Produto inédito no País, novo jeans tem como fonte principal de matéria-prima a cultivar de algodão colorido BRS Rubi, que será utilizada na confecção do denim, tecido usado na fabricação dessa peça do vestuário
A fabricação de uma calça jeans tradicional gasta entre quatro mil e 11 mil litros de água em toda a cadeia, que vai da irrigação ao beneficiamento e acabamento final do produto. Agora, cientistas da Unidade Algodão da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e parceiros criaram, com o uso da biotecnologia, essa mesma peça de vestuário fabricada com algodão colorido, que não é irrigado e não necessita de tingimento. Por essa razão, ele consome menos água em comparação ao tradicional índigo blue.
Produto inédito no Brasil, para sua confecção será utilizada a cultivar BRS Rubi, desenvolvida pela estatal e que servirá de matéria-prima para produzir o denim, tecido usado na fabricação do jeans convencional.
O lançamento foi realizado no dia 16 de novembro, em São Paulo, durante a Semana de Moda Sustentável Brasil Eco Fashion Week. O novo jeans foi idealizado pela empresa paraibana Natural Cotton Color, em conjunto com a Embrapa e o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), por meio de um edital de inovação de 2016.
Presidente da Natural Cotton Color, Francisca Vieira conta que o jeans de algodão colorido teve uma ótima aceitação na França, durante a realização da principal feira do mundo têxtil, que apresenta as mas relevantes tendências em tecidos.
“Se o nosso denim tiver a aceitação no mercado, assim como teve na Première Vision Paris, será uma revolução na indústria do jeans, até porque ele não é azul e não deixa rastros de tinta em lugar nenhum”, diz a executiva.
Mercado de luxo
Idealizadora do jeans de algodão colorido, a empresária aposta no mercado de luxo para o novo produto.
“Busco marcas que tenham alto valor agregado, que possam dar continuidade ao nosso trabalho sem mandar costurar as peças em países com trabalho escravo e mão de obra infantil. Não queremos ver nosso denim em prateleiras de lojas que pagam centavos de dólares pela costura”, ressalta ela.
Francisca já entrou com pedido de patente do produto no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). “Estamos procurando uma marca que queira fazer parceria para a produção do primeiro lote de mil quilos, ou seja, aproximadamente dois mil metros de denim”, revela.
No Instituto Senai de Tecnologia Têxtil e Confecção, na Paraíba, foram criados os fios têxteis, as malhas e, por fim, o denim de algodão colorido.
“A fibra do algodão colorido é um pouco mais curta que a do branco, mas como para o denim nós utilizamos um tecido mais grosso, o tamanho da fibra não foi problema na fabricação do produto”, conta Luís Sávio Pinheiro, gerente de tecnologia do Instituto.
Também foram desenvolvidos, além do denim, novos materiais como um elastano biodegradável e um tecido que mistura algodão colorido com seda natural.
Tendência
Socioeconomista da Embrapa Algodão (PB), Gilvan Ramos avalia que, com o novo jeans, a demanda e a produção de algodão naturalmente colorido tendem a crescer.
“O Estado da Paraíba ainda produz muito pouco – são 293 hectares plantados em 2019 e 391 toneladas colhidas de algodão em rama. Isso representa apenas 140 toneladas de pluma pronta para a fiação”, avalia.
Atualmente, a China e os Estados Unidos são os maiores produtores de algodão colorido, com mais de cem mil hectares plantados. Segundo um estudo realizado em 2017, pelo Instituto de Pesquisa de Cultivos Industriais, da Academia de Ciências Agrícolas de Xinjiang, na China, a perspectiva é que haja um crescimento gradual da demanda pelo algodão naturalmente colorido.
O documento prevê que, em 2036, ele representará cerca de 30% da produção mundial de algodão, o que equivale a seis milhões de toneladas de pluma naturalmente colorida por ano.
“O grande limitador dessa tecnologia é o leque de cores, no qual prevalecem as terrosas, que não permitem maiores movimentos na moda, mas a possibilidade de novas cores via biotecnologia pode aumentar ainda mais esse percentual”, comenta Ramos.
A parceria
A concepção do denim começou a partir de encontros do Comitê Gestor do Arranjo Produtivo Local de Confecções e Artefatos de Algodão Colorido do Estado da Paraíba, que integra empresários, produtores e suas organizações e instituições de apoio. Criado em 2011, esse grupo tem como objetivo articular todos os elos envolvidos na cadeia produtiva da pluma.
De acordo com a Embrapa Algodão, um dos seus resultados mais importantes foi a garantia de compra da produção do algodão colorido, que deu segurança ao cotonicultor para realizar o plantio e alimentar a cadeia produtiva paraibana, que envolve tecelagens, confecções e empresas de moda e decoração.
O Comitê é formado pela Embrapa, Associação Brasileira da Indústria Têxtil e Confecção (Abit), Federação das Indústrias do Estado da Paraíba (Fiep), Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex), Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), bancos públicos e privados, governo da Paraíba, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
Cores novas
Pesquisador da Embrapa e responsável pelo desenvolvimento das variedades de algodão colorido, o agrônomo Luiz Paulo Carvalho revela que está próximo de chegar a tons de rosa e laranja.
“Temos linhagens em campo que estão se mostrando promissoras quanto às cores. Mas ainda vamos melhorar outras características antes que fiquem prontas para lançamento”, comenta o especialista, que é mestre e doutor em em Genética e Melhoramento. Carvalho estima que essa etapa deva levar algo em torno de dois anos para ser concluída.
Assim como a BRS Rubi, cultivar que será usada na fabricação do novo jeans, a Embrapa já lançou outras cinco variedades de algodão colorido, em tonalidades que vão do verde-claro aos marrons claro, escuro e avermelhado. São elas: BRS 200 Marrom, BRS Rubi, BRS Topázio, BRS Safira e BRS Jade.
Em busca do algodão azul
Em paralelo a esse recente trabalho, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária e instituições de pesquisa de outros 19 países, a exemplo dos Estados Unidos e Austrália, seguem na busca pela obtenção do algodão colorido azul, por meio da biotecnologia, o chamado gene for jeans”(gene para jeans).
“Como não existem plantas de algodão colorido azuis na natureza, esse processo não pode ser obtido por melhoramento genético convencional como é o caso das nossas cultivares”, explica Carvalho.
De acordo com o pesquisador, o algodão azul seria uma grande contribuição da ciência para o mundo da moda, pois reduziria significativamente o uso de tinta na indústria têxtil.
“Isso sem dúvida seria um grande avanço, pois o mundo inteiro fabrica jeans e se gasta muita tinta e água para a produção do tecido”, afirma.
Fonte: Embrapa Algodão