Por não conter glúten, o produto derivado da semente da araucária pode atender a um mercado consumidor formado por mais de dois milhões de pessoas com doenças celíacas, alérgicos e intolerantes
Espécie nativa brasileira, o pinhão é a semente da araucária, espécie florestal que integra a paisagem ambiental, cultural e econômica nas regiões brasileiras Sul e Sudeste, bastante apreciado na alimentação. No entanto, sua cadeira produtiva é baseada no extrativismo e não é organizada, o que traz desafios e oportunidades”, relata o pesquisador da Embrapa Felix Cornejo.
Ele acredita que o desenvolvimento de novos produtos possa fazer com que a cadeia se organize, desde a disponibilização de matéria-prima, criação de plantas agroindustriais e consequente geração de renda e conservação ambiental, especialmente em pequenas comunidades rurais.
Na natureza, a araucária leva de 12 a 15 anos para começar a produzir o pinhão. Pesquisas conduzidas pela Embrapa Florestas desenvolveram tecnologias que possibilitam a antecipação da produção para seis a oito anos, estimulando a formação de pomares de pinhão, aumentando a produção de pinhão.
Alto valor agregado
Em 2019, cientistas da Embrapa e das Universidades Federal do Paraná (UFPR) e do Rio de Janeiro (UFRJ).Uma farinha de pinhão cru da semente da araucária foi desenvolvida por cientistas da Embrapa e das Universidades Federal do Paraná (UFPR) e do Rio de Janeiro (UFRJ).
Felix Cornejo explica que a farinha de pinhão cru nasceu da estratégia de estruturação da cadeia produtiva do pinhão, que visa desenvolver novos produtos de alto valor agregado em escala agroindustrial.
“Sua obtenção envolve conceitos simples referentes às propriedades físicas de matérias-primas agrícolas incluindo descascamento, separação da casca (tegumento) e pinhões danificados por flotação, secagem e moagem com a possibilidade de diferentes aplicações e usos da farinha, conforme a granulometria utilizada”.
A pesquisadora da Embrapa Rossana Catie de Godoy, que coordenou o projeto “Avaliação do potencial do pinhão na alimentação e no desenvolvimento de novos produtos (Pinalim), salienta que “o produto final não apresenta odor pronunciado, nem materiais lignocelulósicos que alteram a textura da farinha, facilitando sua utilização na elaboração de diversos outros produtos das linhas de extrudados, panificáveis, salgadinhos e para uso gastronômico”.
Segundo outra pesquisadora da Embrapa Agroindústria de Alimentos estatal, Regina Nogueira, os resultados do projeto se destinam principalmente às comunidades e produtores que atuam no extrativismo sustentável de produtos da floresta e a empresas que atuam no segmento de farinhas especiais.
“Sua textura fina e sem resíduos lignocelulósicos confere maior aceitação por parte dos consumidores”, afirma, frisando a intenção de estender aos consumidores a oferta de produtos com potencial de boa aceitação durante todo o ano.
Potencial para mercado de celíacos
Dados da Gluten Free Brasil apontam que o mercado nacional de alimentos sem glúten quadruplicou nos últimos 15 anos para atender a necessidade de mais de dois milhões de pessoas com doenças celíacas, alérgicos e intolerantes à glúten, e àqueles que preferem reduzir o glúten de suas dietas.
Além disso, segundo a empresa de pesquisas de mercado Mintel, 79% dos consumidores brasileiros seguem a tendência mundial pela busca de alimentos mais naturais e saudáveis, que podem ser sem glúten, aditivos químicos, agrotóxicos e proteínas de origem animal, por exemplo.
Um outro nicho de mercado a ser explorado, segundo os pesquisadores da Embrapa, é daqueles consumidores que valorizam alimentos regionais, provenientes da sociobiodiversidade brasileira.
Para eles, nesse contexto, o avanço dos estudos da estrutura e das propriedades funcionais do pinhão podem contribuir para a expansão de seu consumo e uso industrial.
Farinha benéfica à saúde
Análises realizadas no Laboratório de Análises Físico-Químicas da Embrapa Agroindústria de Alimentos, a farinha de pinhão crua possui cerca de 80% de amido, 6% de proteína, 5% de fibras e 2% de lipídios e apresenta umidade de 4,95% e pode ser combinada com outros ingredientes para ser emprega na panificação e compor pães, bolos, salgados, doces e outros.
Manoela Guidolim, engenheira de alimentos da UFPR, relata que uma característica interessante observada pela equipe de pesquisadores é que os tipos de amidos encontrados no pinhão são potencialmente benéficos para a saúde humana.
“O pinhão apresentou níveis elevados de amido rapidamente digerido, como a maioria das fontes amiláceas, contudo, também consideráveis quantidades de amido lentamente digerível, amido resistente, o que desperta potencial promoção de saúde com o seu consumo”.
A especialista explica que “o amido resistente serve de nutriente para as bactérias presentes no intestino grosso, sendo considerado um alimento prebiótico”.