Análise das fezes orienta produtores a evitar desnutrição e superpastejo, mantendo o bem-estar animal
A micro-histologia fecal, usada para comparar as amostras de fezes de ovinos com as de plantas da pastagem local, tem contribuído para a identificação mais precisa das espécies selecionadas e consumidas por ovinos em sistemas extensivos. A técnica utiliza lâminas com as amostras para análise via microscópio, resultando em informações mais amplas sobre a identificação de espécies pastejadas.
Também orienta decisões dos criadores sobre manejo de pastagens para evitar problemas como deficiência de nutrientes e superpastejo (concentração de animais em uma área acima da capacidade permitida), o que aumenta a eficiência da nutrição dos rebanhos.
Pesquisa coordenada pela Embrapa Caprinos e Ovinos (CE), em área experimental na Fazenda Lagoa Seca, em Cariré (CE), analisou amostras locais por três anos e identificou as espécies que compõem cerca de 70% da dieta dos animais, em condições extensivas, onde saem para pastejar durante o dia e que espécies selecionam para se alimentar.
A região observada faz parte da área da chamada Depressão Sertaneja, correspondente a 38,5% da caatinga brasileira, servindo de referência a territórios de grande produção de ovinos no Semiárido brasileiro, como o Sertão dos Inhamuns (CE).
Segundo o pesquisador da Embrapa Marcos Cláudio Pinheiro Rogério, que liderou a equipe da pesquisa, trabalho desenvolvido no Ceará pode ser extrapolado para outros Estados da região nordestina.
“Conforme o zoneamento agroecológico do Nordeste brasileiro, esse tipo de região é similar no Semiárido brasileiro em termos de caracterização botânica. Pela identificação das espécies vegetais presentes em áreas da Depressão Sertaneja, é possível utilizar os dados da pesquisa para prever a oferta de nutrientes aos ovinos”, afirma Rogério.
Forrageiras
A pesquisa observou o consumo de 22 diferentes espécies de plantas forrageiras e identificou nove “espécies-chave” que compõem 70% da dieta dos ovinos, em função do valor nutritivo e da palatabilidade pelos animais.
Fazem parte dessa lista as seguintes espécies: estilosantes, barba-de-bode, grama-seda e grama-touceira, no período seco; ervanço, cabeça branca, sabiá e, novamente, a barba-de-bode, no período de transição; capim-panasco, marmeleiro e, novamente, sabiá, no período seco do ano.
A principal base alimentar dos ovinos na caatinga é a pastagem nativa ou natural, que pode compor até 90% do consumo dos animais, esse tipo de informação é importante para permitir o planejamento e uso das áreas de uma propriedade rural, conforme a oferta de nutrientes, e contribui para a sustentabilidade dos sistemas de produção.
Planejamento
A micro-histologia fecal permite obter outras informações importantes, como saber quais partes das plantas foram consumidas e a avaliação do pastejo mesmo que outras espécies animais estejam na área, pois a identificação é feita a partir das fezes de cada espécie animal. Tais vantagens fazem que os resultados obtidos a partir do uso da técnica possam orientar o planejamento alimentar e as tomadas de decisão pelos produtores rurais.
Conforme o pesquisador, em avaliações realizadas com ovinos sob pastejo na caatinga em propriedade rural parceira da Embrapa, por cerca de três anos, foi possível identificar que os ovinos consomem nove espécies principais, considerando os períodos chuvoso de transição chuvas-seca e seco.
“Assim, por modelagem matemática, fica mais fácil predizer qual consumo de nutrientes pode ocorrer em uma determinada área a partir da observação das espécies presentes. É possível, inclusive, predizer o tipo de suplemento (em termos de nutrientes adicionais) que deve ser fornecido aos animais em cada área de pastejo na Caatinga”, ressalta Rogério.
Outras espécies
A técnica da micro-histologia fecal usada para as pesquisas com nutrição de ovinos já é adaptada a partir da experiência a outras espécies animais. Inicialmente foi implantada pelo pesquisador Rodiney Mauro, atualmente na Embrapa Gado de Corte (MS), que trabalhava com dieta de capivaras.
“Para esse trabalho foi montada uma coleção de referência das principais forrageiras consumidas por essa espécie que serviu de base para ampliar o seu uso para outros animais domésticos (bovinos, cavalos e ovinos)”, lembra a pesquisadora Sandra Santos, da Embrapa Pantanal (MS).
Conforme Sandra, que colaborou com a equipe da Embrapa Caprinos e Ovinos para a adaptação da técnica à pesquisa com espécies ovinas no Semiárido brasileiro, no Pantanal, essa técnica já foi utilizada para a identificação da dieta de diversos animais domésticos como bovinos, equinos, ovinos e bubalinos. Também foi usada na análise da dieta de animais silvestres, como porco monteiro, cateto e queixada, tatu, ema, veado-campeiro, capivara, cervo, felinos, iguana, entre outros.
Os resultados de uso da micro-histologia fecal para diferentes espécies, em pesquisas da Embrapa Pantanal e parceiros, possibilitaram a formação do banco de dados Delta Diet. Trata-se de um guia prático ilustrado para identificação da dieta de animais, com programa que pode ser descompactado e instalado em qualquer computador.