A planta nativa Paspalum regnellii mostrou ter mecanismos de defesa à cigarrinha-das-pastagens, praga que danifica as raízes e folhas das plantas e causa prejuízos de bilhões de dólares ao agronegócio brasileiro
Uma planta forrageira nativa do Brasil, a Paspalum regnellii, apresenta um mecanismo de defesa natural contra a cigarrinha-das-pastagens (Mahanarva spectabilis). A descoberta foi feita por cientistas brasileiros diante dos severos danos causados por essa praga aos pastos tropicais, com prejuízos de bilhões de dólares ao agronegócio brasileiro.
Bianca Vigna, pesquisadora da Embrapa Pecuária Sudeste, (SP) e uma das autoras do trabalho, explica que os estudos foram aprofundados para entender o que está por trás dessa resistência e descobriram que existem dois genótipos da planta (BGP 248 e BGP 344) capazes de ativar diferentes formas de enfrentar essa ameaça.
“Essa descoberta abre caminho para novos estudos de melhoramento genético voltados à sustentabilidade agrícola”, destaca.
Segundo Bianca, a pesquisa utilizou experimentos de sobrevivência de ninfas de cigarrinha-das-pastagens, da análise do transcriptoma das raízes de plantas infestadas com o inseto e da anatomia radicular para entender as estratégias de defesa da planta envolvidas contra o inseto.

A cigarrinha é um dos principais desafios para a produção de pastagens Foto Fabrícia Torres /Embrapa Pecuária Sudeste/Divulgação
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Redução de danos
A pesquisadora conta que existem plantas resistentes a cigarrinhas-das-pastagens tradicionais, que geralmente pertencem aos gêneros Deois e Notozulia, mas as cigarrinhas do gênero Mahanarva infestam vários tipos de gramíneas de grande porte, como milho e cana-de-açúcar, e a Mahanarva spectabilis tornou-se praga das pastagens nos últimos anos.
“Assim, há grande interesse em encontrar alternativas para reduzir os danos causados por essa cigarrinha, especificamente”, ressalta.
Na avaliação da especialista, a cigarrinha é um dos principais desafios para a produção de pastagens, e compreender como as plantas reagem a esse tipo de ataque pode ser a chave para o desenvolvimento de cultivares mais resistentes.

Espécies nativas como a Paspalum regnellii, são mais resistentes às cigarrinhas-das-pastagens do que outras forrageiras Foto Marcos Gusmão /Embrapa Pecuária Sudeste/Divulgação
Novas estratégias de melhoramento genético
Bianca ressalta que os resultados mostram que o genótipo BGP 344, em particular, tem uma resposta mais rápida, com maior taxa de mortalidade das ninfas da cigarrinha nos primeiros 21 dias de ataque. “Este genótipo apresentou maior lignificação das raízes, criando barreiras físicas que dificultam a alimentação dos insetos, além de ativar vias metabólicas ligadas à produção de compostos defensivos. O BGP 248, embora também resistente, apresentou uma resposta mais lenta, sugerindo diferentes estratégias de defesa entre os dois materiais”, explica.
O Brasil é um dos maiores produtores de carne bovina do mundo e, por esse motivo, a melhoria das pastagens é fundamental para garantir a sustentabilidade do setor. As descobertas deste estudo abrem caminho para novas estratégias de melhoramento genético que podem trazer benefícios significativos para o agronegócio e o meio ambiente.
A pesquisadora da Embrapa destaca ainda que o controle químico desses insetos é inviável, pelos pontos de vista ecológico e econômico, devido à grande extensão de área das pastagens no país. “Assim, um dos métodos mais eficazes de manejo é o desenvolvimento de plantas mais adaptadas às adversidades”, avalia.

A cigarrinha-das-pastagens causa com prejuízos de bilhões de dólares ao agronegócio brasileiro Foto Fabrícia Torres /Embrapa Pecuária Sudeste/Divulgação
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Benefícios das espécies nativas
O pesquisador Marcos Gusmão acrescenta que espécies nativas, como o Paspalum regnellii, são mais resistentes às cigarrinhas-das-pastagens do que outras forrageiras.
“Além disso, é uma planta com boa produção de biomassa e alto potencial forrageiro. A Embrapa Pecuária Sudeste mantém um Banco de Germoplasma de Paspalum, o que é a base para o desenvolvimento de um programa de melhoramento genético”, reforça.
Ele enfatiza que, em geral, as espécies de Paspalum são mais resistentes à infestação dessas pragas, mas não é uma cultura forrageira expressiva nas áreas tropicais onde ocorrem as cigarrinhas-das-pastagens.

A Mahanarva spectabilis danifica as raízes e folhas das plantas e tornou-se praga das pastagens nos últimos anos.
Melhoramento genético
De acordo com Bianca, a Paspalum regnellii tem sido utilizada como genitora em cruzamentos para a obtenção de híbridos.
“A ideia não é lançar esse material, mas sim inseri-lo como genitor em cruzamentos com outros materiais de interesse para obter plantas mais produtivas, de melhor qualidade nutricional e resistentes à cigarrinha Mahanarva”, observa.
Ainda de acordo com a pesquisadora, a escolha da espécie para o estudo se deu pelo seu importante papel no melhoramento genético de Paspalum para forragem e sua resistência natural, permitindo a compreensão dos mecanismos envolvidos na defesa contra essa praga.
“A pesquisa visa ainda buscar possíveis genes que sejam chaves nessa resistência para poder trabalhar com ferramentas de biotecnologia no melhoramento, como edição gênica, tanto de Paspalum, como de outras gramíneas forrageiras”, reforça Bianca.
Atualmente, o grupo de pesquisa está aprofundando o entendimento desses mecanismos com o estudo dos micro RNAs envolvidos no processo de resistência do BGP 344, consolidando a parceria com a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) nessa linha de pesquisa, no âmbito do Centro de Melhoramento Molecular de Plantas.
Fonte: Embrapa Pecuária Sudeste
Foto abertura: Cigarrinha-das-pastagens. Foto Fabrícia Torres/Embrapa Pecuária Sudeste/Divulgação