O Espírito Santo é o único estado brasileiro que tem produção significativa das duas espécies – Arábica e Conilon – com rendimento anual de cerca de 12,5 milhões de sacas, provenientes de 60 mil propriedades, das quais, mais de 73% são de base familiar. A produtividade média geral registrada é de 27,77 sacas por hectare.
Tais números colocam o Estado como o maior produtor de café conilon do Brasil, com 78% da produção nacional, e o segundo maior produtor brasileiro de café (somando-se a produção de Arábica e Conilon), representando cerca de 25% da produção nacional e o terceiro maior produtor de café arábica.
Por trás deste sucesso está a pesquisa, o desenvolvimento e inovação gerados pelo Incaper, que ganhou novo fôlego com a criação do Consórcio Pesquisa Café, em 1997. Para falar um pouco sobre essa história, entrevistamos Aymbiré Fonseca, pesquisador da Embrapa Café no Incaper.
Qual a importância socioeconômica da cafeicultura para o estado do Espírito Santo?
A cafeicultura do conilon é uma das atividades mais importantes nos aspectos econômico e social no Espírito Santo, principalmente na geração de empregos e renda.
Maior programa mundial de pesquisas para esta cultura, o Consórcio Pesquisa Café, fundado em 1997, é um arranjo estratégico composto por dez instituições de pesquisa, ensino e extensão rural, localizadas nas principais regiões produtoras do País. Coordenado pela Embrapa Café, busca, através de um programa de pesquisa, desenvolver tecnologias para cada etapa da cadeia produtiva do café.
Presente em todos os municípios do Espírito Santo, exceto Vitória, a cafeicultura capixaba (Arábica e Conilon) é a atividade com grande poder de geração de empregos no Estado. É o sustentáculo econômico de 80% dos municípios e responde por 43% do PIB agrícola. A totalidade da cadeia produtiva gera cerca de 400 mil postos de trabalho ao ano, de forma direta e indireta. Só no setor de produção, envolve 131 mil famílias, sendo o tamanho médio das lavouras de 7,5 ha.
Como o Incaper contribuiu para o desenvolvimento dessa atividade?
O Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper) é uma das instituições participantes do Consórcio. Em mais de 25 anos de pesquisa em café conilon no Incaper, foram desenvolvidos diferentes conhecimentos básicos, produtos, processos e tecnologias que têm sido amplamente utilizados pelos cafeicultores.
Bons exemplos são as variedades melhoradas, aprimoramento das tecnologias para produção de mudas clonais de qualidade superior, recomendações de espaçamentos, poda programada, plantio em linhas, adubações, manejo de pragas e doenças, práticas de conservação de solo, manejo de irrigação e tecnologias de colheita, secagem, beneficiamento e armazenamento.
E os ganhos de produtividade, são expressivos?
O uso das tecnologias tem contribuído para que, desde o período de lançamento das primeiras variedades clonais de café, em 1993, até hoje, a produtividade média estadual aumentasse 277%, saltando de 9,2 sacas beneficiadas/ha para 34,7 sacas beneficiadas/ha, enquanto a produção aumentou cerca de 304%, passando de 2,4 milhões de sacas para 9,7 milhões de sacas, com um aumento de apenas 11% da área plantada.
Quais foram os avanços da pesquisa que permitiram e permitem a expansão da cultura no Brasil? Quais as novas fronteiras agrícolas do café?
São muitos e importantes avanços. Merecem destaque a utilização de variedades adaptadas, resistentes ao calor e a certas doenças e pragas; o emprego de técnicas de manejo de plantas eficazes na retenção de água no solo e/ou no controle do seu escorrimento superficial, na redução da exposição do solo à insolação direta e seu efeito danoso na microbiota presente; na redução das variações bienais de produção e na longevidade dos cafeeiros; avanços constantes em aspectos relativos à nutrição e a fertilização de solos, bem como disponibilidade de formulações com liberação mais lenta e gradativa de nutrientes; emprego de diferentes sistemas e irrigação; adensamento; cultivos protegidos com árvores que auxiliam na mitigação dos efeitos de temperaturas mais elevadas além de reduzir a influencia negativa de ventos mais fortes, entre muitos outros, não menos importantes.
