A avicultura nacional produz cerca de 1.800 ovos por segundo. Em 2007, cada brasileiro consumia 131 ovos por ano, hoje são 257
“Omne vivum ex ovo” – Expressão latina
Quem veio primeiro: a galinha ou o ovo? O ovo. Os primeiros ovos, com casca mineral, surgiram há 340 milhões de anos. E as primeiras galinhas, por volta de 58 mil anos. Os ovos amnióticos conferiram aos répteis uma vantagem decisiva sobre os anfíbios. Eles conquistaram a terra seca e dominaram o planeta por mais de 150 milhões de anos. Hoje, 99% das espécies animais se reproduzem a partir de ovos. Mamíferos, como humanos, cavalos, cangurus e leões, não põem ovos e são minoria no reino animal. Após milhões anos de evolução, os ovos de galinhas ou codornas são para os humanos o alimento mais completo da natureza, depois do leite materno.
O Brasil saiu de oitavo produtor mundial de ovos em 1980 para a quinta posição em 2020, após China, EUA, Índia e Indonésia. Com inovações, este segmento altamente tecnificado do agronegócio não para de crescer. Em 2022, o Brasil produziu cerca de 56 bilhões de ovos. Segundo a Associação Brasileira da Proteína Animal (ABPA), 99,7% da produção destina-se ao mercado interno. A pequena exportação de ovos in natura (65%), incluindo a inovadora iniciativa de ovos férteis, e industrializados (35%) tem nos Emirados Árabes, no Catar e no Japão os maiores destinos.
Nos últimos 15 anos, ovos especiais são produzidos com alta tecnologia como insumo para fabricar vacinas para humanos e animais. Todo ano, de 60 a 70 milhões de ovos embrionados são fornecidos pelo agronegócio, entre setembro e abril, para produzir vacinas contra a gripe. Outros ovos para vacinas servem para imunizantes contra febre amarela, aftosa e até a covid.
O ovo é a proteína animal cujo consumo mais cresceu no Brasil nos últimos 15 anos, segundo o Instituto Ovos Brasil, entidade sem fins lucrativos criada com o objetivo de esclarecer a população sobre as propriedades nutricionais do ovo e de desfazer mitos sobre seu consumo.
Como ovo rima com povo, ele se transformou num alimento essencial na dieta média dos brasileiros. Em 2007, cada brasileiro consumia 131 ovos por ano, hoje são 257, bem acima da média mundial (185), sem mencionar a africana (44). A avicultura nacional produz cerca de 1.800 ovos por segundo! O Sudeste reúne as maiores granjas de postura comercial de ovos. Os principais Estados produtores são São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo, Pernambuco e Mato Grosso.
São de 110 a 115 milhões de galinhas poedeiras. Aves selecionadas, com tratamento veterinário, zootécnico e nutricional adequado, criadas com métodos avançados e em instalações modernas. A produção industrial de rações para poedeiras é da ordem de 7 milhões de toneladas/ano. A alimentação pode representar até 70% do custo de produção em poedeiras. Com aumento recente no custo das rações, os produtores de ovos, com inovações, reduziram esse impacto nos preços finais ao consumidor.
Simbolicamente, o ovo contém os quatro elementos cósmicos: terra (casca), água (clara), ar (fina membrana sob a casca) e fogo (gema)
Sem escala e rentabilidade na produção de grãos (milho e soja) e de outros produtos usados na fabricação de rações ou sem os recursos modernos na gestão das granjas (genética, vacinas, medicamentos), não haveria ovos em qualidade e quantidade na mesa dos brasileiros. Nem a geração de empregos, renda e arrecadação de impostos em toda a produção. Ovos são frutos da integração entre cadeias modernas do agronegócio, indústrias e logística.
Um ovo corresponde a cerca de 20% das recomendações diárias de proteína e é rico em vitaminas (A, D, E, K), antioxidantes (colina, biotina, luteína e zeaxantina) e proteínas (albumina). A albumina contém aminoácidos essenciais em quantidade e relação correta ao crescimento e reparo muscular. Das proteínas do ovo, 95% são facilmente digeríveis. Seus nutrientes fortalecem olhos, cabelos, músculos, pele e previnem anemia e osteoporose.
A produção das enzimas antioxidantes pelo corpo requer quantidades suficientes de proteínas de alta qualidade e vitaminas, como as do complexo B. As vitaminas presentes na gema são as lipossolúveis (A, D, E, K) e as hidrossolúveis do complexo B, como a B7 (biotina). As vitaminas B1 (tiamina) e B12 (cianocobalamina) ficam no albúmen e a B2 (riboflavina) e B9 (ácido fólico), igualmente distribuídas na gema e na clara.
Um dos alimentos mais ricos em colina é o ovo, nutriente para melhorar a memória. Vitamina do complexo B, a colina atua no sistema neurotransmissor, mantém a integridade nervosa, melhora a concentração, previne o mal de Alzheimer e ajuda a diminuir o colesterol.
A luteína ajuda na formação e na manutenção dos ossos, suprimindo os osteoclastos, responsáveis pela reabsorção óssea. Esse carotenoide, relacionado à cognição, deve ser consumido ao longo da vida. O leite materno será rico em luteína se a mãe consumir esse carotenoide.
Estudos científicos desmistificaram a associação do consumo de ovos com o aumento do colesterol e a incidência de doenças cardiovasculares. Atestaram o contrário: o consumo de um ovo por dia faz bem ao coração e reduz o risco de doenças cardíacas. Os ovos devem ser consumidos da gestação à velhice.
