Projeto incentiva jovens de zona rural do Acre a fabricarem peças artesanais a partir de restos de madeira florestal. A mais popular das peças é a gamela, uma espécie de vasilha de madeira. A iniciativa permite que os adolescentes possam obter renda por meio do trabalho e estudar sem sair da comunidade
Iniciativa da Secretaria de Meio Ambiente do Acre (Sema) incentiva artesãos a produzir peças de madeira com resíduos florestais, em especial as gamelas, por meio da profissionalização de 10 jovens da Associação Seringueira Porto Dias (ASPD), localizada em um assentamento agroextrativista na zona rural do município de Acrelândia.
O projeto deu tão certo que eles foram incluídos na Rede Nacional de Artesanato (Artesol). Na rede social da entidade, os jovens artesãos ganharam um perfil e podem receber convites para participarem de exposições, feiras, fóruns de aprendizagem e eventos. Também é uma forma deles manterem contato com consumidores, lojistas, estudantes, pesquisadores e interessados para parcerias futuras.
Daiane Nascimento, aluna que ajuda a coordenar o projeto, conta que nas plataformas digitais, as peças confeccionadas pelo grupo ganharam as graças de lojistas e consumidores. “Uma delas é a gamela, uma espécie de vasilha de madeira, de vários tamanhos, cores e formas”, explica Daiane, ressaltando a oportunidade de obter renda, sem sair da comunidade, por meio desse trabalho.
“Nós queremos viver na nossa comunidade, mas com dignidade. Queremos estudar, trabalhar e morar aqui. Eu não quero que esse projeto acabe, para um dia a gente mostrar que essa oportunidade não é só pra mim, mas para todos”, completa.
Economia de base florestal
Para a coordenadora do Núcleo de Manejo Florestal Madeireiro da Sema, Luciana Rôla, o projeto também ajuda a afastar os jovens de situações de vulnerabilidade, evitando a criminalidade, por exemplo, além de melhorar a autoestima.
“São diversas atividades desenvolvidas, entre elas a articulação e o apoio para capacitações técnicas das comunidades envolvidas, assessoria técnica e administrativa, desde a elaboração dos planos de gestão até a prestação de contas, articulação de pesquisas, participação em seminários, feiras, intercâmbios, além do apoio à diversificação da produção para sustentabilidade dos negócios”, frisa Luciana.
O projeto de assentamento Agroextrativista Porto Dias é uma das últimas áreas de florestas do município de Acrelândia, onde a economia de base florestal é uma das únicas fontes de renda para as famílias.
O secretário de Estado de Meio Ambiente, Israel Milani, explicou que a Sema desenvolve ações ligadas à subvenção econômica de organizações sociais, fomentando cadeias de valor de produtos florestais madeireiros, como o manejo florestal comunitário e produção de artefatos de madeira nas florestas públicas, projetos de assentamento e terras indígenas.
“Hoje temos cinco planos de gestão conveniados, a exemplo do projeto da ASPD, que apoiam as atividades florestais madeireiras no Estado, trazendo alternativa de geração de emprego e renda”, afirma.
Parceria com a Artesol
Dos resíduos do manejo florestal, as gamelas surgem com um toque especial, desenhadas pelas mãos dos jovens e repletas de significados. Foi em busca desses significados, impressos nas peças e vistos pelos olhos mais apurados, que o consultor Júlio Ledo foi enviado para conhecer a comunidade. Júlio foi até a ASPD para registrar oficialmente a inclusão do projeto na Artesol, uma rede nacional de artesanato.
A equipe da Sema articulou esse contato durante o 13º Salão do Artesanato Raízes Brasileiras realizado no mês de outubro de 2019, em São Paulo, e ofereceu condições para que o consultor chegasse até a zona rural de Acrelândia para acompanhar de perto o processo de produção das peças. Ao chegar na comunidade, Júlio ficou encantado com a história de vida dos jovens e realizou uma oficina motivacional com foco na valorização do produto, no caso as gamelas, e na divulgação do projeto nas redes sociais.
A fala de Júlio sobre as dificuldades que enfrentou até se tornar consultor da Artesol, contagiou os jovens. “As dificuldades existem e precisam ser vencidas. O trabalho deles é magnífico e possui um valor incalculável agregado, que é exatamente a história de vida de cada jovem da comunidade que acredita que é possível viver do artesanato”, comenta Júlio.
Na Rede Artesol, os artesãos ganharam um perfil na plataforma digital que é referência nacional e internacional sobre o artesanato brasileiro. Eles terão a possibilidade de receber convites para participar de exposições, feiras, fóruns de aprendizagem e eventos, além de estar em conexão direta com consumidores, lojistas, estudantes, pesquisadores, entre outros interessados para parcerias futuras.
A Artesol é uma organização sem fins lucrativos que atua há mais de 20 anos investindo na valorização e promoção do artesanato tradicional brasileiro, por meio de estratégias focadas na sustentabilidade ambiental, econômica, social e cultural das comunidades.
Educação à distância
Parece simples querer morar nas comunidades do interior do Acre, mas a realidade é que muitos jovens deixam suas casas em busca de oportunidades de trabalho e o acesso à educação formal. A Sema, junto com a comunidade, tem encontrado algumas alternativas para melhorar as condições de vida e de trabalho. No início de 2020 será realizada a reforma da sede da ASPD e os jovens poderão ter acesso a computador e internet.
“A internet e os computadores vão ser muito importantes pra gente poder estudar, fazer um curso superior e continuar morando aqui”, falou Daiane.
Para iniciar a formação dos jovens, a Artesol vai oferecer um curso gratuito, totalmente on-line, com técnicas de fotografia para Instagram, técnicas de vendas e precificação, além orientações sobre como lidar com clientes.
Reconhecimento
Como reconhecimento do trabalho realizado na ASPD, Daiane Nascimento, foi vencedora da categoria destaque jovem do prêmio Chico Mendes de Resistência em Defesa da Amazônia, uma iniciativa da sociedade civil e de movimentos socioambientais.