O café Conilon, apesar de mais recente no Brasil, encontra-se bastante concentrado no Espírito Santo, mas também migrou para as regiões Norte, Centro Oeste e Nordeste, notadamente para os estados de Rondônia e região Sul Litorânea da Bahia, respectivamente, o segundo e terceiro produtores nacionais da espécie. Em cada uma dessas regiões, a espécie vem sendo estudada constantemente em vários aspectos, inclusive quanto a possibilidade de cultivos em muitos ambientes mais particulares, existentes em cada uma delas, como é o caso do próprio Espírito Santo.
Há, hoje, tecnologias que permitem ainda expansão desta atividade em outros ambientes do país. A questão da expansão pode não ser exatamente a disponibilidade tecnológica, mas estratégica, haja vista as implicações de ofertas excessivas do produto no mercado.
Qual o percentual plantado atualmente de café Arábica e Conilon no País?
De acordo com a última estimativa da Conab, de setembro de 2013, a área total cultivada com café no Brasil é da ordem de 2,31 milhões de hectares, dos quais, 1,82 milhões de Arábica e 489 mil de Conilon. A produção se divide em 77% de Arábica e 23% de Conilon. O Espírito Santo é responsável por 75,5% da produção brasileira de Conilon, terceiro produtor Arábica do País e, considerando as duas espécies, é o segundo maior produtor de café do Brasil, superado apenas por Minas Gerais.
Qual o índice de mecanização das lavouras brasileiras? Nas lavouras não mecanizadas, quais os avanços na relação à mão de obra rural, cada vez mais escassa? Qual a contribuição da agricultura de precisão?
As iniciativas para mecanização em lavouras de Conilon são relativamente recentes. Estes trabalhos vêm sendo motivados por uma série de necessidades, relacionadas, sobretudo, aos procedimentos da colheita e pós-colheita, quando se concentra a necessidade de mão de obra, que representa, em média, 50% do custo variável do produto final. Uma série de parceiros do Incaper, tanto da iniciativa pública quanto privada, vem procurando aprimorar os equipamentos e os processos envolvendo a colheita, muitas vezes associando-a à pratica da realização da poda, visando racionalizar o sistema do ponto de vista econômico.
O Incaper trabalha ainda no desenvolvimento de processos de condução de plantas mais ajustados ao processo de colheita, que difere expressivamente da colheita do Arábica, haja vista as diferentes formas de condução das plantas e das lavouras entre as duas espécies. Trabalha também na seleção de plantas com arquitetura mais compacta, visando a facilitar a utilização de máquinas desenvolvidas, em princípio, para a colheita do Arábica.
Em outras etapas da produção de café, a mecanização (ou a semimecanização) tem sido empregada, indistintamente para o Arábica e o Conilon. No preparo solo, na abertura de covas, na aplicação de corretivos, fertilizantes, defensivos etc. A maior ou menor intensidade da mecanização está relacionada às condições de relevo. De forma geral, a mecanização da atividade no Brasil vem se limitando às regiões com menos declive, como no Cerrado e parte do Sul de Minas. Há, contudo, crescimento das atividades mecanizadas ou semimecanizadas na cafeicultura brasileira, em busca da redução de custos e da manutenção de nossa competividade no mercado.
Os processos de mecanização ou quaisquer formas de automação empregada, bem como práticas de irrigação, fertirrigação, monitoramento e controle de pragas e doenças, são exemplos de práticas consideradas “de precisão”, dado ao fato que precisão significa “ocorrer de forma precisa”, sem excessos ou carências; e no devido tempo, de forma a reduzir custos, aumentar a eficácia e manter o melhor controle sobre as operações realizadas. Os cafeicultores, mesmo sem a exata dimensão da imperiosa necessidade de adoção de metodologias de maior precisão no que tange às suas atividades, vêm adotando, paulatinamente, um conjunto de medidas a elas associadas, que tendem a melhorar todo processo produtivo.
Quais os principais avanços relacionados à sustentabilidade?
A sustentabilidade de uma determinada atividade envolve questões de ordem social, ambiental e econômica. Considera um conjunto de procedimentos que englobam princípios pessoais, critérios legais, aspectos filosóficos e mesmo uma visão de marketing e mercadológica, na busca de conferir diferenciação e valorização dos produtos, além dos agronômicos, agrupados nas “boas práticas agrícolas”. Mais da metade da produção brasileira de café é destinada principalmente aos países da União Europeia, Estados Unidos e Japão, todos muito exigentes quanto às questões relacionadas à forma com que o produto é obtido, além da qualidade intrínseca do mesmo. Por isso, a priorização da produção sustentável é imprescincível.