O ovo é bom para gestantes, lactantes e bebês. Na gestação, as necessidades nutricionais da mãe se elevam. Um nutriente essencial é a colina (vitamina B8), responsável pelo transporte de lipídios do fígado. A acetilcolina, sintetizada a partir da colina, é decisiva no desenvolvimento neurológico do bebê, do fechamento do tubo neural às funções cognitivas. As necessidades de uma mulher em colina são de 425 miligramas/dia (mg/dia). As de uma mulher gestante são de 450 e aumentam para 550 mg/dia na lactação.
Bebês e crianças com atraso no desenvolvimento, ao incorporarem ovos em sua dieta, recuperam rapidamente a saúde nutricional infantil. O ovo atende à saúde dos esportistas com energia, reparo e crescimento muscular, antioxidantes, resposta imunológica, síntese de hormônios esteroides e modulação da resposta inflamatória. A biotina é essencial no metabolismo de carboidratos, lipídeos e proteínas. Sua deficiência está relacionada a fadiga, depressão, náuseas, dermatites e dores musculares. Alguns atletas têm o costume de comer clara de ovo cru. Prática a ser evitada: inibe a ação da biotina e há riscos de contaminação por bactérias.
O ovo é o alimento por excelência da terceira idade. O envelhecimento causa alterações nas funções orgânicas. A maior dificuldade de mastigar, deglutir e digerir pode levar a deficiências nutricionais. Os ovos auxiliam a evitar a perda de massa magra. Seus carotenoides (luteína e zeaxantina) com ação antioxidante e sua riqueza em vitaminas A e K, zinco, magnésio e selênio ajudam a prevenir problemas de visão, entre outros.
O ovo tem poder de desintoxicação em casos agudos (intoxicação alcoólica, por exemplo) e coadjuvante em determinadas quimioterapias e processos crônicos de intoxicação por metais pesados (alumínio, chumbo e mercúrio).
Durante a Quaresma, aumenta o consumo de ovos no Brasil. O ovo é símbolo de nascimento e vida. A vida, força misteriosa, ordenadora do caos da matéria, é indissociável de seus ciclos (nascimento, morte, renascimento). Sua circularidade está inscrita na forma mesma do ovo. Simbolicamente, o ovo contém os quatro elementos cósmicos: terra (casca), água (clara), ar (fina membrana sob a casca) e fogo (gema). Como símbolo da vida, ele engloba também a vida por vir, em eclosão. Como a Quaresma prepara a Páscoa; o ovo representa a renovação nos ciclos da natureza. O costume de oferecer ovos coloridos às portas da primavera na Europa estendeu-se especialmente à Páscoa cristã, festa da ressurreição e do despertar da natureza (equinócio boreal da primavera). E um de seus símbolos maiores é o ovo de Páscoa.
Em muitas cosmogonias, o ovo é associado ao nascimento do mundo. No Egito antigo, a Via Láctea emergiu das águas sob a forma de uma colina de detritos onde o sol (Ré) foi depositado em um ovo por uma ave celeste. Na mitologia chinesa, no princípio, o Universo era um ovo. Pangu, o primeiro deus, ao nascer o rompeu em dois. A parte superior deu origem ao Céu e a inferior à Terra. Monocelular e indiferenciado, o ovo está pronto a gerar a diferenciação, a dualidade, expressa no símbolo taoísta do ying e do yang ou por duas semiesferas de prata e de ouro na tradição hinduísta. Talvez por isso tudo, o ovo pode ser consumido a qualquer hora e combinado a um sem-número de alimentos. Saudável, o ovo é prático, saboroso e fácil de preparar. Cozido é o ideal, sem calorias adicionais, como em frituras ou bolos e doces.
Tudo vem do ovo. Tudo se reproduz pelo ovo. Tudo termina no ovo. Alfa e ômega das existências, ele toma uma parte da vida de quem o criou e a entrega a quem virá. Anel transmissor de informações (neguentropia) na série das existências, criado apenas para a reprodução, o ovo é composto dos mesmos elementos (albumina, glicogênio, gorduras), em todas as espécies. E, em função da origem, o ovo produz borboleta, avestruz, ornitorrinco, beija-flor, crocodilo, abelha, peixe, mosca ou serpente.
O ovo é poroso (7 a 17 mil poros) e absorve o cheiro de outros alimentos. A produção de ovos nas granjas é tecnificada e automatizada, evita contato com pessoas e qualquer tipo de contaminação química ou biológica. Cuidados da postura à embalagem. Com a parte pontiaguda para baixo, a gema permanece centralizada na casca, afastada da bolsa de ar na extremidade maior e bem acondicionada. Nas caixas de ovos dos supermercados há todas as informações relevantes sobre o produto, incluindo seu prazo de validade.
A casca do ovo evoca proteção, o seio da mãe no qual o bebe está protegido. De natureza feminina, o ovo fértil lembra a célula mater, o fruto e outros elementos representativos da vida, pronta para eclodir e se desenvolver. Sua forma oval sugere o infinito e assume o simbolismo da esfera, globalizante e indiferenciada, espaço neutro, com todas potencialidades, sinal da unidade cósmica, reflexo do Princípio em sua intenção criadora, ainda não realizada. E depois de tudo isso, você ainda não come ovos?
(Artigo dedicado a Flávio Figueiredo de Andrade, o “Ovo”)