Para se defender, as meloponíneas atacam os invasores, se escondem ou protegem os ninhos
Engana-se quem pensa que as meloponíneas – chamadas de abelhas sem ferrão, ou ASF – são inofensivas, incapazes de se defender. Segundo Décio Luiz Gazzoni, engenheiro agrônomo, pesquisador da Embrapa e membro do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS), uma das defesas desses insetos é “morder” o intruso, prendendo-se a ele, e o indivíduo até morre para proteger a colônia.
Um estudo realizado por pesquisadores da University of Sussex, do Reino Unido, em colaboração com colegas da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) e da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) – ambas da Universidade de São Paulo (USP) –, mostrou que, apesar de serem incapazes de ferroar como as abelhas da espécie Apis mellifera (a abelha africanizada), por terem o ferrão atrofiado, as abelhas sem ferrão apresentam diferentes mecanismos de defesa (http://bitly.ws/smu9).
“Na espécie Trigona hyalinata, conhecida como guaxupé, as operárias chegam ao extremo de ter a cabeça separada do corpo, por não soltar a mandíbula, matando ou afugentando o predador ou saqueador. Morre, mas salva seus ninhos-colônias, onde estão o estoque de comida (mel e pólen), e a rainha que coloca os ovos para manter a colônia e as larvas que vão perpetuar a espécie”, explica.
A ferroada dói
De acordo com Gazzoni, a mordida delas dói menos que a ferroada de uma abelha africanizada, mas pode ser suficiente para defender a colônia, afastando o agressor. Os próprios pesquisadores se transformaram em cobaias, para medir o nível de dor causado pelo ataque de cada espécie de abelha sem ferrão.
“Para tanto, os pesquisadores colocaram seu próprio braço na entrada da colônia, provocando as abelhas, como se fossem um agressor. Classificaram a dor que sentiram entre 0 (pequena beliscada) e 5, uma mordida que causa uma dor desagradável, capaz de romper a pele se for persistente”, relata e acrescenta que eles verificaram que a mordida das abelhas do gênero Trigona é mais dolorida do que as outras espécies de abelhas sem ferrão. “Na lupa, verificaram que elas possuem mandíbulas serrilhadas, parecendo possuir cinco ‘dentes’ afiados.”
Gazzoni conta que os pesquisadores resolveram testar a persistência das abelhas em defender sua colônia, cujo limite é o suicídio. “Colocaram uma bandeira tremulando na entrada da colônia, aparentando um agressor. As abelhas ‘morderam’ a bandeira, prendendo-se a ela. Então, tiveram suas asas puxadas com pinças, para ver se largavam o agressor, ou se preferiam ficar sem as asas”, conta. “As operárias de seis espécies de abelhas sem ferrão mais agressivas demonstraram disposição de sofrer danos fatais e morrer, mas não soltavam a bandeira.”
Formas de proteção
Conforme explica o membro do CCAS, na natureza, as abelhas escolhem locais bem protegidos, dentro de ocos de árvores grossas, numa cavidade entre pedras, ou no alto de árvores, dificultando o acesso de predadores naturais como forídeos, formigas, lagartos, aranhas, pássaros, sapos, entre outros.
Porém, se o perigo for grande, as abelhas que percebem o risco – normalmente as guardiãs ou soldados – liberam substâncias voláteis, que alertam todos os demais membros da colônia. “Esse alerta ajuda a formar um grande ‘exército’, que se une para combater o invasor. Algumas espécies, como a jataí (Tetragonisca angustula) possuem uma guarda reforçada perto do ninho, o que inclui uma ‘força aérea’ de guardiãs que sobrevoam permanentemente a entrada do mesmo, para detectar qualquer perigo à colônia”, explica.
Cuidados com o ninho
Gazzoni menciona ainda que há espécies de abelhas que, à noite, fecham a entrada do ninho com uma espécie de tela, que permite o ingresso de ar, mas impede a entrada de predadores. A teia é construída com cerume, que é uma substância formada pela mistura de cera e resina, que foram coletadas de plantas.
“As abelhas vedam frestas no ninho com própolis, o que evita a entrada de predadores ou de microrganismos, como fungos ou bactérias. Algumas espécies de abelhas sem ferrão se defendem de invasores grudando bolinhas de própolis, em uma forma bem pegajosa, limitando os movimentos e podendo levar os agressores à morte”, esclarece.
O pesquisador lembra, ainda, que algumas espécies de abelhas sem ferrão possuem comportamento tímido e se escondem ao perceberem movimentação perto do ninho, com o objetivo de dificultar ao agressor a localização do mesmo.
“Já outras espécies se defendem atacando os invasores. Voam ao seu redor, enrolam-se nos pelos e cabelos, mordiscando com suas mandíbulas. Espécies de abelhas do gênero Oxytrigona, produzem uma substância cáustica nas glândulas mandibulares, que causam dor em contato com a superfície do corpo, podendo ocasionar queimaduras”, arremata.