Descobertas por cientistas da Inglaterra, uma das novidades utiliza a planta camelina na produção de substâncias químicas úteis para a indústria
Cientistas do centro de pesquisa de Rothamsted (Inglaterra) desenvolveram uma planta para produzir uma série de produtos químicos vitais usados na fabricação de itens comuns do dia a dia, a maioria dos quais geralmente é obtida a partir de combustíveis fósseis. Por sua vez, na Universidade de Oxford (Inglaterra), os pesquisadores abasteceram de energia um microprocessador, por um ano inteiro, usando apenas algas, luz e água, de acordo com um estudo publicado na revista Energy & Environmental Science.
As informações do engenheiro agrônomo Décio Luiz Gazzoni, pesquisador da Embrapa Soja e membro do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS), mostram apenas dois exemplos de alternativas renováveis ao uso de combustíveis fósseis
Segundo o pesquisador, a novidade descoberta por cientistas na Inglaterra refere-se a um grupo de moléculas chamadas 4-VPs (vinilfenóis), amplamente utilizadas na fabricação de produtos como alimentos e maquiagem, mas que inclui até um plástico usado em telas de televisão LED e telefones celulares.
“Os pesquisadores modificaram o código genético da camelina (Camelina sativa), propiciando a produção de substâncias químicas úteis para a indústria. Isso redirecionou as vias metabólicas usuais da planta, de modo que, em vez de produzir sinapina a partir do ácido hidroxicinâmico, elas produziram as moléculas de 4-VP”, explica.
Gazzoni afirma que as novas variedades de camelina já foram testadas com sucesso no campo, um passo vital para produzir o volume de produtos químicos necessários para os fabricantes. Detalhes da pesquisa podem ser acompanhados em http://bitly.ws/rGQh.
“As moléculas de 4-VP têm uma ampla gama de aplicações na indústria, sendo a maioria deles compostos de sabor e aroma comumente usados para produtos alimentícios e cosméticos. Um deles, o 4-vinil guaiacol tem sabor e aroma de cravo, enquanto o 4-vinilsiringol, também conhecido como canolol, pode ser usado como conservante de alimentos”, detalha.
Já o 4-vinilfenol é usado para fazer PVP, ou polivinilfenol, um plástico que é parte integrante da maioria das telas de LCD modernas. “Essas telas TFT (transistor de filme fino) exibem imagens mais nítidas e brilhantes e processam o movimento de forma mais suave do que as telas LCD padrão. Ou seja, compõem uma cadeia que terá muita demanda no futuro, e que pode muito se beneficiar da química verde”, esclarece o membro do CCAS.
Biousina elétrica
Por sua vez, o sistema desenvolvido por cientistas da Universidade de Oxford tem potencial para ser uma fonte de energia para pequenos dispositivos, usando uma alga não tóxica do gênero Synechocystis, que coleta energia do sol por meio da fotossíntese. A corrente elétrica gerada pode interagir com um eletrodo de alumínio, que é então usado para alimentar um microprocessador. Detalhes podem ser acompanhados em http://bitly.ws/r2Nt.
“Como o sistema usa apenas materiais comuns e baratos, ele pode ser replicado milhares de vezes para alimentar pequenos dispositivos como parte da Internet das Coisas (IoT, na sigla em inglês)”, analisa o pesquisador, explicando que a IoT é uma rede crescente de dispositivos eletrônicos com sensores, softwares e capacidade de processamento, que se conectam a outros dispositivos pela Internet.
De acordo com Gazzoni, osso inclui, por exemplo, telefones celulares, smartwatches e até sensores de temperatura em centrais elétricas, mas já está presente em geladeiras, panelas inteligentes, aquecimento central, ar-condicionado, cortinas de janelas, aparelhos de som, veículos e outros aparelhos e equipamentos.
Já existem dezenas de milhões desses dispositivos operando no mundo. “Com o advento do 5G e futuras gerações de conectividade, com larguras de banda hoje inacreditáveis, espera-se que o número cresça para um trilhão até 2035, e muitos deles precisarão de uma fonte de energia leve, barata e sustentável”, prevê.
O pesquisador da Embrapa afirma que embora possa ser usado em qualquer dispositivo estacionário, os autores do estudo apontam que essa abordagem pode ser fundamental em locais remotos ou fora do grid de eletricidade, onde mesmo pequenas quantidades de energia podem ser muito benéficas.
“No estudo em tela, o dispositivo acionou um Arm Cortex M0+, um microprocessador muito comum na IoT, que funciona em ambiente doméstico ou externo, com luz natural, mesmo quando sujeito a variações de temperatura O dispositivo é do tamanho de uma pilha AA e foi construído com materiais comuns, baratos e amplamente recicláveis”, descreve. “O sistema funcionou por um longo período de tempo, com a mesma confiabilidade.”
O membro do CCAS lembra que as algas não precisam de alimentação porque podem produzir seu próprio alimento por meio da fotossíntese. “Para gáudio dos pesquisadores, eles verificaram que o dispositivo continuou a operar no escuro, mesmo que as algas cessem a fotossíntese. A explicação é que isso ocorre porque as algas processam seus alimentos quando não há luz e continuam a gerar uma corrente elétrica”, assinala Gazzoni.
Essa descoberta pode ser uma alternativa às baterias de lítio. Alimentar trilhões de dispositivos com baterias de lítio será praticamente impossível: os fabricantes precisariam de três vezes mais lítio do que o produzido atualmente em todo o mundo. Além disso, os dispositivos fotovoltaicos usam materiais perigosos com efeitos ambientais adversos, o que significa que não são uma opção definitiva. Essa é a vantagem competitiva de produzir energia a partir das algas.