Reunindo tecnologia moderna e o saber dos indígenas da região, projeto “Encauchados de Vegetais da Amazônia”, que inclui principalmente o trabalho de mulheres qualificadas e certificadas profissionalmente, fomenta a fabricação de produtos vindos de um tipo de borracha diferenciado, extraído diretamente da floresta
A cadeia produtiva do látex orgânico é realizada totalmente na floresta, sem máquinas ou energia elétrica. A atividade gera trabalho e renda, além de uma vida digna associada ao equilíbrio ambiental, mantendo a floresta em pé.
Desde quando foi idealizada, o projeto “Encauchados de Vegetais da Amazônia” vem proporcionando o desenvolvimento social de forma sustentável, em comunidades de índios, ribeirinhos, quilombolas e de assentados da reforma agrária, na Amazônia.
A metodologia combina técnicas indígenas no manuseio do látex para a produção da borracha. O líquido vulcanizante, que não deixa o látex perder a elasticidade e coagular, foi elaborado pelo pesquisador e ecologista Francisco Samonek.
Ele explica que encauchados de vegetais da Amazônia, nome que se dá à nova maneira de fazer borracha, a partir da técnica indígena antiga, que desidrata o látex e combina a tecnologia científico industrial.
“Com essa técnica de desidratação, estamos no mercado fabricando desde tecidos emborrachados que servem para fazer uma série de produtos têxteis, com fabricação de bolsas, mochilas”, explica o pesquisador.
Material produzido
O material misturado com fibras vegetais é usado na fabricação de toalhas de mesa, tapetes, sousplat (acessório utilizado como base para prato, que ornamenta o ambiente da refeição e protege a toalha de mesa), centros de mesa, porta-trecos, embalagens e bolsas.
Também são produzidas camisetas pintadas em blockprint (impressão xilográfica) com látex pigmentado, 50 variedades de folhas, marcadores de textos, estofamentos para móveis, biojoias, mantas decorativas, fios emborrachados, solados para calçados, chinelos, sandálias e palmilhas.
Os povos nativos da Amazônia, antes mesmo da chegada do homem branco, já fabricavam produtos de borracha (potes, mochilas, sacos, garrafas, copos, canecas, vasos, roupas, sapatos, cobertura de tendas) para uso local, por meio da técnica que desidratava o látex na temperatura ambiente.
Tecnologia industrial
Nas pesquisas para o desenvolvimento da borracha industrial, essa técnica não foi levada em consideração, ficando restrita ao conhecimento popular local.
Hoje, ao recuperá-la, para garantir qualidade e atender a demanda do mercado, foram inseridas as tecnologias industriais da vulcanização e da incorporação de cargas à borracha.
Elas foram simplificadas e transformadas em artesanais para se tornarem apropriadas para a região amazônica e facilmente apropriáveis pelos extrativistas no rústico ambiente rural, sem a necessidade do uso de energia elétrica e sem riscos ao meio ambiente ou à saúde dos trabalhadores.
Protagonismo feminino
A participação das mulheres no projeto é significativa. Elas ocupam mais que o dobro das colocações e abraçam a oportunidade como alternativa para a independência financeira.
“Com mais essa parceria com a Fundação Banco do Brasil, buscamos o empoderamento e a emancipação das mulheres para obterem uma renda complementar, de forma contínua. Além disso, estamos proporcionando qualificação profissional para homens e mulheres”, destaca Maria Zélia Machado Damasceno, artesã, instrutora nos cursos de artesanato e coordenadora pedagógica do projeto “Encauchados de Vegetais da Amazônia”.
Maria Zélia explica que a iniciativa traz benefícios não só para as famílias, mas também para o meio ambiente. “Para cada quilo de borracha produzido, um hectare de floresta é mantido em pé. Ao se qualificar profissionalmente, o agricultor ou agricultora familiar se habilita a se credenciar como produtor de borracha orgânica junto ao Ministério da Agricultura.”
“Esse material é produzido por meio de uma tecnologia social que elimina a necessidade de uma usina de beneficiamento para que possa ser utilizado nas indústrias”, informa a coordenadora.
Ela faz outras pontuações importantes: “Para beneficiar um quilo da borracha na usina seriam gastos, no mínimo, dez litros de água, pois a borracha convencional contém muitas impurezas e contaminações por microrganismos. A água, que seria utilizada, geraria efluentes que precisariam ser armazenados e tratados, antes de serem devolvidos ao meio ambiente. Enquanto isso, a borracha do produtor orgânico vai direto para a fábrica, sem nenhum tratamento e transforma-se em produtos de mercado”.
A inciativa
Em 2007, a inciativa foi vencedora do Prêmio Fundação Banco do Brasil de Tecnologia Social, na categoria Região Norte. Neste ano, o Polo de Proteção da Biodiversidade e Uso Sustentável dos Recursos Naturais (Poloprobio ) – instituição responsável pela tecnologia social – foi contemplado no edital de Reaplicação de Tecnologias Sociais (Reaplica TS), da Fundação Banco do Brasil e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
O objetivo foi promover inclusão socioprodutiva das famílias de agricultores e agricultoras da Amazônia em situação de vulnerabilidade social, auxiliando na renda com cidadania e respeito à cultura local.
O investimento social de quase R$ 1 milhão vem sendo utilizado na aquisição de equipamentos para coleta do látex, máquinas de costura, moldes para o artesanato, treinamentos em sangria, artesanato, corte e costura, biojoias e na compra de um carro.
Ao todo serão beneficiadas 1.750 pessoas de 75 comunidades dos municípios paraenses de Acará, Anajás, Belém, Belterra, Breves, Castanhal, Curralinho, Inhangapi, Oriximiná, Santarém e São Francisco do Pará.