No início de maio, em Vacaria (RS), o Brasil inseriu seu nome na história da produção mundial de maçã e de pera. No início de maio, o ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Neri Geller, assinou a declaração oficial de erradicação da mariposa Cydia pomonella do País, que se tornou o primeiro inseto-praga a ser erradicado no Brasil.
“Essa é uma conquista importante da Defesa Sanitária Vegetal brasileira. Trata-se da erradicação de uma praga severa, que atinge diversos países, como Uruguai, Estados Unidos e Argentina”, afirmou Geller. “É a primeira vez que um país erradica a Cydia no mundo”, acrescenta o coordenador-técnico do Programa Nacional de Erradicação da Cydia pomonella, Adalecio Kovaleski, pesquisador da Embrapa Uva e Vinho.
O pleito do setor da pomicultura agora é o estabelecimento de “requisitos fitossanitários tecnicamente viáveis para que a fruta importada não reintroduza a praga e voltemos a ter a Cydia ‘dormindo embaixo de nossa cama’”, ressalta o diretor-executivo da Associação Brasileira de Produtores de Maçã (ABPM), Moisés Lopes de Albuquerque.
Hospedeiros
Focado nesse problema, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) deverá revisar esses requisitos fitossanitários para países exportadores de produtos considerados hospedeiros dessa praga e a elaborar um plano de contingência. Além disso, serão tomadas as demais medidas necessárias à manutenção do reconhecimento do status de praga erradicada do país.
Uma das precauções que poderiam ser adotadas é a autorização de importação de frutas somente de áreas de baixa prevalência da praga. No entanto, a deliberação de medidas fitossanitárias como essa é uma atribuição da comissão do Programa Nacional de Erradicação da Cydia, ligado ao Mapa.
Menos inseticidas na lavoura
A Cydia, conhecida como lagarta-da-maçã, é uma das mais danosas pragas dessa fruta e também de pera no mundo. Ela é capaz de dizimar pomares inteiros se não for controlada e impõe prejuízos estimados em 400 dólares por hectare. Se ela se estabelecesse no Brasil, o prejuízo estimado estaria em torno de 40 milhões de dólares por ano somente na produção de maçãs.
Para o controle, são necessárias de 10 a 15 aplicações de inseticidas durante a safra. Ou seja, a erradicação da Cydia pomonella significa menor impacto ambiental e menos risco de contaminação, permitindo projetar, para o setor da pomicultura brasileiro, a conquista de ainda mais espaços de mercado.
Economia
A estimativa é de que o Brasil economize cerca de R$ 40 milhões anuais em agrotóxicos voltados para a praga. Cabe ressaltar que foram investidos apenas R$ 10 milhões no programa de erradicação do inseto. Além da maçã, a conquista beneficia muitas outras culturas atacadas pela Cydia pomonella, como pera, marmelo e noz europeia. Frutas de caroço, como pêssego, ameixa, damasco, cereja e nectarina, são hospedeiros alternativos ou secundários.
Em reunião técnica com representantes e produtores do setor da pomicultura que antecedeu a assinatura da declaração de erradicação, o ministro da Agricultura, Neri Geller incentivou que a Embrapa siga trabalhando no combate à outra ameaça para a fruticultura brasileira, a Anastrepha fraterculus, conhecida como mosca-das-frutas. Ele garantiu a disponibilização dos recursos necessários para pesquisar meios de enfrentamento dessa praga. “A mosca-das-frutas causa grandes prejuízos não só à pomicultura de Vacaria, mas a de todo o Brasil,”, afirma o, presidente da Cooperativa Tritícola Mista Vacariense (Cooperval), Ângelo Pegoraro, que também é produtor de maçã.
Giovani Antonio Capra – Embrapa Uva e Vinho
Mobilização social para conquista da erradicação
A Cydia pomonella foi detectada no território nacional pela primeira vez em 1991 e a última captura ocorreu em novembro de 2011. Segundo a Convenção Internacional para a Proteção de Vegetais, as áreas produtivas podem ser declaradas livres da praga depois de dois anos desde a última ocorrência identificada.
A praga foi introduzida a partir de fruta infestada vinda do exterior e comercializada em áreas urbanas, de acordo com o coordenador técnico do Programa Nacional de Erradicação, Adalecio Kovaleski. “Nelas, a Cydia encontrou hospedeiras (espécies em que consegue se desenvolver) justamente por serem plantas não-comerciais, ou seja, que não recebiam os devidos cuidados de manejo”, detalha.
Armadilhas
Várias medidas foram implementadas pelo Mapa, por meio do Programa, para a erradicação da praga. Entre elas, a instalação e o monitoramento de mais de dez mil armadilhas por ano, instaladas em áreas urbanas e pomares comerciais. Na safra de 1997/1998, foram capturados cerca de 22,5 mil insetos da praga nas áreas urbanas de Lages, em Santa Catarina, Vacaria, Caxias do Sul e Bom Jesus, no Rio Grande do Sul.
Durante o período do Programa de Erradicação, foram removidas mais de 100 mil plantas hospedeiras nas áreas urbanas dos quatro municípios. Rio Grande do Sul e Santa Catarina representam 95% da produção nacional de maçã.
Em Lages, Vacaria, Caxias do Sul e Bom Jesus, foi feito um trabalho de remoção e substituição de plantas hospedeiras como macieira, pereira, marmeleiro, nogueira europeia, pessegueiro, ameixeira e nectarineira. Os proprietários, ao concordar em participar do Programa, recebiam em troca das plantas removidas o mesmo número de plantas de espécies não hospedeiras como kiwizeiro, videira, citros e espécimes de frutas nativas, como pitanga, guabiroba e goiaba. “Cabe ressaltar o envolvimento de Mapa, Embrapa Uva e Vinho, Associação Brasileira de Produtores de Maçã (ABPM), Associação Gaúcha dos Produtores de Maçã (Agapomi), Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina (Cidasc), secretarias estaduais da Agricultura do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, Ministério Público e secretarias da Agricultura dos municípios envolvidos na erradicação”, lembra Adalecio Kovaleski. A erradicação da Cydia, portanto, foi uma vitória do País construída pelos mais diversos segmentos da sociedade brasileira.