Reconhecimento do “Fruto do Ouro” vem do trabalho desenvolvido em conjunto com instituições representativas dos cacauicultores, que integram a Rede de Governança do Cacau e Chocolate na região, em parceria com o Sebrae. Produtor Lucas Moreira Arléo (foto) comemora
A produção de cacau no Sul da Bahia acaba de ganhar um novo aliado na luta pelo reconhecimento de seu principal produto nos mercados nacional e internacional, graças à recente conquista do registro de Indicação Geográfica (IG), na espécie de Indicação de Procedência (IP) da amêndoa de cacau (Theobroma cacao L). Isso amplia os horizontes dos cacauicultores que integram a Associação Cacau Sul Bahia (ACSB).
A boa notícia foi publicada pelo Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (Inpi), na edição de abril da Revista de Propriedade Industrial (RPI), nº 2468.
O novo selo traz a oportunidade de ampliar o mercado consumidor, a partir da legitimidade conferida ao chamando “Fruto do Ouro”, segundo informações do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas da Bahia (Sebrae-BA).
Conforme a instituição, esse reconhecimento vem de um árduo trabalho desenvolvido em conjunto com instituições representativas dos produtores, que integram a Rede de Governança do Cacau e Chocolate na região, em parceria com o Sebrae.
IG é a sigla usada para Indicação Geográfica, que serve para identificar um produto ou serviço como originário de determinado local, região ou país, quando determinada reputação, característica e/ou qualidade vinculam, essencialmente, sua origem geográfica, sendo passíveis de proteção legal contra uso de terceiros. |
Área delimitada
A área geográfica beneficiada com o selo abrange um cultivo estimado de 61.460 quilômetros quadrados, em 83 municípios e seis territórios regionais: Baixo Sul, Médio Rio de Contas, Médio Sudoeste da Bahia, Litoral Sul, Costa do Descobrimento e Extremo Sul.
A Indicação Geográfica, além de ser um registro, é um movimento que, na visão do diretor executivo da ACSB, Cristiano Sant’ana, funciona como impulsionador, a fim de divulgar os produtos de uma determinada região, proteger a herança histórico-cultural, promover a qualidade e garantir a reputação do produto no mercado.
“O IG é um processo que vem sendo discutido há mais de dez anos, e se tornou uma ferramenta de agregação de valor, não só para a amêndoa, mas para a região como um todo”, destaca.
Como obter o selo
Para obter o selo de origem e de qualidade da Indicação Geográfica de Procedência, o produtor deve possuir propriedade localizada na região demarcada como da IP, ser associado a uma das associações ou cooperativas filiadas – no caso, a Associação Cacau Sul Bahia – e se adequar ao Regulamento de Uso (RU).
O RU se baseia nas normas e condições de uso da terra e a produção padronizada, na classificação física e sensorial de amêndoas de qualidade superior e no credenciamento de armazéns e processos de rastreabilidade.
Seguindo as normas do Conselho Regulador da IG Sul da Bahia, o cacau passa por uma avaliação técnica da Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac), do Centro de Inovação do Cacau (CIC) e pela ACSB.
‘Cabruca’
Uma das formas de cultivo do cacau que se enquadra na Indicação Geográfica é conhecida como cacau Cabruca. Segundo Sant’ana, esse fruto é produzido embaixo de grandes árvores da Mata Atlântica, preservando, assim, espécies raras da fauna e flora, como o mico-leão da cara dourada e o jequitibá, além da água, solo e o ar desta região.
“O cacau é a identidade do povo desta região e está nas histórias, na alimentação e no cenário local”, comenta o diretor executivo da ACSB.
Na Fazenda Santa Rita, município baiano de Ilhéus, o proprietário Lucas Moreira Arléo representa a terceira geração da sua família, que coordena uma área de 160 hectares de plantação de cacau com uma colheita média de 1,6 mil arrobas por ano.
O sistema produtivo é voltado ao cultivo do cacau Cabruca e o resultado tem sido a produção de amêndoas de qualidade, visando atender a clientes específicos, produtores de chocolate Ben To Bar (do grão a barra de chocolate).
A grande expectativa do cacauicultor é a adesão ao selo da IG, em fase de avaliação, com o objetivo de agregar ainda mais valor ao cacau já produzido na sua fazenda. Para ele, a IG vai impulsionar e valorizar o produto da terra.
“Vai dar segurança para quem compra e vai levar a história da região para o Brasil e o mundo”, declara o produtor.
Turismo rural
Para o produtor de cacau Osvaldo de Brito, contemplado recentemente com o selo da IG e proprietário da Fazenda Taboquinhas, no município de Itacaré, outro atrativo é sua localização. Situada às margens do Rio de Contas, a propriedade – de 78 hectares e produção média de 200 arrobas de cacau orgânico por ano – atrai turistas interessados em conhecer o processo de produção do “Fruto do Ouro”, da colheita à moagem, passeando a cavalo pelas fazendas e desfrutando das cachoeiras e trilhas.
