Além de contribuir para a saúde e o bem-estar, a imunização dos animais diminui a incidência de transmissão de doenças para os humanos
Vivemos em um ambiente naturalmente colonizado por microrganismos diversos e muitos destes agentes, como fungos, bactérias, vírus e protozoários, vivem em harmonia com o ser humano e outros seres vivos, sem trazer malefícios para a saúde.
Porém, outros acabam gerando doenças infectocontagiosas que podem ter consequências graves ou até mesmo letais. Dentre elas, estão algumas que podem ser transmitidas naturalmente de animais para os seres humanos, e vice-versa.
Chamadas de zoonoses, elas têm importante destaque na medicina veterinária, pois a vacinação também auxilia na redução da taxa de contágio de outros animais e seres humanos, além de proteger individualmente o animal vacinado contra a doença.
De acordo com a médica-veterinária e gerente de produtos Pets da Ceva Saúde Animal, Nathalia Fleming, o contato do ser humano com os animais está se tornando cada vez mais íntimo, principalmente quando falamos de cães e gatos, que muitas das vezes vivem dentro de casa e dividem sofás e camas com seus tutores.
“A imunização desdes animais é de extrema importância para a proteção contra doenças infectocontagiosas, mas também traz uma contribuição relevante para a saúde pública, porque ajuda diretamente na prevenção de zoonoses, ou seja, a proteção do pet reflete na proteção dos humanos de sua convivência”, explica a especialista.
Ela alerta que algumas zoonoses demoram certo tempo para serem diagnosticadas nos animais, o que deve ser um ponto de atenção, já que eles podem atuar como fonte de contaminação. “Isso vale principalmente para doenças que precisam de um vetor, como o mosquito, para a sua disseminação, como a leishmaniose e a dirofilariose”, exemplifica Nathalia.
Perigos
Para entender melhor sobre a importância de manter a carteirinha de vacinação do pet em dia, ela cita quatro principais zoonoses que podem afetar pets e humanos, e que devem ser prevenidas com as visitas regulares ao médico veterinário:
“A raiva, transmitida pelo contato com a saliva de morcegos hematófagos (que se alimentam de sangue), é uma doença incurável, letal, causada por um vírus que atinge o sistema nervoso central (cérebro) e pode acometer todas as espécies de mamíferos”, informa.
Ela acrescenta que o vírus causador da doença se aloja nas glândulas salivares do mamífero contaminado e ali se prolifera, promovendo o sintoma mais conhecido: a salivação excessiva.
“Posteriormente o vírus migra para o sistema nervoso central, ocasionando os outros sintomas: medo de água, incômodos com a claridade (fotofobia), depressão, perda de apetite e comportamento agressivo”, completa.
A contaminação dos seres humanos se dá, em sua maioria pela mordida de gatos e cachorros que possam estar com o vírus. “A doença tem tanta importância que o seu controle acontece por meio de campanhas governamentais de vacinação anual dos pets e de outros animais que convivem diretamente com os seres humanos (equinos, bovinos, pets silvestres”, explica.
A leptospirose
Causada principalmente pela bactéria Leptospira interrogans, a leptospirose afeta diversas espécies de mamíferos domésticos e selvagens. Os principais hospedeiros da bactéria e agentes transmissores da doença são os roedores.
Segundo Nathalia, a Leptospira sp. contamina o ambiente através da urina dos ratos e penetra no organismo de outros animais, incluindo cães, gatos e seres humanos, através da água ou urina contaminada em contato com a pele lesionada e/ou mucosas. “A bactéria se aloja principalmente no fígado e nos rins, causando diversos problemas de saúde. e pode levar ao óbito”, explica.
Ela observa ainda que cães, gatos e outras espécies de animais que são contaminados pela bactéria passam também a eliminá-las pela urina, sendo um fator epidemiológico importante na disseminação da doença.
“A vacinação anual dos animais contra a leptospirose auxilia na proteção do pet, uma vez que impede que a bactéria se instale nos rins, fígado ou outros órgãos, e que seja eliminada pela urina, atuando também na ruptura do ciclo de contaminação de outros animais e de humanos”, destaca.
Leishmaniose visceral canina
Diferente das zoonoses citadas anteriormente, ela não é uma doença contagiosa, ou seja, para que aconteça a transmissão do protozoário para um animal doméstico, silvestre ou ser humano, é necessário que exista um vetor, e no caso da leishmaniose os vetores são os mosquitos flebotomíneos (que se alimentam de sangue).
Também conhecida como calazar, a leishmaniose é causada por um protozoário que vive e se multiplica no interior dos macrófagos, células que fazem parte do sistema de defesa do organismo. O “mosquito-palha, também conhecido como birigui, ingere o protozoário Leishmania sp. junto com o sangue do animal ou pessoa contaminada e, ao picar outro animal ou pessoa que não tenha a doença, deposita o protozoário na corrente sanguínea”, detalha.
Por se uma doença sistêmica, ela acomete vários órgãos como o fígado, baço e medula óssea, tem evolução longa, podendo durar meses ou anos. “Não existe cura para a leishmaniose em cães e o pet contaminado vai precisar de acompanhamento veterinário constante pelo resto da vida”, explica Nathalia.
Dirofilariose
Também conhecida como doença do verme do coração, é causada por um parasita nematoide que lembra a lombriga chamado Dirofilaria immitis. Da mesma forma que a leishmaniose, a dirofilariose é transmitida através da picada de mosquito, como o Aedes aegypti, que ingere as microfilárias de um animal previamente infectado, e que se desenvolvem dentro do mosquito e, a cada nova picada, ele as elimina em um novo hospedeiro.
Conforme explica, quando a pessoa ou animal é picado pelo mosquito que contém as larvas da Dirofilaria immitis, essas larvas migram pela corrente sanguínea até o tecido subcutâneo ou muscular, onde se tornam jovens adultas. Após cerca de 100 dias, elas chegam ao coração e se alojam no ventrículo direito e nas artérias pulmonares. Ali, crescem e se proliferam, liberando novas larvas na corrente sanguínea.
“A presença dos vermes no coração e nas artérias pulmonares promovem lesões nestes dois tecidos, causando sintomas cardiorrespiratórios como tosse, dificuldade em respirar, intolerância ao exercício e desmaios. Quando os vermes estão em grande concentração eles podem promover a insuficiência cardíaca congestiva”, explica.
A médica veterinária esclarece que, nos cães e gatos, a morte do parasita pode ocasionar a obstrução dos vasos sanguíneos e causar consequências graves. Já nos seres humanos, por se encontrarem em maior concentração nos pulmões, a morte dos vermes acarreta lesões com intensa reação inflamatória pulmonar.
“A dirofilariose é a única das zoonoses citadas que pode ser prevenida por meio de vacina ou vermífugos de uso recorrente, indicado especialmente para os pets que moram ou frequentam áreas litorâneas e com alta incidência de mosquitos”, menciona.
Por fim, Nathalia destaca que essas zoonoses são muito importantes para a saúde pública, já que afetam os seres humanos, com alto índice de consequências sérias. “Vacinar e proteger os pets contra essas zoonoses é um compromisso com a saúde animal e com a sociedade, pois ajuda a limitar os riscos e a transmissão das doenças para a população. Manter a carteirinha de vacinação e a rotina de vermifugação dos pets em dia é também uma forma de se proteger contra esses agentes”, finaliza.