Modelos revolucionários da Embrapa garantem mais precisão e agilidade à caracterização de recursos genéticos de maracujá
Dois métodos inovadores para potencializar a caracterização de recursos genéticos de maracujá foram desenvolvidos por cientistas da Embrapa Mandioca e Fruticultura.
Segundo Onildo Nunes, pesquisador da unidade localizada em Cruz das Almas, BA, o primeiro método utiliza modelos matemáticos para predizer a quantidade de polpa da fruta. O outro se baseia em ferramentas computacionais, como softwares e aplicativos, para definir a cor de vários caracteres da planta, como casca e polpa.
Nunes explica que a etapa de caracterização é fundamental para aprimorar os programas de melhoramento genético e torná-los cada vez mais próximos das demandas do setor produtivo e da sociedade.
“No caso do maracujá, ambos os métodos envolvem características de interesse do mercado e dos consumidores, como a polpa – que é fundamental para a fabricação de suco – e a cor da fruta, que possui grande quantidade de vitaminas e outras substâncias de importância para a saúde humana”.
Peso da polpa sem sementes
O especialista da Embrapa Mandioca e Fruticultura afirma que o peso da polpa sem sementes é uma das características de grande importância na caracterização de Passiflora (gênero ao qual pertence o maracujá), ”já que a polpa representa o principal produto comercializado pelas indústrias de processamento da fruta”.
Ele revela que, “como se relaciona diretamente com o rendimento do suco, é fundamental, portanto, que essa característica seja perfeitamente quantificada”.
Nunes complementa que “às vezes, um fruto extremamente bonito tem pouca polpa, por isso, é muito importante para o programa de melhoramento saber se determinado genótipo tem alto rendimento de suco”, salienta.
Modelo de predição
Para acelerar o processo e aumentar a quantidade de frutos analisados, Nunes e sua equipe da Embrapa criaram um modelo matemático que facilita o processo e antecipa a seleção de genótipos superiores.
“No método convencional, a avaliação da quantidade de polpa inclui a retirada da mucilagem (polpa mais sementes), seguida de coagem e posterior pesagem da polpa sem sementes. Essa metodologia de avaliação é complexa, exige muito tempo, além de sofrer muita influência do operador, podendo levar a erros de mensuração”, avalia.
Em sua opinião, o uso do novo modelo de predição aumenta a precisão (cerca de 95% de acurácia) e a quantidade de frutos apreciados por dia, de 20 para 150.
“Teste 15 pensando em explorar os caracteres do fruto que são mensurados no processo de caracterização de acessos do BAG maracujá e, dessa, duas se destacaram no que se refere ao peso e comprimento do fruto, peso e espessura da casca e peso e volume da polpa com semente”, expõe.
Nunes ressalta que, “com o uso do modelo de predição, hoje não é preciso perder tempo retirando a polpa com sementes dos frutos, peneirar e pesar a polpa sem sementes. O método matemático estima, com precisão, o rendimento de suco com base nesses atributos”.
Protótipo acelera processo de caracterização
Ele anuncia também que a equipe da Embrapa Mandioca e Fruticultura trabalha na elaboração de um protótipo que vai acelerar o processo de caracterização.
“Nossa ideia com este protótipo, que deve estar pronto no próximo ano, é ousar ainda mais. Vamos colocar o fruto em um equipamento e, sem abri-lo, ter a estimativa de todos os caracteres que são avaliados nos genótipos do BAG como no melhoramento genético do maracujazeiro”, divulga.
A intenção da equipe é reunir todas as informações e incorporá-las ao projeto para que possam utilizá-lo numa escala mais rápida dentro do processo de caracterização e aceleração dos programas de melhoramento de maracujá”, conta Nunes.
Determinação de cor
A extração exata da cor das diversas partes da planta é outro objetivo, de acordo com o especialista. “Os caracteres relacionados às cores são os mais elegíveis, sujeitos a erros”, frisa.
Nunes informa que as classes da lista de descritores de Passiflora não abrangem todas as variações existentes e a intensidade da cor.
Outro problema, segundo ele, é que esse tipo de avaliação é muito influenciado pela percepção de cada avaliador, mesmo se considerado como paletas de cores.
“Por isso, alguns programas e aplicativos de imagens (já existentes no mercado) vêm sendo utilizados por programas de melhoramento, mas essa foi a primeira vez em que foram empregados em um programa com a cultura do maracujazeiro para experiência da cor nos diferentes órgãos da planta no processo de fenotipagem de acessos”, divulga.
Para o pesquisador da Embrapa, entre os vários descritores que existem no processo de caracterização, a percepção de cor é o mais crítico, pois é muito subjetivo. “Um avaliador pode enxergar um avermelhado e, outro, alaranjado”, diz.
De acordo com Nunes, os dados chegavam com uma divergência considerável e cada avaliador atribuía uma nota diferente.
“Existe em laboratório o colorímetro de bancada, que consegue estimar essa cor com grande precisão. Mas como levar esse equipamento para fazer avaliação no campo? Então, buscamos sites e aplicativos de uso livre que puderam ser utilizados no processo de caracterização de recursos genéticos de forma a agregar informações menos subjetivas, ou seja, sem a influência da percepção individual”, revela o pesquisador.
