Pesquisa pode reverter ameaça de extinção do também chamado pinheiro-do-paraná
A araucária (Araucaria angustifolia), também conhecida como pinheiro-do-paraná, faz parte do ecossistema conhecido como “Floresta com Araucária”. Originalmente, esta floresta ocupava uma área de cerca de 200 mil quilômetros quadrados, com distribuição mais contínua entre os Estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul e, de forma esparsa e irregular, na região Sudeste. Hoje, está reduzida a cerca de 1% de sua área original, sendo uma das espécies que mais sofreu com o desmatamento.
A exploração da espécie ocorreu por causa do avanço da fronteira agrícola, do crescimento das cidades, por possuir madeira de qualidade para fabricação de móveis e ser boa matéria-prima para papel e celulose. Por tudo isto, a espécie foi tão explorada, que passou a figurar na lista dos tipos brasileiros ameaçados de extinção.
No Paraná, por exemplo, a legislação permite que seja cortada somente a araucária que foi, comprovadamente, plantada — isto quer dizer estar plantada em linha e com plano de manejo registrado no órgão ambiental competente. Araucárias que nascem por regeneração natural são consideradas nativas e não podem ser manejadas ou cortadas”.
Como é uma espécie que se regenera bem, ou seja, nasce sozinha sem precisar que alguém a plante, muitas vezes a muda é arrancada logo que nasce, justamente por não poder ser manejada ou utilizada depois”, explica o pesquisador Ivar Wendling, da Embrapa Florestas. “O produtor rural entende como algo que está tomando espaço na sua propriedade e a araucária se torna uma árvore indesejada”, completa.
Manejo e renda
Como seria se, ao contrário, o produtor rural enxergasse na araucária uma possibilidade de manejo e renda, mesmo com aquelas que se regeneram naturalmente? “Neste caso, o produtor vai querer que a muda cresça e se desenvolva e pode também investir em plantios”, afirma Wendling. “É a melhor forma, hoje, de garantir o desenvolvimento dos povoamentos de araucária”, avalia a pesquisadora Valderês de Sousa, também da Embrapa Florestas.
Para isto, um grupo de pesquisadores da estatal tem se dedicado a desenvolver tecnologias para que a araucária possa ser conservada e também gerar renda.
É o conceito “conservar pelo uso” que é defendido. “Mesmo com árvores sendo cortadas para usar a madeira, por exemplo, o interesse pela espécie pode crescer tanto que, em pouco tempo, a espécie provavelmente não vai mais estar ameaçada de extinção”, acredita Wendling.
Para tanto, a pesquisa florestal tem lançado mão de diferentes estratégias, que vão desde o melhoramento genético e manejo florestal, passando pela clonagem e criopreservação, até o incentivo a empresas para pagamento por serviços ambientais prestados por produtores, além de estudos sobre o consumo do pinhão, entre outros.
“Como a pesquisa florestal geralmente leva mais tempo para chegar a seus resultados, atuamos em diversas frentes com a intenção de viabilizar o uso da espécie e fornecer subsídios para a alteração na legislação”, salienta o chefe de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Florestas, Sergio Gaiad. Tudo isto, segundo ele, para que a araucária seja vista como uma aliada do produtor rural e não corra mais o risco de extinção.
Agricultores familiares e o manejo participativo
Ninguém melhor para conhecer uma árvore do que aquele que a observa e convive com ela no dia a dia. Esta é a premissa do manejo florestal participativo, ponto central do projeto “Uso e conservação da araucária na agricultura familiar”, coordenado pela Embrapa Florestas. Participam dele produtores de Bituruna, Cruz Machado e São Mateus do Sul (PR), e Canoinhas e Caçador (SC). “Os produtores estão nos ajudando a identificar árvores com diferentes características: produção precoce e tardia de pinhão, árvores com crescimento superior, entre outras”, explica a pesquisadora e líder do projeto Maria Izabel Radomski. Por meio do projeto, já foram coletadas sementes em dez propriedades pelos próprios agricultores.
Investimento prolongado
Anísio Rosa, assentado rural há 25 anos, conta que colhe o pinhão de árvores que plantou logo que entrou no lote, além daquelas que já existiam originalmente na região. “Estou aos poucos saindo da agricultura e investindo mais em floresta, em especial na araucária e na erva-mate”, relata o produtor. “A gente não pode pensar só no imediato, mas também no investimento prolongado e a araucária é uma excelente alternativa”, ensina.
O produtor está auxiliando na identificação de árvores matrizes com produção de pinhão, em diferentes épocas do ano. “Já identificamos cinco árvores-matrizes, aqui na minha propriedade. Este é um jeito de a gente ajudar a ampliar o uso desta árvore tão importante para nossa região”.
