos em centros e instituições de pesquisa de todo o país, leva conhecimento até produtores, consumidores, assim como promove a troca informações com especialistas e interessados no setor de orgânicos, dentro e fora do país.
O CIO quer contribuir para o fortalecimento da cadeia produtiva de alimentos e produtos orgânicos, ajudando a entender melhor o diferencial e as vantagens desse mercado, que ainda tem muito a crescer, mas que aos poucos vai mostrando sinais de amadurecimento.
Para conhecer melhor o projeto acesse: www.ciorganicos.com.br.
“CI Orgânicos, sua rede de conhecimento”