Aplicativos e sites para definição de cor
Ele afirma que há várias opções de sites e aplicativos gratuitos (Android e IOS) para definição de cor.
“O site utilizado no trabalho em questão foi o Color Codes, que traz a representação RGB (iniciais de vermelho, verde e azul em inglês) em que a cor é definida com base em um sistema numérico hexadecimal (HEX), universalmente compreendido e aceito. Já o aplicativo utilizado foi o Color Grab, para identificação dos códigos HEX das mesmas imagens observadas no Color Codes. Com a foto (tirada seguindo critérios científicos), utilizando tanto o site quanto o aplicativo, obtém-se um código hexadecimal, que representa aquela cor observada; além disso, o aplicativo exibe vários parâmetros úteis que podem ser utilizados na pesquisa científica”, orienta o especialista da Embrapa.
“Substituímos a paleta, aquele livrinho que traz a descrição de cores, pelo aplicativo. Imagina você ir para o campo com o livrinho e fazer isso em um universo de mil plantas? Além de perder muito tempo, é subjetivo. Sempre vai ter dúvida de qual cor da paleta usar para a característica em questão. Com o aplicativo, não. Você clica na imagem e automaticamente ele detecta a cor exata e fornece o código preciso”, detalha Nunes.
Avaliação de genótipos
Segundo Nunes, foram avaliados 132 genótipos de Passiflora do Banco Ativo de Germoplasma (BAG) de Maracujazeiro da Embrapa Mandioca e Fruticultura, que, “a partir daí, há uma compreensão de possibilidades de exploração para o melhoramento genético”.
O pesquisador destaca ainda que “além do uso para elaboração de pranchas descritivas (a identidade dos acessos de um banco de germoplasma), as informações podem ser utilizadas para diversas barbatanas, como identificação varietal, agrupamento de genótipos com características de cores de frutos semelhantes ou associação de atributos da casca com características organoléticas (que podem ser percebidas pelos sentidos humanos) do fruto”.
E completa: “Por exemplo, quero identificar materiais com a cor da casca X. Insiro [o dado] no computador e o programa vai apontar que os genótipos que têm cascas mais próximos da função da cor X são tais. Com base nesse aplicativo, agrupamos todos os materiais que têm a cor muito próximos”, ensina.
Pé no futuro
Nunes enfatiza que a intenção é introduzir, cada vez mais, as tecnologias disponíveis nas rotinas do programa de melhoramento.
“Por que estamos com o pé no passado se podemos estar no futuro? Precisamos inovar sempre no processo de caracterização de recursos genéticos”, acredita.
Ele afirma ainda: “Conseguimos mudar bastante o processo de caracterização do BAG de Maracujazeiro utilizando aplicativos e vamos transformar muito mais. Hoje, por exemplo, não nos preocupamos mais com a avaliação de cor e já aceleramos na tentativa de rendimento de polpa sem sementes. Ganhamos tempo para fazer outras coisas”, comemora o pesquisador.
Saúde e bem-estar
Eliseth Viana, pesquisadora da área de Ciência de Tecnologia de Alimentos da Embrapa Mandioca e Fruticultura complementa que “os núcleos dos alimentos são excelentes indicativos da presença dos compostos bioativos, responsáveis por promover a saúde, aumentar o bem-estar e reduzir a incidência das doenças crônicas não transmissíveis, como as cardiovasculares, respiratórias, hipertensão, câncer, diabetes e doenças metabólicas”.
De acordo com a especialista, as cores também são responsáveis pela maior aceitação dos alimentos pelos consumidores, tornando-os mais atrativos.
Ela cita como exemplo que o maracujá possui diversos compostos coloridos na casca e na polpa, com propriedades excelentes à saúde.
“Os carotenoides são precursores da vitamina A e conferem cores variando de amarelo, laranja e vermelho e envelhecem no bom funcionamento do organismo, na proteção contra doenças cardíacas e alguns tipos de câncer, além de auxiliar na saúde da visão e da pele”, afirma.
Eliseth ensina que algumas variedades de maracujá possuem uma casca roxa devido à presença das antocianinas, pertencentes ao grupo dos flavonoides, “que funcionaram para retardar o envelhecimento das células, preservar a memória, fortalecer os músculos, neutralizar substâncias cancerígenas e prevenir a diabetes”, destaca a pesquisadora.
Brasil, maior produtor mundial
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística-IBGE, a produção de maracujá no País é de, aproximadamente, 683 mil toneladas, cultivadas em 44 mil hectares. Esse dado torna o Brasil o maior produtor mundial e consumidor de maracujá fresco e processado.
O pesquisador da Embrapa Onildo Nunes detalha que o maracujazeiro pertence ao gênero Passiflora L., considerado o maior da família Passifloraceae e tem cerca de 500 espécies.
“Além disso, apresenta ampla diversidade genética para caracteres morfológicos de flores, ramos, folhas e frutos”, informa.
Do ponto de vista comercial, em sua opinião, as duas espécies mais importantes são a Passiflora edulis Sims (maracujazeiro amarelo ou azedo) e P. edulis Sims f. edulis (maracujazeiro roxo puro).