A variedade Goethe, batizada em homenagem ao escritor alemão Johann Wolfgang Von Goethe, autor da frase: “a vida é muito curta para se beber vinho ruim”, encontrou local ideal de produção na região sul de Santa Catarina
Os vinhos produzidos a partir de uvas Goethe estão intimamente relacionados às condições de solo e clima da região de Urussanga — hoje conhecida como Vales da Uva Goethe —, aos sistemas de produção local e ao saber fazer, únicos no mundo, daí reconhecidos como terroirs.
A variedade Goethe, desenvolvida nos Estados Unidos em 1850, é um híbrido que reúne a rusticidade das videiras americanas ao rico e delicado sabor das uvas europeias. Apesar de introduzida em outras regiões brasileiras, como no Rio Grande do Sul, em nenhum outro local produziu vinhos com a qualidade obtida no Vales da Uva Goethe.
Vinho com ‘identidade’
Caracterizada como uva moscato, devido às suas características olfativas e gustativas, adaptou-se bem à região sul catarinense, onde é estudada durante todo ciclo vegetativo — da poda à colheita — e analisada em métodos de microvinificação.
Os vinhos Goethe possuem características históricas e culturais singulares que os diferenciam dos demais, tanto em relação à qualidade quanto à tipicidade e identidade. Sua produção está fortemente ligada à imigração italiana do século XIX e suas tradições na produção vitivinícola.
Procedência
Registro IG 201009 INPI
Indicação de Procedência/2012
Área Geográfica Delimitada: 560 hectares
Abrangência: municípios de Urussanga, Pedras Grandes, Cocal do Sul, Morro da Fumaça, Treze de Maio, Orleans Nova Veneza e Içara, litoral sul de Santa Catarina
Altitude média de 612m
Cem anos de experiências
Foi necessário um século de experimentações e dedicação de gerações, desde o início dos cultivos da uva Goethe na região, para que os produtores de vinho solicitassem sua Indicação Geográfica.
A qualidade do produto foi um aspecto importante para a obtenção da Indicação de Procedência (IP), a primeira do Estado de Santa Catarina. Enólogos, enófilos e experts nos processos de elaboração dos vinhos prestaram consultoria, desde a etapa da produção da uva, até a elaboração — com atenção especial à fermentação — armazenamento, sanidade, envasamento, tipicidade, qualidade e apresentação do vinho. A partir das análises realizadas, foi elaborado um caderno de normas a serem seguidas por todos os produtores do Vales da Uva Goethe.
Saga dos imigrantes
O projeto ProGoethe, uma ação conjunta entre instituições como Sebrae, Epagri, UFSC, MAPA, ao lado de produtores e prefeituras que integram o Vales da Uva Goethe, é mais uma alternativa econômica no espaço rural, alicerçada na preservação da identidade cultural catarinense.
Segundo o engenheiro agrônomo Sérgio R. Maestrelli, que também é membro da Academia de Letras de Urussanga, os primeiros imigrantes italianos que chegaram à região, viram as parreiras italianas, trazidas na bagagem, produzindo muitos ramos, poucas folhas, e nada de uva. A uva não amadurecia totalmente e o vinho obtido ficava ácido.
As parreiras no Brasil só tinham inimigos: formigas, que à noite devoram as vinhas; um inseto, que roía o cabo do cacho e ele secava; além de outros que atacavam os grãos maduros, quando os cachos verdes não eram queimados pelo sol. Os colonos permaneciam noites e noites em guarda acendendo fogo nos carreiros para salvar o parreiral.
Terroir
Maestrelli conta que foi o imigrante italiano “gionarlista e avocato” Giuseppe Caruso que, acreditando no “terroir” local, trouxe para Urussanga as famosas mudas de uva Goethe, que possuem este nome em homenagem ao escritor alemão Johann Wolfgang Von Goethe, morto em 1832. Já em terras brasileiras, Caruso alterou seu nome para José, em homenagem ao Brasil, e acrescentou “Mac Donald”, em homenagem a sua mãe, de origem irlandesa.
Em 1913, foi fundada a primeira vinícola do município, a “Indústrias J. Caruso Mac Donald”, que, no auge da produção, possuía capacidade para estocar dois milhões de litros, um marco para a época. Ao lado da “J. Caruso”, a ”Vinícola Cadorin” e a “Vinhos Samos-Santé” comercializavam este vinho do Pará ao Rio Grande do Sul. Em 1939, o vinho Goethe obteve medalha de ouro na Exposição de Nova York.
Salões do Palácio
O vinho Goethe, de coloração amarelo-palha e reflexos esverdeados, era servido em terras cariocas nas reuniões políticas no Palácio do Catete e nas recepções diplomáticas do Copacabana Palace, no governo de Getúlio Vargas, presidente que disponibilizou recursos para a construção, em 1942, da Estação de Enologia de Urussanga, atual Estação Experimental da Epagri. Desde a criação, em 1942, a Subestação de Enologia de Urussanga (atualmente Estação Experimental de Urussanga), tem como objetivo desenvolver pesquisas com diferentes variedades de uvas. Passou e superou a crise da atividade vitivinícola na região nos anos de 1970, e conseguiu que a produção de vinho Goethe nunca fosse interrompida.
Atualmente, a Festa do Vinho Goethe movimenta o município de Pedras Grandes (SC), na localidade de Azambuja, berço da imigração italiana no sul catarinense, com apresentações culturais de gastronomia e, claro, degustação do vinho típico da região.