“Eu vejo o cacau de qualidade, agora, com o selo da Indicação Geográfica, como mais um produto para atrair turistas à minha fazenda. Ou seja, espero que as pessoas queiram conhecer o cacau orgânico, com responsabilidade social e ambiental e com o selo de identificação”, diz Brito.
Atualmente, ele está investindo na construção de um cocho para fermentação, reformando a barcaça para secagem e cuidando da limpeza do local.
Agricultura familiar
Com mais de 200 anos de história e tradição, o cacau produzido no Sul da Bahia tem uma grande participação dos produtores da agricultura familiar da região, que aguardavam, há muito tempo, pela conquista da IG.
No Assentamento Buique, localizado no município de Buerarema, por exemplo, as famílias dos agricultores Antônio Mendes, Valter Oliveira e Maria Tourinho vivem da renda gerada com a produção e a comercialização do cacau.
Presidente da Central de Cooperativas da Agricultura Familiar e Economia Solidária do Território Litoral Sul (Centrafesol), filiada à ACSB, Maria Angélica Anunciação afirma que a expectativa, a partir da adesão ao selo, é que essas famílias consigam ter melhorias no sistema produtivo do cacau, agregando um valor financeiro maior ao produto.
Das 29 famílias assentadas no Buique, algumas delas já iniciaram a produção de cacau de qualidade, visando à adesão ao selo.
“A partir da IG, esperamos ter um tratamento diferenciado nos bancos para a aquisição de crédito e entre os compradores de cacau”, diz Maria Angélica, que é uma das proprietárias de terra no Assentamento Manoel Chinês, em Itabuna.
Pretendendo investir na produção de qualidade, ela acredita que a agricultura familiar tem a vantagem da mão de obra ser própria, sem custos, ao contrário do que ocorre com os grandes produtores.
Mudança de narrativa
A busca pela IG do cacau do Sul da Bahia sempre esteve entre as estratégias do projeto “Cacau e Chocolate”, da Unidade Regional do Sebrae em Ilhéus. De acordo com a gerente regional da instituição, Claudiana Figueiredo, a conquista é mais um marco que exprime a mudança de narrativa da região Sul da Bahia.
“Representa um passo importante de um sonho a ser realizado: sermos referência mundial em cacau de altíssima qualidade”, comemora.
O desenvolvimento e a expansão da IP – Sul da Bahia, dentro do território nacional e internacional, representa um novo estágio de organização da produção de cacau na região.
A técnica do Sebrae Ana Carolina Menezes Argolo, nesse sentido, destaca que a instituição tem um papel fundamental no processo de Indicação Geográfica junto ao Inpi, a partir da realização de consultorias nas áreas de gestão, plano de negócios, planejamento estratégico, formação de preço, produção de embalagens, impressão de material, dentre outros.
Subsídio para o produtor
De acordo com Ana Carolina, para melhorar esse cenário, está prevista a aplicação de consultorias especializadas com o subsídio de 70% para ajudar o produtor a se adequar às normas da IG.
“O Sebrae vai desenvolver um trabalho junto à IG de precificar esse selo e entender quanto ele vai custar para a Associação. Vamos verificar formas de monetizar valores para que a gente consiga iniciar a operação e que o produtor tenha o suporte”.
Já a ACSB promoverá ações de marketing para motivar os associados a obter o selo da IG. Entre elas estão: dar visibilidade; difundir treinamentos técnicos no campo, visando atrair os benefícios agregadores da qualidade; e atrair o mercado nacional e internacional, consolidando o selo da IP Cacau Sul da Bahia como uma marca de confiança.
Sobre a ACSB
Ao todo, 14 cooperativas e associações representativas, envolvendo aproximadamente 2,5 mil produtores de cacau, são ligadas à ACSB. São elas: Associação de Gestores de Ibirataia, Ipiaú e Região do Médio Rio das Contas (AGIIR), APC Cooperativa Agroindustrial de Cacau e Chocolate (APC Cooperativa), Associação de Pequenos Empreendedores e Restauradores Agrícola da Microrregião Cacaueira da Bahia (Aperamcaueba).
Também fazem parte a Central de Cooperativas de Agricultores e Agricultoras Familiares e Economia Solidaria dos Territórios de Identidade da Região Cacaueira da Bahia (Centrafesol), Cooperativa de Desenvolvimento Sustentável da Agricultura Familiar do Sul da Bahia (Coofasulba), Cooperativa Agrícola de Gandu LTDA (Coopag), Cooperativa de Pequenos Produtores de Cacau, Mandioca e Banana do Centro Sul da Região Cacaueira LTDA (Coopercentrosul), Cooperativa da Agricultura Familiar e Economia Solidária da Bacia do Rio Salgado e Adjacências (Coopfesba)
Ainda integram: Instituto Arapyaú; Instituto Cabruca; Instituto Viver da Mata; Instituto Pensar Cacau (IPC); Rede Agroecologia Povos da Mata Atlântica, e Cooperativa de Produtores Agropecuários Construindo o Sul (Cooprasul).