Estudo afirma que o Brasil precisa investir em pesquisa e desenvolvimento de suas espécies de árvores nativas para alavancar a restauração florestal e conseguir criar um novo modelo de ações que proteja as florestas, em especial a Amazônia, além de gerar emprego e renda aos produtores
O Brasil se comprometeu a restaurar 12 milhões de hectares de florestas até 2030 e agora busca entender quais são os gargalos que precisam ser superados para que a silvicultura com espécies nativas possa ser um caminho para dar escala aos projetos de restauração.
É o que mostra o relatório Research gaps and priorities in silviculture with native species in Brazil, publicado recentemente pelo World Resources Institute Brasil (WRI Brasil), instituição global de pesquisa para proteção do meio ambiente.
O estudo identificou que ainda há muitas lacunas de conhecimento técnico e científico para o plantio de árvores nativas, como por exemplo em sementes e mudas, melhoramento genético ou manejo. A partir dessas lacunas, os autores estimam, em uma análise de custo-benefício, quais seriam os benefícios econômicos se o Brasil investisse no setor de Pesquisa & Desenvolvimento (P&D).
Os resultados são promissores. O investimento necessário para que a silvicultura de nativas decole é relativamente baixo – cerca de 0,04% do investimento total brasileiro em pesquisa. Com esses recursos, e uma escala de plantio de dez mil hectares (uma quantidade pequena, ao considerar o território brasileiro), o estudo revela que a silvicultura de nativas traz retorno econômico. A análise de custo-benefício aponta que o retorno de investimento pode ser de 2,36 dólares para cada um dólar investido, em um período de 20 anos.
“O estudo mostra que há demanda por madeira tropical, e que a silvicultura com espécies nativas pode atender essa demanda com lucratividade, impulsionando a restauração. Mas para isso é necessário investir em P&D para desenvolver essas espécies”, diz Alan Batista, especialista de investimentos do WRI Brasil e um dos autores do estudo.
Proteger as florestas naturais
Além de ser uma atividade com potencial de retorno financeiro, a silvicultura de nativas traz benefícios ambientais claros, que vão desde a restauração de áreas degradas até a captura de carbono da atmosfera nas árvores, ajudando a controlar as mudanças climáticas.
“Plantar árvores em áreas hoje degradas, com o manejo adequado, vai permitir ao produtor rural produzir madeira de alta qualidade e valor econômico ao mesmo tempo que gera serviços ambientais, como proteção do solo e preservação das nascentes”, diz Miguel Calmon, diretor de Florestas do WRI Brasil e um dos autores do estudo.
Outra grande vantagem da silvicultura de nativas é a de aliviar a pressão sobre as florestas tropicais. Atualmente, estima-se que 50% da madeira comercializada no mundo e 70% na Amazônia são produzidas de forma ilegal, muitas vezes destruindo a floresta. Ao produzir madeira por meio do plantio de árvores nativas e do manejo florestal, o produtor estará colocando madeira legal e de qualidade no mercado, tirando um dos incentivos para se desmatar florestas naturais.
Pesquisa de espécies prioritárias
“O investimento em pesquisa e desenvolvimento de nativas não seria algo fora do comum – ele já existiu para as espécies exóticas. Nos últimos quarenta anos, as indústrias do pinus e eucalipto investem em melhorias de espécies para sua produção, gerando grandes resultados”, afirma o relatório.
Os autores do estudo sugerem que o mesmo pode ser feito para as nativas. Como a produção de madeira a partir de espécies nativas plantadas ainda tem dificuldade de competir no mercado, principalmente por conta da competição com a madeira ilegal tirada de florestas primárias, o estudo propõe a criação de uma Plataforma de Pesquisa & Desenvolvimento.
A ideia é que essa plataforma, que está sendo desenvolvida pela Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura e facilitada pelo WRI Brasil, possa captar recursos público ou privados, seja de governos, empresas ou doadores, para destiná-los a uma pesquisa ainda em fase pré-competitiva, suprindo lacunas de conhecimento no desenvolvimento das espécies.
Espécies nativas
O trabalho propõe que esses recursos sejam direcionados para as espécies nativas mais promissoras para a produção de madeira ou produtos não-madeireiros, e identificou 15 espécies da Amazônia e 15 da Mata Atlântica – sendo que algumas delas também ocorrem no Cerrado. São árvores como a araucária ou vinhático, na Mata Atlântica, e o paricá ou andiroba na Amazônia.
A pesquisa permitirá desenvolver melhor o conhecimento científico dessas espécies, permitindo uma melhor seleção de mudas e sementes, realizando técnicas de melhoramento genético ou desenvolvendo princípios de manejo ainda inexistentes para essas árvores brasileiras. Uma vez que esses gargalos sejam resolvidos e a produção de nativas esteja em condições de competir no mercado, a pesquisa passaria a ser desenvolvida pelas empresas do setor.
O estudo “Research gaps and priorities in silviculture with native species in Brazil” está disponível na integra, em inglês, e pode ser baixado no site wribrasil.org.br.
Sobre a publicação
O working paper Prioridades e Lacunas de Pesquisa & Desenvolvimento em Silvicultura de Espécies Nativas no Brasil(Research Gaps and Priorities in Sillviculture of Native Species in Brazil), de autoria de Alan Batista, Miguel Calmon, Samir Gonçalves Rolim, Fátima C. M. Piña-Rodrigues, Daniel Piotto, Miguel Luiz Menezes Freitas, Silvio Brienza Junior e Maria José Brito Zakia, pode ser baixado aqui.