Uma das mais devastadoras pragas que atingiram as lavouras brasileiras nos últimos dois anos foi a Helicoverpa armigera. Mesmo em fase de controle no País, ela ainda tem causado estragos no campo. Armadilhas, bioinseticidas e inimigos naturais podem controlá-las sem que o produtor precise aplicar defensivos agrícolas de forma descontrolada
Há mais de dois anos, desde o registro do primeiro caso no País, no município de Luís Eduardo Magalhães, Oeste da Bahia, e seu alastramento para vários Estados brasileiros causando prejuízos às lavouras, que passaram dos bilhões de dólares, a Helicoverpa armigera tem sido um desafio para produtores rurais e pesquisadores. Após o surto no campo, especialistas passaram a pesquisar as diversas formas de combater esta praga e o principal método — mais sustentável e sem a utilização indiscriminada de defensivos agrícolas — tem sido o Manejo Integrado de Pragas (MIP).
De acordo com o pesquisador Ivan Cruz, da Embrapa Milho e Sorgo (MG), a Helicoverpa tem grande resistência a vários produtos químicos. “No Oeste da Bahia, os produtores usaram muitos agrotóxicos, mas não evitaram perdas econômicas até verem que o caminho não era este”, comenta.
Ele explica que na cultura do milho, por exemplo, a praga coloca seus ovos no cabelo do grão e, na fase de larva, se esconde dentro da espiga. Por isto, a cobertura das folhas e a proteção da palha impedem que os agroquímicos consigam atingi-la de forma eficiente.
Controle biológico
“O inseticida mata os (insetos) benéficos, além das pragas. Em poucos dias, acaba o resíduo químico. A praga retorna, não encontra inimigos naturais e sua população volta a crescer”, alerta Cruz.
Por isso, o especialista garante que o controle biológico é a alternativa mais eficaz, o que colaborou para o incentivo à criação de biofábricas, até porque a demanda por bioinseticidas cresceu.
“Basicamente, muitos dos agentes de controle biológico da praga em seu local de origem ocorrem no Brasil, como é o caso do parasitoide Trichogramma pretiosum ou do percevejo Orius insidiosus, ambos atuando sobre os ovos da praga, e, portanto, evitando qualquer tipo de dano na planta hospedeira”, informa Ivan Cruz, pesquisador da Embrapa Milho e Sorgo (MG).
De acordo com ele, vários outros insetos benéficos generalistas também têm tido um papel importante no controle natural da praga, como é o caso de diferentes espécies de outros percevejos. “Existem também espécies de insetos benéficos associados às lagartas e pupas. São aqueles que, em sua fase jovem, geralmente estão dentro do corpo do inseto. Seus adultos, de vida livre, são muito ágeis e de difícil visualização no campo, podendo passar despercebidos. Mas ainda é inquestionável a atuação de cada um.”
Para o MIP Helicoverpa, assim como outros, o pesquisador defende uso de armadilhas de feromônios para monitoramento. “A coleta de mariposas melhora o tempo hábil para adotar medidas de controle.” Se a captura de mariposas indicar uma incidência da praga, que demanda controle, é feita a liberação de vespinhas Trichogramma spp.
Outro estudo conduzido por Cruz mostra o redesenho da paisagem agrícola com cultivos para proteção e manutenção dos insetos benéficos. Nela, são inseridas faixas de plantas — como girassol e sorgo — junto às lavouras, para que estes insetos tenham mais abrigos e alimentos complementares. “A diversidade vegetal favorece a atuação dos benéficos.”
Biopesticidas
Hoje, existem vários inseticidas aprovados e registrados para o controle da Helicoverpa armigera, cuja lista pode ser consultada no site Agrofit, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). É importante destacar que os biopesticidas têm papel relevante para o Manejo Integrado de Pragas.
“Houve a aprovação emergencial de um isolado de baculovírus que já é comercializado no Brasil. Há também várias pesquisas sendo conduzidas com o uso de isolados de Bt (Bacillus thuringiensis), com resultados promissores”, explica o pesquisador da Embrapa engenheiro agrônomo Fernando Valicente, Phd em controle biológico.
Os biopesticidas à base de baculovírus (vírus com potencial para controle de pragas) e à base de Bt (bactérias que têm propriedades inseticidas) são específicos em relação aos insetos-alvo e não causam danos a outras formas de vida.
Controle
Atualmente, a Helicoverpa não desapareceu por completo. “O inseto continua a ocorrer, mas agora dentro da normalidade. Não sumiu, mas está em um padrão aceitável para manejo”, comenta o especialista, garantindo que já existe resistência no ambiente que mantém a armigera sob controle.
A diminuição da ocorrência desta praga se deve à ação dos controladores biológicos naturais. “Hoje é comum ver ovos de Helicoverpa parasitados por Trichogramma e o Orius, percevejo que tem presença na espiga e come ovos de lagartas. A “tesourinha” (Doru luteipes), que também devora grande quantidade de ovos de pragas. Ou seja, temos agentes de controle biológico de alta incidência. A praga está presente, mas não causa danos consideráveis”, afirma Cruz.
Primeira biofábrica
Para produzir a vespa Trichogramma foi inaugurada em agosto de 2014, no Estado de Rio Grande do Sul, a primeira biofábrica do País para o controle de lagartas, principalmente a Helicoverpa. A produção inicial cobriu aproximadamente sete mil hectares ao ano das culturas de feijão, milho e soja; depois se expandiu para 20 mil hectares de lavouras na safra 2014/15.
A abertura da unidade, que funciona no município gaúcho de Montenegro, foi possível graças à parceria entre a Emater/RS-Ascar e a Secretaria de Desenvolvimento Rural, Pesca e Cooperativismo (SDR), em parceria com a Embrapa Milho e Sorgo.
A biofábrica detém a tecnologia de produção e uso do Trichogramma spp e atua com o trabalho de mais de 200 técnicos no monitoramento e controle biológico das lagartas em lavouras de milho assistidas pela extensão rural no Estado.