Iniciativas para a produção de sementes e mudas certificadas no Brasil ainda são poucas para suprir a demanda de produtores orgânicos
É cada vez maior o esforço de empresas para aumentar a oferta de bioinsumos como sementes e mudas orgânicas, na produção sustentável. “Há regras viáveis a serem seguidas, mas isso é possível e está disponível. O setor público também trabalha para evitar a dependência de interesses comerciais de grandes grupos”, assinalou Paulo Christians, diretor da Bejo Sementes do Brasil, que participou do webinar “Sementes e mudas, insumos da produção orgânica”.
O encontro, organizado pela Sociedade Nacional de Agricultura (SNA) e Centro de Inteligência em Orgânicos (CI Orgânicos), foi coordenado pela diretora da SNA, Sylvia Wachsner.
“Agricultura orgânica pede bioinsumos. Enquanto não houver disponibilidade suficiente de sementes, seguindo as regras da oferta e da demanda, nós vamos continuar a permitir o uso de insumos não autorizados na produção orgânica. Há muitos outros tratamentos físicos que podem ser aplicados legalmente na produção de sementes e mudas orgânicas, zelando pela sua qualidade e sanidade”, ressaltou Christians durante o webinar.
Para ele, todos os representantes do setor orgânico deveriam se unir para garantir a disponibilidade dessas sementes e mudas e, ao mesmo tempo, utilizar sementes sem tratamento químico, enquanto o mercado for se adaptando e aumentando a oferta de insumos orgânicos.
“Algumas empresas já oferecem esse tipo de insumo. Precisamos divulgar essas opções”.
O executivo apoiou ainda a adoção de uma estratégia de comunicação para que as empresas do setor consigam mostrar o potencial do mercado de produção de sementes e mudas orgânicas.
Variedade
Por outro lado, no contexto do mercado de sementes convencionais, Fernando Ataliba, produtor rural do Sítio Catavento, observou que uma alta concentração de empresas está provocando uma redução na variedade de cultivares.
Ataliba explicou que a cada cinco anos é obrigado a trocar todo o material de plantio porque os cultivares não estão mais disponíveis no mercado. “Aí temos de procurar outro diferente. Isso é muito ruim. Parece que a indústria de sementes quer copiar a indústria automobilística, onde o modelo de veículo muda para que o consumidor desvalorize seu carro antigo e compre um novo”.
O produtor também ressaltou que o mercado lança cultivares com novas resistências a pragas e doenças, mas ponderou que “os agricultores orgânicos não precisam desse benefício, pois isso faz parte da lógica da agricultura convencional”.
Segundo Ataliba, a perda do material genético mais antigo é preocupante. “Os cultivares que são oferecidos pelas empresas podem ser tratados com produtos químicos indesejáveis, e a legislação orgânica nesse sentido é muito rigorosa e determina que sementes e mudas devem ser orgânicas, apesar de permitir bastante exceção”.
Para o produtor, “o mercado deveria oferecer um acesso maior a variedades de sementes, e sem nenhum tipo de tratamento químico”.
Políticas públicas
Por sua vez, Sakae Kinjo, gerente de Produção da Korin Agricultura e Meio Ambiente, afirmou que “existe espaço tanto para os agricultores que multiplicam suas sementes e também para as empresas”.
Segundo ela, as iniciativas para a produção de sementes certificadas no Brasil são poucas, mas apesar disso, destacou, “é preciso ter políticas públicas para o desenvolvimento de pesquisas, tecnologia e melhoramento genético”.
Kinjo defendeu ainda a capacitação de profissionais e a promoção de acordos de equivalência com outros países para o reconhecimento e a obtenção de sementes e outros insumos orgânicos. “Estamos trabalhando para aumentar a diversidade e o volume de sementes, mas é preciso que um número maior de pessoas tomem conhecimento desse trabalho e participe das discussões do setor”.
Na opinião de Daniel Araújo, engenheiro agrônomo e coordenador de Avaliação da Ecocert Brasil, “falta um olhar do gestor público para garantir subsídios e resolver esse gargalo da produção orgânica”. Segundo ele, “de nada adianta investir em pesquisas se posteriormente isso não será economicamente viável para o produtor, associação ou cooperativa. Nesse sentido, esperamos ver mudanças na legislação no próximo ano”, disse.
Conformidade
Na ocasião, o especialista comentou alguns aspectos da legislação do setor e chamou a atenção para o fato de que “o produtor interessado em certificar suas sementes como orgânicas, deve, antes de tudo, estar em conformidade com as normas básicas e procedimentos de produção geral de sementes no País”.
Araújo destacou também o artigo 5º da Instrução Normativa 38, do Ministério da Agricultura, lembrando que é proibida a certificação de sementes e mudas de cultivares geneticamente modificadas ou que utilizem irradiação.
Além disso, o especialista falou sobre as etapas do processo de auditoria para a certificação e afirmou que a análise da produção e do beneficiamento evita a possibilidade de casos de contaminação por sementes convencionais ou por outras substâncias que não são compatíveis com o sistema orgânico.
Já a diretora da SNA, Sylvia Wachsner, considerou que a utilização de mudas e sementes orgânicas no sistema orgânico de produção garante alta produtividade e rastreabilidade e oferece ao consumidor alimentos mais saudáveis. Nesse processo, disse ela, “é preciso estar atento ao manejo e à boa qualidade dos solos”.