O reconhecimento internacional do café brasileiro faz com que produtores busquem a cada dia maior qualidade de seu produto. O cafeicultor só atinge essa qualidade e consegue atender aos desejos dos consumidores, cada vez mais exigentes, com um bom plano de gerenciamento
A partir do ano 2000, a cadeia café do Brasil tem voltado sua atenção para a valorização do seu produto, impulsionando seus segmentos com vistas à alta qualidade. De modo geral, todas as empresas vinculadas aos diversos setores da economia cafeeira têm sido pressionadas a adotar posturas de mercado que atendam cada vez mais aos desejos do consumidor. A qualidade do café brasileiro, que não era reconhecida, está sendo admirada e sua preferência é disputada por consumidores exigentes. O cafeicultor, mais do que nunca, precisa incorporar ações e atitudes pertinentes para conviver nesta realidade. Necessita ter gerenciamento e produção técnico-econômica eficientes, produto de qualidade e atentar para o fato de que seu limite não é mais a porteira da fazenda, mas um conjunto mais amplo de atividades e de setores da cadeia produtiva se deseja obter uma cafeicultura rentável.
Gerenciamento
Hoje, o gerenciamento tem como foco um menor número de pessoas, ambiente ecológico e justiça social, fatores que influenciam a empresa, mas requerem planejamento, organização, direção e controle. Exige-se também definição do futuro desejado e dos meios necessários para atingi-lo; alocação adequada de recursos, principalmente humanos, existentes na empresa; direção que lidera e motiva os subordinados para executarem, com sucesso, atividades e tarefas que lhe forem atribuídas e controle para verificar se tudo ocorreu como planejado.
É necessário proporcionar maior uso à terra por meio de maior densidade de plantio; observar como trabalham os empregados; aplicar os adubos, fungicidas, inseticidas na quantidade e na hora certa. É imprescindível orientar-se por resultados de pesquisas e não por apelo comercial. É pertinente a obtenção de menor custo pelo bom gerenciamento e uso correto dos meios e fatores de produção, bem como pela pesquisa de mercado destes fatores.
Cafeicultura rentável pode ser obtida por alta produtividade, que se consegue com a utilização de tecnologia adequada ou determinada pela pesquisa, com alta produtividade dos meios de produção.
A identificação do comportamento dos preços do fertilizante utilizado na cafeicultura comprovou que este tem menores preços entre dezembro e julho, ocorrendo o menor preço no mês de julho. Entre os meses de setembro e dezembro, esse insumo alcança os maiores preços, porque é o período em que ocorre a compra de adubo para plantio das culturas anuais. O cafeicultor deve evitar a compra de adubos nesse período ou na época de sua aplicação, como faz a maioria, e comprá-lo logo após a colheita do café ou em junho e julho, quando os preços são menores.
Outra política é consultar os preços dos insumos e utilizar produtos mais baratos.
Comercialização
A comercialização do produto é outro desafio, pois desta depende, em grande parte, o sucesso do empreendimento na cafeicultura. É uma etapa trabalhosa e arriscada pela instabilidade dos preços na hora da venda. Há sempre a incerteza quanto ao preço que o produto atingirá ao fim do processo de produção. No Brasil, há cerca de 300 mil cafeicultores que, todo ano, têm que vender seu café. A comercialização, do ponto de vista do cafeicultor, é uma etapa incômoda, trabalhosa e arriscada. Diversas firmas, com finalidades diferentes, negociam o café. São exportadores, cooperativas, torrefações, cafeicultores que comercializam diretamente ou por meio de corretores. Os cafeicultores vendem para torrefações, indústrias de solúvel e para firmas exportadoras.
Administração de riscos
É conveniente que a administração dos riscos seja feita com eficiência. Deve-se informar sobre os preços vigentes e não entregar seu produto para o primeiro comprador, constituem boas práticas. Se o volume de produção for pequeno, o produtor deve associar-se a um grupo ou filiar-se a uma cooperativa. Solicitar à cooperativa que prove o seu café, de modo que saiba qual o tipo que está sendo vendido, não precisando aceitar a classificação que o comprador fizer.
Pela complexidade do mercado de café, é conveniente que se faça a administração dos riscos de maneira semelhante ao que se faz no mercado de ações. Os preços preferidos devem considerar: rentabilidade, liquidez e segurança. Se o cafeicultor visa à alta rentabilidade e quer obter o valor máximo pelo seu produto, deve preferir o preço no “pico”. Se faz esta opção de venda, persegue-se a rentabilidade. Liquidez é a facilidade de vender a mercadoria em qualquer tempo. As vendas feitas visando a segurança são aquelas que garantem o recebimento do valor combinado.
