Pesquisa desenvolve pimentas mais picantes para fabricação de molhos
BRS Juruti e BRS Nandaia são as primeiras cultivares nacionais de pimenta-habanero, espécie originária do México que, além de ser bem picante, possui alto teor de vitamina C. Ambas foram desenvolvidas por pesquisadores da área de Melhoramento Genético da Embrapa Hortaliças (DF).
O continente americano é o centro de origem das pimentas do gênero Capsicum, do qual a pimenta-habanero faz parte, assim como pimentas de brasileiras, como a malagueta e a dedo-de-moça.
Processamento
Destinadas ao processamento, as cultivares de polinização aberta apresentam elevada pungência, característica relacionada à substância capsaicina, examinada pela escala de Scoville, que mede em Unidades de Calor (SHU ) o grau de ardência das pimentas.
Os frutos da BRS Nandaia e BRS Juruti são muito picantes e atingem, respectivamente, cerca de 200 mil SHU e 260 mil SHU .
Para fazer uma comparação, a dedo-de-moça pode alcançar, no máximo, 90 mil SHU e a malagueta por volta de 160 mil SHU.
Fabricação de molhos
O alto teor de ardência é a característica que torna as duas cultivares uma opção para a fabricação de molhos e pastas (mash) de pimenta. “Além disto, elas são mais adaptadas às condições de cultivo do Brasil Central, região onde se concentra a maior parte das indústrias”, contextualiza a pesquisadora Cláudia Ribeiro, da Embrapa Hortaliças.
Ela comenta que os molhos são produzidos a partir de misturas, ou blends, de diferentes tipos de pimenta. “O tipo jalapeño possui polpa espessa e bom rendimento, mas pungência média. Por isto, fazer uma combinação com a pimenta-habanero garante maior picância para o molho”, informa.
Diferença
A principal diferença entre as novas cultivares é a coloração: a BRS Juruti mantém o usual vermelho das pimentas e a BRS Nandaia chama a atenção pelo tom alaranjado. Segundo a pesquisadora, a proposta é apresentar uma vantagem competitiva já que, atualmente, há nichos de mercado consolidados para molhos de pimenta com tonalidades variadas.
No campo, a uniformidade no plantio e a resistência a doenças asseguram o interesse dos setores produtivo e industrial, enquanto, do outro lado, a aptidão também para o mercado de frutos frescos e o alto teor de vitamina C são pontos de destaque para os consumidores.
“As informações sobre o valor nutricional são diferenciais que agregam valor ao produto”, salienta Cláudia, ao ressaltar que as novas cultivares do tipo habanero possuem por volta de 120 miligramas de vitamina C por 100 gramas de fruto, duas vezes mais em relação à mesma porção de laranja ou kiwi.
Foto: Embrapa Hortaliças
As pimentas habanero e jalapeño são ótimas variedades para processamento
Melhoramento genético
Valorizadas pela versatilidade culinária e ornamental, as pimentas do gênero Capsicum (em grego, kapso significa picar ou arder) se dividem em 30 espécies, entre silvestres e domesticadas. A grande diversidade de tipos de pimenta é um desafio para o programa de melhoramento genético, que deve considerar as demandas dos produtores, geralmente de base familiar, e da indústria processadora, ao mesmo tempo que observa os nichos e as oportunidades do mercado.
Características agronômicas, – como resistência a pragas e doenças, produtividade, rendimento dos frutos e uniformidade – lideram as solicitações dos setores produtivo e industrial. “No Brasil, o consumo fresco ainda é muito baixo, por isso, as demandas dos agricultores são pautadas basicamente na oferta de uma matéria-prima de qualidade com foco no processamento industrial”, analisa Cláudia.
Ela destaca que 80% dos recursos de pesquisa são alocados no atendimento às demandas da cadeia produtiva, enquanto 20% são investidos em novas oportunidades de mercado, como as pimentas de variados formatos, cores, aromas e sabores.
A busca por materiais precoces também tem norteado a pesquisa com pimentas do gênero Capsicum, principalmente em tempos de alterações climáticas, que implicam em modificações no calendário de plantio. Assim como as demais espécies da família das Solanáceas, como berinjela e tomate, as pimentas precisam de temperatura e umidade, mas não em excesso, para se desenvolver.
