Pesquisadores desenvolveram um novo fertilizante à base de hidrogel modificado, capaz de reunir em um único produto água e nutrientes e fazer a liberação de forma gradual nas plantações
O uso da tecnologia racionaliza o emprego dos nutrientes, que são disponibilizados às plantas paulatinamente, ação obtida por meio de nanotecnologia. Desse modo, o produto reduz as perdas geradas pelo carreamento do solo, que provoca impactos ambientais como a erosão. Além disso, o hidrogel aumenta os intervalos de irrigação, uma vez que a água também é liberada aos poucos pelo produto, promovendo manejo hídrico mais eficiente e reduzindo gastos.
Outra vantagem para o agricultor é que o custo de produção é cerca de 50% menor comparado aos produtos convencionais que, em média, custam em torno de 45 reais o quilo, porém são exclusivos para a retenção hídrica e não fazem a liberação controlada dos nutrientes.
Batizado de Fertgel, o produto pode ser aplicado em culturas anuais e sazonais de lavouras de pequeno ou grande porte, com formulações próprias para cada lavoura. A aplicação no solo pode ser em pó ou em formato de gel. A proposta é atender também grandes cadeias produtivas, como soja, milho e laranja, entre outras. Os ensaios preliminares mostraram o potencial de produção em larga escala, de forma sustentável e economicamente competitiva.
O desenvolvimento realizado no Laboratório Nacional de Nanotecnologia para o Agronegócio (LNNA), da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Instrumentação (SP), gerou uma spin off (derivada), a empresa Fertgel.
Nanotecnologia
Para desenvolver a solução, os pesquisadores usaram nanotecnologia para adicionar modificantes no material. Com a incorporação de um argilomineral, foi possível aumentar a capacidade de armazenar água, carregar os nutrientes e liberá-los de maneira gradativa. Modificantes contidos na fórmula são os responsáveis pela liberação controlada e pela redução do custo de produção.
“A formulação diferenciada do hidrogel abre uma nova fronteira no mercado de fertilizantes”, afirma o chefe-adjunto de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Instrumentação, o engenheiro de materiais, José Manoel Marconcini.
A atual fase da pesquisa de escalonamento da síntese dos materiais conta com apoio do programa de Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe), da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), por meio do projeto “Produção de hidrogéis para aplicações agrícolas”, coordenado pelo proprietário da empresa Fertgel, o químico Adriel Bortolin.
Nessa etapa, pretende-se avaliar a qualidade do material sintetizado em quantidades diferentes em um projeto-piloto em planta industrial. Bortolin disse que também quer identificar possíveis fornecedores, nacionais e internacionais, de matéria-prima para a produção dos hidrogéis nanocompósitos.
Produto retém mil vezes o seu peso em água
“Atualmente o uso de hidrogel na agricultura está apenas relacionado ao fornecimento de água em períodos de seca, com a finalidade de aumentar o intervalo de irrigação. Por isso, espera-se que o hidrogel tenha um alto grau de intumescimento, que é a capacidade absorção de água pelo material ”, diz Bortolin.
Em ensaios preliminares, o hidrogel elaborado com a técnica alternativa de produção demonstrou absorver até mil vezes o seu peso em água. Segundo ele, os hidrogéis convencionais são capazes de intumescer entre 200 e 400 vezes o próprio peso em água. “Basicamente, são formulações copoliméricas que fazem com que o hidrogel perca a água armazenada para o solo de maneira bastante rápida e apresente uma baixa interação com nutrientes”, explica.
Versatilidade para uso em diversas culturas
De acordo com o pesquisador, com a nova metodologia de tratamento de hidrólise foi possível obter duas granulometrias diferentes de hidrogéis. “Esses materiais podem ser aplicados em setores agrícolas distintos: produção de mudas, aditivo de substratos, hortaliças, bem como em larga escala para a produção de citros, eucalipto e cana-de-açúcar, por exemplo”, revela.
Após definir as etapas de síntese, o projeto pretende calcular o custo de produção do material final, considerando os processos de secagem e moagem, além dos custos da matéria-prima importada e da comercialização no Brasil. Esses cálculos vão apoiar os estudos de viabilidade do produto.
As formulações que se destacarem nessas etapas de caracterização serão testadas em casas de vegetação. A proposta é desenvolver hidrogéis incorporados a nutrientes específicos para cada tipo de cultura-teste. Os ensaios em campo vão compreender cadeias produtivas importantes para o País, como milho, café, citros e cana-de-açúcar.
“Tivemos que buscar um caminho muito diferente para tornar a tecnologia disponível, que envolvia encontrar uma empresa do ramo químico, mas muitas sem experiência na área agro, para iniciar o processo de produção”, conta o engenheiro de materiais da Embrapa, Caue Ribeiro.
“Nossa expectativa hoje é que a empresa nascente possa se consolidar no mercado agro, com a possibilidade de explorar no futuro outras aplicações do hidrogel nanocompósito, principalmente no mercado de saúde (health care), onde está hoje o maior consumo de produtos similares”, revela o pesquisador.
“Sistemas de liberação devem ser baseados em materiais biodegradáveis, facilmente incorporáveis ao solo e, preferencialmente, capazes de carregar quantidades elevadas da fonte do nutriente de interesse, no intuito de minimizar custos”, defende Marconcini.
Mas Bortolin alerta para o fato de o hidrogel carregado com nutriente não substituir totalmente a fertilização convencional. “Há indícios de que o uso de hidrogel carregado, concomitantemente com a fertilização, otimiza a ação dos macro e micronutrientes, o que pode resultar em lucro para o produtor”, esclarece.