Cada cafeicultor é um caso particular, quanto à preferência por rentabilidade, liquidez ou garantia. Alguns podem acompanhar o mercado e esperar o momento em que obtenham o maior preço. Outros precisam vender imediatamente após a colheita, pois precisam assumir compromissos de pagamento do custo da produção. Para este o interesse é a liquidez, ou seja, encontrar o comprador no momento que necessitar do dinheiro.
Comportamento de preços
Acompanhe o mercado e espere o momento em que obterá o maior preço. Pela identificação do comportamento dos preços, utilizando médias de preços de café em 20 anos, constatou-se que os maiores preços ocorrem de dezembro a maio e os menores entre junho e novembro. Tomando-se por base a experiência de venda do cafeicultor e analisando-se as tendências do mercado, pode-se dividir o ano cafeeiro em períodos, como a seguir:
a) agosto a novembro: período após a colheita, quando acontecem as maiores vendas de café. O cafeicultor vende para saldar seus compromissos financeiros. É a época de grande liquidez, mas os preços são os mais baixos do ano. O mercado é firme e comprador;
b) dezembro a abril: período quando a maioria dos cafeicultores já vendeu seu produto. Restam os de melhor condição econômico-financeira. Nesse período acontecem os “picos” de preços, mas o mercado é instável e, às vezes, fica comprador algumas horas, um dia ou uma semana, logo, não há liquidez. É nessa época que os países importadores estão repondo estoques. Nesses países é inverno, ocasião de maior consumo de café;
c) maio a julho: o número de negócios é menor e a liquidez é pequena. O mercado apresenta-se nervoso, pode ocorrer geadas e secas. O conhecimento das safras futuras é impreciso, bem como o balanço dos estoques nas mãos de particulares, torrefadores e firmas exportadoras. Os produtores que vendem nesta época procedem como se estivessem em um jogo. Se acontece uma geada forte e a época é de escassez, o preço sobe e o cafeicultor tem grande rentabilidade.
Dicas importantes para o cafeicultor
É conveniente fazer uma diversificação nas vendas de acordo com a situação do cafeicultor e do mercado, para, no final, obter um preço médio vantajoso. É possível organizar as vendas de modo que apresentem, em média, certo grau de rentabilidade, liquidez e segurança compatíveis com o caso particular de cada cafeicultor.
a) administre riscos de preços, vendendo de maneira parcelada;
b) defenda-se contra mudanças bruscas de preços por meio de financiamento de safra: a obtenção de financiamento pode ser interessante por possibilitar a venda do produto em época mais propícia. Observe, entretanto, os juros. Veja se o que vai ganhar no preço é mais do que o que vai pagar pelo financiamento;
c) ganhe em produtividade e custo de produção, pois em anos de preços baixos só os cafeicultores que têm alta produtividade não se descapitalizam;
d) invista em qualidade, tipo, bebida, ponto de seca, esses fatores chegam a representar até 25% do preço do café;
e) faça o planejamento da comercialização: isso ajuda na administração das vendas;
f) não tente adivinhar aspectos relativos a preços, procure informações;
g) conheça bem a sua atividade: o cafeeiro tem um ciclo bienal, ou seja, produz muito em um ano e menos no outro. Todos conhecem o ditado que diz que o “cafeeiro um ano veste o seu dono no outro ele se veste”. O cafeicultor precisa estar atento a essa característica. É preciso reservar dinheiro, obtido no ano de alta, para custear a lavoura no ano de baixa produção, quando a receita do café é pequena e os tratos culturais precisam ser realizados, da mesma forma que em um ano de alta produção, para que se mantenha a produtividade alta no ano seguinte;
h) faça a certificação de sua propriedade: os produtos certificados têm atraído um número cada vez maior de consumidores em todo o mundo, o que possibilita melhoria da imagem do empreendimento entre os consumidores e a sociedade. Em atendimento a novas exigências do mercado, como a rastreabilidade, as certificações ganharam impulso com suas exigências quanto a aspectos que envolvem segurança alimentar e procedimentos de produção, origem geográfica e qualidade. Para a certificação, alguns requisitos básicos são exigidos, como a não contratação de mão-de-obra infantil; sistema de uso da água nos processos de irrigação e de lavagem de maneira que evite a sua devolução aos rios e lençóis freáticos; treinamento específico para os funcionários que aplicam agrotóxicos, além de especificações quanto à reserva ambiental e condições sociais dos trabalhadores. Adotar um sistema de certificação, contudo, demanda investimentos para adequar a propriedade às normas exigidas pelo certificador;
i) produza cafés especiais.