Novidade
Uma novidade que está sendo implantada com o projeto da Embrapa Florestas é a análise da distribuição das árvores em áreas de florestas manejadas pelos agricultores. Para tanto, são feitas imagens em escala reduzida, que funcionam como uma vista aérea da copa das árvores. Com este recurso, o produtor pode entender melhor onde estão os vazios, as clareiras e as sobreposições em sua área. “Vai ser possível discutir, espacialmente, o manejo e o produtor poderá fazer a modelagem de sua propriedade, sem comprometer a área com um manejo inadequado”, ressalta Maria Izabel.
A primeira experiência dessa metodologia acontece em cinco propriedades. Serão discutidos modelos de integração da araucária aos sistemas tradicionais de produção dos agricultores familiares, seja por meio de plantios puros ou sistemas agroflorestais, tendo na araucária uma fonte de diversificação da renda nas propriedades.
Paisagismo rural, sequestro de carbono e retorno financeiro garantido a agricultores
Preservar a araucária, aumentar a renda, auxiliar na redução do impacto das mudanças climáticas e colaborar com a pesquisa florestal. Um sonho distante? Não para 65 agricultores familiares da Lapa e Fernandes Pinheiro (PR) e Caçador (SC), que participam do projeto “Estradas com Araucária”, que incentiva o plantio da espécie em divisas de propriedades rurais com faixas de domínio de estradas.
Os produtores rurais plantam 200 mudas de araucária por propriedade e recebem cinco reais por cada uma, totalizando uma renda de mil reais fixos por ano, compreendendo o plantio até as árvores completarem seu desenvolvimento e começarem a produzir o pinhão.
Trata-se do chamado “Pagamento por Serviços Ambientais” (PSA). “O pagamento é feito por empresas privadas, que utilizam as árvores, principalmente para compensar emissões de gases de efeito estufa de suas operações”, explica Edilson Batista de Oliveira, pesquisador da Embrapa Florestas e idealizador do projeto. Em três anos, já foram plantadas cerca de 20 mil mudas de araucária nas regiões envolvidas pelo projeto.
Parceiros
Fruto de parcerias com órgãos estaduais e universidades dos Estados do Paraná e Santa Catarina, o “Estradas com Araucária” é um dos únicos projetos no País, que, efetivamente, realiza o pagamento por serviços ambientais. “Temos recursos garantidos para os próximos dez anos para os produtores que já participam”, comemora Oliveira.
O Grupo DSR patrocina o projeto. Segundo Paulo Caffeu, gerente-geral da empresa, “o projeto viabiliza a aplicação da prática de responsabilidade social do Grupo com a remuneração das famílias envolvidas e os respectivos benefícios decorrentes, como também possibilita o uso do projeto como um modelo sustentável”.
Os plantios em fileiras simples nas divisas com estradas se integram bem às atividades agropecuárias, podendo servir, por exemplo, como moirões vivos e para proporcionar conforto térmico para o gado. Além disto, araucárias plantadas em linhas são excelentes produtoras de pinhão, as sementes comestíveis da araucária, cada vez mais valorizados no mercado.
“Outro resultado positivo é que muitos produtores, por iniciativa própria, têm plantado araucárias nas divisas de suas propriedades pelas vantagens que estas árvores oferecem”, conta Oliveira.
Retorno garantido
O retorno para a sociedade é garantido: o plantio da araucária também auxilia no paisagismo de estradas, na proteção ambiental, traz benefícios para a fauna local e atua na educação ambiental. Para os produtores, além do recurso assegurado pelo PSA, há o retorno posterior com a venda do pinhão. Para a pesquisa florestal, estes plantios têm contribuído para estudos sobre conservação, manejo e melhoramento genético.
Katia Regina Pichelli – Embrapa Florestas
Brotos favorecem cultivo de araucária com menor porte
Planta fêmea leva normalmente de 9 a 12 anos de idade para começar a florescer e de 12 a 15 anos para produzir a oleaginosa. Daí a importância da pesquisa da Embrapa Florestas, que acelera este processo
Mudas enxertadas vêm facilitando a produção de árvores mais baixas e antecipando a produção de pinhão, com o simples uso de brotos extraídos da copa de araucárias adultas. É o que revela uma pesquisa realizada pela Embrapa Florestas (PR).
De acordo com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, a araucária (Araucaria angustifolia), também conhecida como Pinheiro-do-Paraná, produz uma semente bastante consumida pelo ser humano: o pinhão. O “problema”, até então, é que a planta fêmea leva normalmente de 9 a 12 anos para começar a florescer e de 12 a 15 anos para produzir a oleaginosa, que é encontrada dentro da pinha nos galhos das árvores fêmeas.
Com a metodologia desenvolvida pela Embrapa Florestas, as árvores começam a produzir a partir de seis a oito anos, e o porte das árvores fica entre dois e seis metros de altura, o que facilita a coleta das sementes. Com a adoção destas mudas, os produtores poderão investir na formação de pomares de pinhão como fonte de renda na propriedade rural.
