Gerenciamento de resíduos transforma produtos nocivos em nutrientes benéficos para o solo e meio ambiente
Contribuir com o meio ambiente, recebendo resíduos dos setores florestal, urbanístico, pecuário, além de restos de frutas, legumes e verduras, com o objetivo de transformar o que era maléfico em produtos ricos em nutrientes benéficos para o solo e o meio ambiente. Esta é uma das missões da GR Agrária, startup voltada para a reciclagem de compostos orgânicos.
“Nosso processo de compostagem é automatizado e os resíduos são transformados pela ação da própria natureza, com a ajuda dos microrganismos, em locais apropriados”, explica o engenheiro agrônomo e responsável técnico da GR Agrária, Guilherme de Sá Santos. “O resultado é a geração de composto orgânico e substrato natural saudável para o meio ambiente, não agressivo à saúde do agricultor e do consumidor.”
Registrada no Ministério da Agricultura, Licenciada pelo Órgão Ambiental competente e com o selo do IBD para Agricultura Orgânica, a GR Agrária produz o único Fertilizante Orgânico Composto – Classe A registrado no Brasil, com sangue bovino em sua formulação.
Em entrevista para a Revista A Lavoura, o agrônomo conta sobre as ações da empresa em prol do meio ambiente. “Nosso trabalho é 100% voltado ao apelo ambiental. Com isso, evitamos que toneladas de resíduos nocivos sejam descartados no ecossistema de forma ilegal e prejudicial ao ambiente e sociedade”, acrescenta Santos.
Revista A Lavoura: Como surgiu a GR Agrária?
Guilherme de Sá: A GR Agrária é uma célula da Grande Rio Alimentos, sediada em Nova Iguaçu (RJ), a mesma que vem, há anos, no setor de graxaria (produção de derivados da matança bovina). Com o comprometimento ambiental, que é marca registrada de todas as atividades da empresa, surgiu a necessidade de resolver o problema de gerenciamento de outros resíduos da cadeia bovina, de grande passivo ambiental. Na época, o sangue, que anteriormente era matéria-prima para fabricação de farinha para a composição de rações, passou a ser ingrediente para produção de adubo natural como forma alternativa de aproveitamento e reciclagem. O segundo resíduo gerador de passivo ambiental é o conteúdo ruminal, originado da limpeza do bucho bovino (capim pré digerido). Sendo assim, tínhamos dois problemas, o sangue e o rúmen que, clandestinamente, já estavam sendo derramados em terrenos, cursos de água, afluentes, etc., por grande maioria dos matadouros.
Revista A Lavoura: Qual a solução encontrada?
Guilherme de Sá: Para minimizar esses problemas, e com o apoio de órgãos de pesquisa, foi elaborado um arranjo entre sangue, conteúdo ruminal e maravalha (tritura de galhos e folhas de árvores), para fins de compostagem. Nasceu, então, o processo de compostagem com equipamentos específicos, em que a maravalha representa o agente de absorção do sangue e do rúmen, fornecendo carbono orgânico e cálcio ao final do processo. O rúmen, com sua riqueza microbiológica, serve como acelerador do processo de decomposição e fornece nitrogênio ao produto final, assim como microrganismos benéficos ao solo. O sangue representa uma fonte rica em nutrientes vitais ao desenvolvimento dos animais, que agora são totalmente incorporados a essa biomassa, enriquecendo e provocando a fermentação inicial.
Revista A Lavoura: Quais os desdobramentos dessa iniciativa?
Guilherme de Sá: A associação de matérias-primas, ao mesmo tempo que retirava esse enorme passivo do meio ambiente em nível regional, produzia um adubo orgânico de excelência que começou a ganhar forte aceitação dos agricultores que, inicialmente, eram presenteados com o produto para que fizessem sua avaliação. Com o sucesso nos diversos cultivos onde foi testado, nasceu a necessidade de se formar um setor comercial para começar a venda desse produto. Nasce, então, o Agri Natura (nome comercial), que recebeu o registro do Mapa, sendo classificado como um fertilizante orgânico composto – Classe A. Como já existia um registro nacional e um protocolo fixo para a produção, conseguimos a credibilidade do Instituto Biodinâmico (IBD), com selo de aprovação que valida insumos para uso de agricultores orgânicos certificados. Hoje nos integramos ao setor de jardinagem atingindo outro nicho de mercado para o Agri Natura, que agora não estava mais sozinho. Criamos uma linha de substratos específicos e terra adubada como produtos afins do mesmo setor, chamado de linha garden, envolvendo todos os estilos de jardinagem tropical.