Cafés especiais
A produção de cafés especiais precisa ser intensificada, pois cada vez mais consumidores trocam o café matéria-prima pelo café fino ou gourmet. Os mercados consumidores deste café crescem a uma velocidade superior à do mercado produtor e a sua maior procura tem determinado sensível diferencial de preço. A despeito disso, cerca de 7% apenas da produção mundial são destinados para atender a esse mercado, tendo o Brasil condições para o seu cultivo. Não existe, mundialmente, disponibilidade para o seu amplo cultivo.
Cafés especiais, entretanto, requerem mais cuidados na seleção dos grãos, na maneira como são preparados, nos métodos de cultivo e na associação a sabores. Para atingir o mercado de cafés especiais (gourmet) passa-se pela produção de um café de boa qualidade organoléptica, em termos de aroma e sabor, com características sensoriais únicas que permitam sua identificação. Para sua produção, há necessidade de conhecer as exigências dos consumidores por meio de contatos diretos e relacionamentos mais modernos.
Esse produto tem a garantia de vir diretamente do produtor, com atendimento personalizado ao cliente, seja este um torrador, seja um importador de países consumidores. Oferece garantia de consistência, além de facilitar sua rastreabilidade, cada vez mais importante nos mercados de produtos alimentícios. A certificação, a garantia de origem e a qualidade do café estão associadas à obtenção de um valor adicional, pela satisfação dos consumidores.
Consegue-se esse mercado pela participação em feiras e congressos de cafés especiais nos Estados Unidos, Europa e Japão, onde são feitos contatos com os clientes. A internet permite uma redução dessa intermediação ao oferecer informações detalhadas e rastreabilidade que o mercado demanda, com grande potencial para um novo sistema de comercialização. Pela internet, o comprador pode acessar um banco de dados que mostre a produção dos lotes ofertados, com informações sobre o produtor, sua fazenda, localização com altitude e dados da ecologia da região, referenciais a fotos e mapas, descrição do sistema de produção, além da avaliação qualitativa do produto. O mercado de cafés especiais é, portanto, uma opção para o produtor que estiver capacitado a produzir com qualidade superior e diferenciada.
Cabe ao produtor de café, na atual conjuntura, buscar maior eficiência, atuar com profissionalismo, adequar-se administrativa e comercialmente à condução da cafeicultura. Ações em grupo, melhoria da imagem do produto e da região, diversificação por tipo de produto são imprescindíveis a sua sobrevivência.
Glória Zélia Teixeira Caixeta – Economista Rural, M.Sc., Pesquisadora EPAMIG
Consumo de café gourmet mais que duplica no país
Consumidor já reconhece e incorpora ao dia a dia habito de tomar café de alta qualidade
A Associação Brasileira da Indústria de Café (ABIC) divulgou o Estudo Anual sobre o Consumo de Café em todo o país e aponta que no ano passado 97% dos entrevistados haviam tomado café no dia da entrevista e no dia anterior, número 6% maior que o registrado há sete anos. A preferência pelo tipo de café também apresenta novas tendências. Além de a primeira xícara tomada ser do café filtrado (93% em casa e 96% fora do lar), o consumo por grãos gourmet e especiais mais que duplicou, comparando-se 2008 com o ano passado, foi de 1,2%, para 2,7%.
O Café do Centro, uma das maiores torrefadoras de grãos gourmet e especiais do país, registrou índices acima do mercado de gourmet que cresce de 15 a 20% ao ano segundo a ABIC. A torrefadora obteve aumento de 40% nas vendas em 2009, apenas no Food Service, atuando nos estados Paraná e Santa Catarina no sul; Rio de Janeiro e São Paulo no sudeste e Rio Grande do Norte na região nordeste. No mercado varejista concentrado em Florianópolis e Porto Alegre, por meio das redes Angeloni e Zaffari a expansão foi de 10%. Segundo Rafael e Rodrigo Branco Peres, diretores do Café do Centro, a mudança nos hábitos de consumo é fator determinante para o aumento da venda de cafés gourmet e especiais no país. “Características como aroma, corpo diferenciado, doçura e origem dos grãos são alguns dos diferenciais que já são percebidos por quem consume café gourmet. Este tipo de consumidor busca alta qualidade acima de tudo e está disposto a pagar por um excelente café”.