Extrativismo
No Brasil, a colheita do pinhão ainda é artesanal e extrativista. Entre o verão e o outono, é comum observar vendedores em beira de estradas com pinhões que foram coletados no chão, embaixo de araucárias, além da prática da escalada das árvores, considerada uma atividade de risco, se não for feita de forma adequada. Além do perigo para quem coleta, há ainda a chance de colher pinhas que ainda não estejam maduras, ou seja, sem o pinhão formado, prejudicando sobretudo o nascimento de novas árvores.
Apesar de ser um mercado ainda bastante informal, dados de volumes comercializados nas unidades da Companhia de Abastecimento (Ceasa) do Estado de Paraná indicam que, no ano passado, foram vendidas 800 toneladas de pinhão de várias procedências, somando um comércio de quase R$ 4 milhões.
Se levar em conta o volume informal, estes valores podem ser até cinco vezes mais altos. “O mercado tem bastante potencial. Se possibilitarmos a produção precoce e a facilidade na coleta, pode se tornar uma fonte de renda importante para os produtores rurais”, afirma o pesquisador Ivar Wendling, da Embrapa Florestas.
Para produção de mudas de araucárias, pode ser usada a técnica de enxertia, a partir de brotos da copa da árvore
Enxertia
Para produção de mudas, o protocolo desenvolvido pela estatal utiliza a técnica de enxertia, a partir de brotos da copa da árvore. “Estes brotos que serão enxertados têm a idade ontogenética da árvore de onde foram coletados, então, vão se comportar como árvores adultas”, explica Wendling.
As novas plantas, com isto, começam a produzir o pinhão em muito menos tempo, além de reduzir o porte das árvores, assegura o pesquisador. Ele destaca que a técnica também ajuda a produzir pinhão com as características mais desejadas pelo mercado consumidor, porque é possível identificar e selecionar árvores-matrizes, conforme o perfil desejado.
Plantas enxertadas em pomar de araucária, com indução de brotações com crescimento vertical. Fotos: Embrapa Florestas
Consumo
Uma pesquisa feita há mais de cinco anos com consumidores de pinhão, em Curitiba (PR), mostra que o hábito de consumo da semente é muito comum entre as famílias curitibanas.
“A quantidade média de compra é de dois a quatro quilos por semana. Na hora da compra, o consumidor baseia-se muito na aparência, como cor, tamanho, brilho, diâmetro, frescor e ausência de sujeira”, salienta a pesquisadora Rossana Catiê Godoy, responsável pela pesquisa.
Estas características podem ser identificadas em árvores-matrizes e auxiliar no processo de seleção das árvores, que terão seus brotos colhidos para a enxertia. Segundo Wendling, itens como composição nutricional diferenciada, época de produção, entre outros, também podem servir como base para a seleção.
Passo a passo da técnica de enxertia
Outra questão é que algumas árvores produzem os chamados pinhões precoces, que ficam prontos para colheita em fevereiro e março. Da mesma forma, outras árvores produzem pinhões tardios, que podem ser coletados geralmente até setembro. “Com esta técnica também podemos, no futuro, desenvolver pomares com plantas que produzam pinhão praticamente o ano inteiro”, avalia o pesquisador da Embrapa Florestas.
Vantagem
A vantagem deste processo, segundo o cientista, é a possibilidade de saber com antecedência qual o sexo da planta que está sendo gerada, o que, na produção de mudas via semente, só é possível quando as plantas iniciam o florescimento, com cerca de dez anos.
“Para programas de resgate e conservação da araucária, isto é fantástico. Por se tratar de uma espécie dioica (que tem sexos diferentes), é preciso plantas dos dois sexos para proporcionar sua reprodução”, explica Wendling.
Como selecionar e resgatar a planta matriz
- Selecione árvores superiores para produção de pinhão, considerando sua alta produtividade, tamanho e tipo de pinhão, resistência a pragas e doenças, época de frutificação etc.
- Para obter as brotações, considere os ponteiros de duas a quatro linhas de galhos abaixo do ponteiro, o que induzirá a emissão de brotações que crescem para cima (ortotrópicas). Vale mencionar que a araucária tem dois tipos de brotações: as que crescem de forma vertical ou para cima (ortotrópicas), como o tronco principal da árvore; e as que crescem lateralmente ou de forma inclinada (plagiotrópicas), como os galhos da árvore.
As épocas mais recomendadas são inverno e primavera, quando as brotações estarão aptas para serem coletadas, de oito meses a dois anos após a poda. Esta poda pode ser iniciada a partir do momento que for possível avaliar as plantas matrizes, conforme os critérios de seleção acima citados.
- Analise as brotações que aparecem lá em cima. Selecione as que tiverem crescimento vertical. As demais não estarão aptas para o processo de enxertia, pois não vão originar árvores com formação normal.
Para mais informações, acesse http://ow.ly/Suw37.
Fonte: Embrapa Florestas