O que mudou com a criação do Consórcio Pesquisa Café?
Tudo mudou para muito melhor com o Consórcio. As instituições de pesquisa brasileiras iniciaram um trabalho de forma inédita, passando a atuar de forma participativa e integrada. As equipes, que trabalharam mais de cinco anos pensando o Consórcio, já haviam rompido as barreiras das áreas físicas em que atuavam e emprestaram suas expertises em assuntos estratégicos às demais.
Isso encurtou o tempo e aumentou a eficiência necessária para se chegar a resultados inovadores. Novas bases tecnológicas foram estabelecidas para a evolução do agronegócio no País e precisam ser mantidas para a manutenção da competitividade brasileira na produção de café.
Quais as principais tecnologias transformadoras que mudaram a cafeicultura no ES?
A criação/obtenção de variedades melhoradas, a criação de ampla parceria com municípios, cooperativas, associações de produtores e viveiristas para disponibilização de material propagativo das variedades, por meio da instalação de jardins clonais em todas as regiões do Estado; o desenvolvimento de sistema de produção de mudas por pequenos viveiristas ou nas próprias propriedades; os ajustamentos para recomendação de espaçamentos e densidades de plantio e de populações de hastes produtivas por área, em função das condições do solo e do clima do local e do sistema produtivo adotado; os ajustamentos frequentes dos métodos de análise, interpretação e recomendação de adubação e calagem; o desenvolvimento e recomendação do sistema de podas denominado “Poda Programa de Ciclo”; o plantio em linhas; o emprego de irrigação e fertirrigação; a adequação dos processos e métodos de colheita e pós-colheita para o Conilon, visando à obtenção de um produto e melhor qualidade.
Conte-nos sobre o projeto Renova Sul
O programa “Renova Sul Conilon” está inserido no Plano Estratégico da Agricultura Capixaba para o período de 2011/2014 como um importante conjunto de iniciativas. As ações contemplam linhas estratégicas, como renovação e revigoramento de lavouras para o aumento da eficácia produtiva e evolução da qualidade do produto e de processos relacionados à atividade.
Isso contribui para o desenvolvimento rural sustentável do Estado e fortalece as bases necessárias para o alcance das metas preconizadas no Plano Estratégico de Desenvolvimento da Agricultura Capixaba para o período 2007/2025.
Entre as Metas estabelecidas para o período de 2012 a 2025, destacam-se renovar e/ou revigorar 6.000 ha/ano do parque de café Conilon da região de abrangência do programa, equivalente a 5% do parque atualmente existente; elevar a produtividade média do Conilon no Estado, dos atuais 34,7 para 42,9 sacas beneficiadas/ha; atingir, na região de abrangência do programa, uma produtividade média igual à média estadual em 2025, passando de 25 para 42,9 sacas/ha (crescimento de 71,6%); aumentar a produção total de café Conilon na região, dos atuais 1,6 para 3,0 milhões de sacas, sem expressivo aumento da área cultivada; obter, ao menos, 20% da produção total de café Conilon da região classificado como café de qualidade superior; beneficiar 20 mil famílias de pequenos cafeicultores (cerca de 60 mil pessoas) inseridos na região de abrangência do programa.
O programa abrange uma área total de 70 mil ha (64 mil ha em produção), envolvendo 28 municípios.
Além do aumento da produtividade, qual a contribuição da pesquisa para a melhoria da qualidade no Conilon no Estado?
Desenvolvendo tecnologias focadas na espécie, orientando os cafeicultores sobre as vantagens de se alcançar um produto com a qualidade requerida pelas indústrias de transformação e dos consumidores finais, bem como acerca dos cuidados e adoção de técnicas mais estreitamente relacionadas à obtenção de cafés superiores. A obtenção de materiais genéticos (variedades) possuidores de atributos qualitativos, também tem sido importante para esta evolução. As novas variedades do Incaper: “Diamante Incaper 8112”, “Incaper 8122” e “Centenária Incaper 8132”, lançadas em 2013, após 28 anos de pesquisa, apresentam características valorizadas pela indústria de café solúvel e para o consumidor final, diferenciando-a de todas as demais existentes até o presente, em se tratando de materiais genéticos do grupo “Robusta”.