A Lavoura: Quais as principais ações da startup?
Guilherme de Sá: Por enquanto, recebemos visitas de empresas, escolas e universidades. Eventualmente, promovemos dias de campo e participamos, com frequência, de feiras e eventos, para nos mantermos alinhados e atualizados em relação ao que está acontecendo dentro de nosso setor e em outros que se comunicam com nossas atividades. Também temos programas de coleta de óleo de cozinha para fabricação de sabão pastoso, estação de tratamento de efluentes e trabalhos sociais de conscientização ambiental em escolas, universidades e empresas. Além disso, realizamos trabalhos de educação ambiental com escolas e empresas e aceitamos visitações agendadas.
A Lavoura: Fale sobre o impacto dessas iniciativas.
Guilherme de Sá: Dentre os impactos diretos, vale ressaltar que a empresa emprega um número de funcionários bastante representativo, o que melhora o fator social da região onde está instalada, ao mesmo tempo que promove serviços ambientais de elevado valor regional.
A Lavoura: É possível traduzir a representatividade das ações em números?
Guilherme de Sá: Sim. Em 2022, recebemos 1.103.260 litros de Sangue, 2.037.745 quilogramas de Rúmen e 778.715 quilogramas de Maravalha.
A Lavoura: Qual a importância do trabalho da GR Agrária para o desenvolvimento do segmento?
Guilherme de Sá: Toda reciclagem de resíduo pode ser traduzida em reaproveitamento dos recursos naturais. Sabemos o quanto é urgente e necessário, de forma racional, estimular o uso desses recursos. No segmento alimentar, por exemplo, é enorme o desperdício dos alimentos que se perdem no trajeto e logística do campo à mesa. Esses e outros rejeitos, quando reutilizados, diminuem a extração dos minerais, que são recursos da natureza e, em tese, não deveriam estar sendo removidos durante todos esses anos para produção de fertilizantes minerais. Do ponto de vista agrícola, o uso de fertilizantes sintéticos é necessário para alcançar as produtividades para suprir a demanda de consumo. O que se faz, na maioria das vezes, é criar um cronograma de nutrição baseado somente nos adubos sintéticos. A falta de reposição da matéria orgânica cada vez mais vai diminuindo a eficiência dos fertilizantes e as doses tendem a aumentar para suprir esse déficit.
A Lavoura: Qual a expectativa em relação ao tratamento de resíduos?
Guilherme de Sá: Ainda temos muito para evoluir. Os órgãos de fiscalização precisam funcionar de forma mais efetiva para que as unidades recebam matérias-primas conforme previsto na Lei (Nº 12.305). Os países europeus já possuem equipamentos que segregam e destinam corretamente todos os tipos de resíduos, inclusive o chorume, de forma totalmente mecanizada. Esse setor não tem como deixar de crescer. O consumo é o start do negócio. O descarte e o gerenciamento dos mais variados tipos de resíduos estão caminhando para um cenário de maior organização, em que os órgãos públicos têm papel fundamental no processo.
A Lavoura: Quais os principais urgências do setor?
Guilherme de Sá: Temos duas urgências. A primeira é o acesso à orientação técnica correta sobre o uso racional dos defensivos químicos, principalmente para agricultores de pequeno e médio porte, que na maioria das vezes erram, para mais, nas dosagens desses produtos e sobre a importância de se respeitar os prazos de carência de cada produto, que é o número de dias seguro entre a aplicação e a colheita. Em segundo lugar, urge a conscientização por parte dos profissionais envolvidos em fomentar o uso dos adubos orgânicos associados às formulações minerais, como forma de aumentar a produtividade e, ao mesmo tempo, diminuir o consumo de fertilizantes, compensado pelos teores presentes nos orgânicos. Haveria maior incentivo à produção desse tipo de insumo, aumentando o reaproveitamento de resíduos orgânicos ricos em nutrientes que são diariamente desperdiçados em lixões e aterros sanitários.