As chuvas no mês de transplantio das mudas, no entanto, adiam o preparo das áreas e comprometem o período da colheita. “Se o agricultor dispõe de um material precoce, fica mais fácil flexibilizar o calendário de plantio para que a primeira colheita não coincida com os períodos chuvosos.
Dependendo do planejamento, é possível contar com dois plantios em um único ano”, explica a pesquisadora.
BRS Sarakura
Ao longo de mais de três décadas do programa de melhoramento genético de Capsicum, alguns materiais impressionaram e foram amplamente adotados pela cadeia produtiva. Este é o caso da cultivar BRS Sarakura, pimenta do tipo jalapeño, que foi desenvolvida em parceria com a Sakura-Nakaya, empresa que responde por mais da metade dos molhos de pimenta comercializados no País.
Com frutos grandes e boa espessura de polpa, esta cultivar é adequada para o processamento. “Neste caso, mesmo trabalhando com a indústria, sabemos que o resultado da pesquisa foi para a melhoria de renda dos produtores. O material foi muito bem aceito e, desde quando foi disponibilizado, tem sido plantado anualmente”, conta Cláudia.
“Agricultores focam na produção de pimentas de qualidade para processamento industrial”
Consumidores
Dentro do segmento dedo-de-moça, a pimenta BRS Mari ocupa uma fatia importante do mercado. De acordo com a pesquisadora, além de rústica e produtiva, ela apresenta alto grau de picância e, por isto, quando está sob a forma de flocos desidratados, resulta em uma pimenta calabresa de alta qualidade.
Enquanto alguns consumidores têm preferência por frutos ardidos, há quem valorize o aroma e o sabor, mas dispensa qualquer pungência. “A pimenta BRS Moema, do tipo biquinho, é uma boa opção para esses consumidores, tanto para o consumo fresco quanto para o processamento de conservas e geleias”, pontua Cláudia.
No Brasil, há preferências regionais que devem ser consideradas, segundo ela, na hora que a pesquisa disponibilizar novos tipos de pimenta.
BRS Brasilândia
Outro material de destaque que compõe o portfólio de cultivares de pimentas lançadas pela Embrapa é a BRS Brasilândia, recomendada para processamento na forma de páprica, um pó de coloração vermelha obtido pela moagem de frutos desidratados e utilizado pela indústria alimentícia como corante.
Condimento muito consumido em todo o mundo, o mercado global de pimentas e pimentões desidratados é estimado em 500 mil toneladas ou cerca de nove bilhões de dólares. Conforme a pesquisadora, este também foi o primeiro híbrido lançado no País para produção de páprica. “Se antes era preciso cinco quilos de fruto fresco para atingir um quilo de páprica, com a BRS Brasilândia a proporção caiu de 3,7 para um.”
Além-mar
Ingrediente certo na cozinha mexicana, as pimentas do gênero Capsicum também ganharam destaque na culinária de outros países como Índia, Tailândia e Coreia. Isto foi possível porque, na ocasião do descobrimento da América, as espécies cruzaram o Oceano Atlântico a bordo de navios dos exploradores europeus, que ficaram encantados com o potencial da pimenta como condimento.
Por volta do século 16, o cultivo já havia se propagado pela Ásia e pela África e, hoje, mais de 500 anos depois, a pimenta faz esta mesma rota, mas desta vez, na área de projetos de cooperação técnica da plataforma MarketPlace de Inovação Agropecuária.
“Estão vigentes parcerias com Togo e Uganda para testarmos a adaptação de cultivares naqueles países, com o propósito de aumentar a variabilidade genética e a resistência a doenças enfrentadas pelos produtores africanos”, comenta Cláudia.
Ela ainda aponta a necessidade de agregar valor às pimentas para melhoria de renda dos pequenos produtores e em atendimento às demandas dos mercados regionais destas nações.
Os projetos também pretendem promover o uso de cultivares brasileiras de Capsicum para fortalecer a cadeia produtiva local, do ponto de vista da produtividade e da qualidade da semente para os próximos plantios. “A ideia é construir uma abordagem participativa entre técnicos e agricultores, para promover a sustentabilidade do setor e treinar esses profissionais para o aperfeiçoamento do sistema de produção da cultura”, relata Cláudia, acrescentando que a cooperação técnica será desenvolvida até setembro de 2017.
Paula Rodrigues
Embrapa Hortaliças