Forma de cultivo da fruta é uma das particularidades do produto e foi fundamental para a conquista da Indicação Geográfica (IG), na espécie Indicação de Procedência (IP), ao trazer a cultura japonesa em seu DNA
O reconhecimento foi dado, este ano, pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) em nome da Associação Cultural e Fomento Agrícola de Tomé-Açu (ACTA). É a primeira IG do Estado do Pará, onde está localizado o município de Tomé-Açú e também uma das quatro últimas Indicações Geográficas (IGs) do País a fazer parte do Mapa das IGs 2019.
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O grande diferencial do cacau da região se deve pela forma como é cultivado, através de uma tecnologia exclusiva de agricultura sustentável, em sistema agroflorestal na Amazônia.
“Essa certificação vem coroar toda uma história de dedicação dos produtores de Tomé-Açu. O cacau foi uma das primeiras culturas daqui e hoje conseguimos oferecer ao mercado um produto de excelência”, comemora Silvio Shibata, presidente da ACTA.
E complementa, “a Indicação Geográfica só irá agregar ainda mais, trazendo mais visibilidade e ajudar no desenvolvimento de toda a cidade, como acontece em outros municípios que são contemplados”.
História
O sistema de cultivo foi desenvolvido por imigrantes japoneses que se estabeleceram no norte do País a partir de 1929, quando trouxeram as primeiras sementes de cacau ao Brasil. Porém, devido ao desconhecimento das técnicas de cultivo e ataque de pragas, a cultura foi abandonada, conforme registrado nos diários dos primeiros imigrantes.
Somente nos anos de 1970, com a implantação de um projeto para a recuperação da cultura cacaueira é que o Estado do Pará voltou a se tornar um grande produtor de cacau. Os agricultores plantaram, nessa época, mais de um milhão de cacaueiros em Tomé-Açu, transformando o sistema produtivo em um modelo de produção, com capacidade de geração de renda para os habitantes do município.
Japoneses na Amazônia
Os japoneses há muitos anos demonstravam interesse na região amazônica, mas as negociações começaram a se efetivar em 1925 quando o governador do Pará, Dionísio Bentes, recebeu a visita dos representantes da indústria de tecidos Kanebo (Kanegafuchi Boseki Kabushi Kaisha). No ano seguinte, chefiada por Hachiro Fukuhara (diretor da Kanebo) e mais oito técnicos, uma missão percorreu o interior buscando terras para a exploração econômica.
Em 1928, uma missão do Ministério das Relações Exteriores selecionou uma área de 300 mil hectares próxima a Maués. Em 1930, Tsukasa Uyetsuka, deputado e conselheiro do Ministério das Finanças do Japão, comprou 1,5 mil hectares em Parintins e instalou o Instituto Amazônia (Amazônia Kenkyujyo) com o objetivo de desenvolver pesquisas para apoiar as atividades agrícolas.
Foto: Museu Histórico da Imigração Japonesa no Brasil
O processo de reconhecimento
O Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), no Pará, acompanhou o processo de certificação desde suas primeiras etapas.
Foi a instituição a responsável por elaborar o diagnóstico base para a solicitação da IG, analisar processos produtivos, além de prestar consultorias para acompanhamento das entregas necessárias do trâmite e preparo dos empresários para administrar o uso do selo.
“Fomos procurados pela experiência que o Sebrae possui em todo o Brasil, apoiando pequenos produtores na busca pela Indicação Geográfica”, conta Fabiano Andrade, gestor do projeto de fruticultura da instituição no Pará.
Mercado internacional
O processo da IG de Tomé-Açu foi iniciado a partir de uma demanda do mercado japonês. Compradores de amêndoas de cacau para fabricação de chocolate no Japão se interessaram em identificar os produtos que possuem em sua composição matéria-prima produzida por japoneses na Amazônia. Foi sugerido, então, que os produtores buscassem alguma certificação ou registro que garantisse a origem do produto.
O trabalho para a obtenção da IG foi longo e exigente, com vários critérios exigidos pelo INPI, entre eles a organização de uma entidade representativa dos produtores, regulamento de uso do nome geográfico, comprovação da existência de uma estrutura de controle, entre outros.
“Com o registro, os negócios ficam mais competitivos no mercado, pela qualidade dos produtos e garantia de sua origem. Além do mais, a indicação estimula o desenvolvimento local e valoriza o trabalho das pessoas que lutam pela preservação da cultura de sua região”, destaca Fabrizio Guaglianone, diretor-técnico do Sebrae no Pará.
Território
A Indicação de Procedência “Tomé-Açu” tem uma área delimitada de produção de mais de 23 mil quilômetros quadrados contínua compreendida nos municípios de Tomé-Açu, Acará, Tailândia, Ipixuna do Pará, Aurora do Pará, São Domingos do Capim e Concórdia do Pará, todos do Estado do Pará.
Atualmente, há cerca de 15 mil produtores no Estado, que geram cerca de 50 mil empregos diretos e indiretos. Além disso, as autoridades querem que a amêndoa seja processada no Estado, em vez de migrar para as indústrias de outras regiões.
Os produtores rurais agora querem conquistar a IG da pimenta-do-reino, outra cultura símbolo da região, conhecida como “diamante negro”. Diversas instituições envolvidas na IG do cacau assinaram no final do ano passado, em Tomé-Açu, um protocolo de intenções para apoiar os produtores nessa nova etapa.