No caso dos grãos, o aumento pode passar de 25%
Estudo que contou com a participação de um pesquisador brasileiro e que foi publicado na Scientific Reports, única publicação de acesso livre do Nature Publishing Group, revela que a presença das minhocas no solo aumenta a produtividade agrícola. O resultado mostra que, “em média, a presença das minhocas aumentou a produtividade de grãos em 25% e a biomassa aérea de plantas, em especial as utilizadas em pastagens, em 23%”, afirma George Brown, pesquisador em ecologia do solo da Embrapa Florestas (PR), e um dos coautores do trabalho.
“A biomassa das raízes também aumentou em 20%”, revela. Outra conclusão é que as minhocas não influenciaram no teor de nitrogênio das plantas, indicando que a qualidade não foi abalada. “Portanto, as minhocas afetam principalmente a produtividade”.
“O resultado era esperado”, afirma Brown. “Há centenas de anos as minhocas são consideradas aliadas do agricultor, ajudando no crescimento das plantas. Contudo, o que não sabíamos ainda era a dimensão do efeito positivo, nem como ele funcionava. Foi este aspecto que avaliamos nesse trabalho”, completa.
Pesquisa
Para chegar a esse resultado, os pesquisadores reuniram artigos sobre o assunto publicados em revistas indexadas: no total foram 58 — o mais antigo é de 1910. Todos os ensaios mediram o efeito das minhocas na produtividade agrícola e a biomassa vegetal. Em seguida, foi realizada uma meta-análise dos dados, técnica estatística usada para avaliar e buscar padrões em grandes volumes de dados. A equipe de pesquisa incluiu, além de Brown, professores e alunos de pós-graduação da Universidade de Wageningen (Indonésia) e um pesquisador da Northern Arizona University (Estados Unidos).
Os autores procuraram, ainda, elucidar os mecanismos por trás dos efeitos positivos proporcionados pelas minhocas. “Com a construção de galerias, a ingestão de solo e a produção de coprólitos (excrementos), as minhocas liberam o nitrogênio presente nos resíduos vegetais e na matéria orgânica do solo, transformando o que seria adubo orgânico em mineral”, explica Jan Willem van Groenigen, líder da equipe e primeiro autor do trabalho.
Importância do nitrogênio
“E o nitrogênio é um dos nutrientes mais importantes para o crescimento das plantas”, completa. O efeito positivo desapareceu quando doses maiores de adubo nitrogenado eram aplicadas pelos produtores ou quando leguminosas (que fixam nitrogênio do ar) estavam presentes.
No entanto, Brown explica que as minhocas não produzem nitrogênio. Elas apenas ajudam a torná-lo mais disponível para as plantas. O efeito positivo das minhocas foi maior quando estavam presentes no solo maiores quantidades de resíduos das culturas, que, por sua vez, alimentam as minhocas, como no plantio direto, por exemplo.
Alternativa
Os pesquisadores concluíram, então, que as minhocas são especialmente importantes para dois tipos de agricultores: aqueles que podem usar somente baixas doses, ou nenhum, de adubo nitrogenado porque não têm condições financeiras ou acesso a ele; e aqueles que não querem usá-lo, pois dependem do processo de decomposição natural da matéria orgânica para liberar nutrientes para as plantas, como no caso da agricultura orgânica.
Portanto, em sistemas intensivos de produção, com necessidade de alto uso de insumos e adubos químicos, o efeito benéfico das minhocas sobre a produtividade das culturas provavelmente será menor.
Próximos passos
Há muitas perguntas a serem respondidas, enfatiza Brown. “Encontramos um paradoxo: as minhocas têm maiores benefícios na produção em solos pobres, de baixa fertilidade, onde suas populações também podem estar limitadas por falta de alimento. Portanto, trabalhos futuros devem buscar formas de aumentar as populações de minhocas nesses solos, especialmente com uso racional de insumos orgânicos.
Aliadas do produtor
Dessa forma, o agricultor se tornará aliado da minhoca, assim como ela é aliada do agricultor”, explica Brown. “Além disso”, pondera, “ainda não está claro como as minhocas afetam a disponibilidade de outros nutrientes essenciais para as plantas, especialmente o fósforo. Eventualmente, teremos que saber que isso acontece, para conseguirmos entender como as minhocas podem nos ajudar a construir uma agricultura mais sustentável”.
Os resultados não significam que o produtor poderá adicionar deliberadamente minhocas ao seu terreno para aumentar a produtividade, pois é uma prática inviável do ponto de vista econômico e ecológico para a maior parte das culturas. “Isso só deve ser realizado excepcionalmente, pois o bom manejo das culturas e da propriedade agrícola já ajuda na manutenção e no aumento das populações de minhocas no solo.
Para ser um aliado das minhocas e desfrutar dos benefícios que elas proporcionam ao solo, o agricultor deve evitar o uso exagerado de agrotóxicos, a movimentação excessiva do solo (por exemplo, a inversão do solo com arado), a erosão, a compactação e a contaminação do solo e manejar a adição de restos das culturas no solo, visando aumentar a matéria orgânica que serve de alimento para as populações de minhocas”, sentencia Brown.
Minhocas também são indicadoras de contaminação dos solos
O solo abriga e sustenta uma infinidade de organismos e todo um ecossistema que pode ser afetado por poluentes (agrotóxicos, metais pesados etc.) nele depositados. Por isso, os métodos de avaliação da qualidade do solo são cada vez mais necessários para o monitoramento ambiental e a prevenção de desastres.
Os oligoquetas (minhocas e enquitreídeos) têm sido amplamente usados como indicadores de contaminação do solo e protocolos-padrão Internacional foram desenvolvidos para espécies de clima temperado. Porém, esses testes devem ser adaptados à realidade brasileira (temperatura, substratos, espécies), para que gerem respostas mais realistas sobre a contaminação.
Atualmente, no Brasil, apenas o teste agudo e de fuga (ou rejeição) com minhocas foram incluídos nas normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT. Existem outros testes que são igualmente importantes, mas ainda não foram padronizados e adaptados para as condições brasileiras.
Existem várias iniciativas de uso desses animais em diversos testes ecotoxicológicos no país, como indica o estudo dos pesquisadores Cintia Niva, George Brown e Jörg Römbke.
Ensaio de ecotoxicidade aguda: esse ensaio avalia o efeito do solo contaminado sobre a mortalidade de oligoquetas após duas semanas, e tem sido utilizado com minhocas para determinar a toxicidade de agrotóxicos no solo para fins de registro. Entretanto, muitas vezes, os contaminantes presentes no solo podem não matar, mas causar alterações no desenvolvimento, crescimento e reprodução dos organismos que nele vivem, e ainda serem acumulados no corpo e transferidos para outros organismos que se alimentam deles. Por isso, se desenvolveram outros ensaios.
Ensaio de ecotoxicidade crônica: avalia o efeito de concentrações subletais de contaminantes sobre a reprodução de oligoquetas. Nesse caso, o número de juvenis gerados ao final de um período mais prolongado de exposição (4 a 8 semanas) é comparado entre solo contaminado e não contaminado.
Ensaio de bioacumulação: calcula a capacidade de um oligoqueta acumular um determinado contaminante ao longo do tempo. Esse ensaio é especialmente importante para avaliar se o contaminante poderá afetar a cadeia alimentar do ecossistema.
Ensaio de fuga: esse ensaio estima rapidamente a capacidade das minhocas de escolher entre um solo contaminado ou não contaminado, e tem mostrado boa sensibilidade no diagnóstico da qualidade do solo.