Os gastos com fertilizantes representam de 30 a 40% dos custos variáveis de produção de grãos no Brasil. Neste cenário, práticas e recomendações que promovam o uso mais eficiente de nutrientes são estratégicas para garantir a competitividade do agricultor.
Dados de pesquisas recentes fornecem indicativos de que há oportunidades para racionalizar o uso de fertilizantes, com maior eficiência técnica e econômica. Para saber como essa racionalização é possível, A Lavoura entrevistou o pesquisador da Embrapa Milho e Sorgo Álvaro Vilela Resende. Confira, a seguir, as orientações do pesquisador sobre manejo de fertilidade do solo.
A Lavoura: O gasto com fertilizantes onera bastante o custo de produção de milho. Para racionalizar este uso e reduzir o gasto?
Álvaro Resende: É preciso conhecer a condição de fertilidade do solo para então se definir a quantidade de adubo a ser aplicada na lavoura. Infelizmente, grande parte dos agricultores faz essa definição de forma arbitrária, sem usar análise de solo ou outros critérios que devem ser considerados para a recomendação de fertilizantes de forma mais eficiente. Temos observado diversas situações de lavouras nas quais seria possível ajustar e mesmo reduzir a adubação, sem afetar a produtividade. Muitos agricultores têm utilizado adubações relativamente pesadas e em doses fixas, gerando excedentes que as culturas não utilizam e que vão se acumulando no solo ao longo do tempo. Por outro lado, é comum o descuido em relação ao manejo da acidez do solo. Aplicações insuficientes de calcário podem diminuir o potencial produtivo das lavouras, o que acaba contribuindo para a perda de eficiência no uso dos fertilizantes.
A Lavoura: De que maneira o sistema de produção adotado (sistema de plantio convencional ou sistema de plantio direto) interfere no manejo da fertilidade do solo?
Álvaro Resende: De modo geral, o sistema plantio direto permite a manutenção ou o aumento dos teores de matéria orgânica do solo. A matéria orgânica, além de atuar como fonte de nutrientes, contribui de forma muito expressiva para ampliar a capacidade de o solo armazenar os nutrientes adicionados via adubação.
Esses efeitos do plantio direto têm se mostrado ainda mais importantes para as lavouras na região do Cerrado, cujos solos são naturalmente menos férteis, com baixa capacidade de retenção de nutrientes e mais propensos à exaustão da matéria orgânica. Adicionalmente, a maior diversidade de espécies vegetais, requerida para se estabelecer esquemas de rotação de culturas no plantio direto, favorece muito os processos de ciclagem de nutrientes no solo. Assim, a condução da lavoura em plantio direto tem proporcionado significativa melhoria da fertilidade do solo, que, com o tempo, passa a apresentar maiores estoques e eficiência de ciclagem de nutrientes. Em função desses fatores, seria menor a necessidade de fertilizantes no plantio direto comparativamente aos sistemas de plantio convencional com revolvimento do solo e monocultura.
A Lavoura: Como pode ser analisada a fertilidade do solo para definir a adubação a ser feita?
Álvaro Resende: Os resultados da análise do solo constituem a base para se conhecer a lavoura, estabelecer ajustes e refinar o manejo da fertilidade. Contudo, muitos agricultores e mesmo os técnicos que lhes dão assistência nem sempre dão o devido valor às informações contidas num laudo de análise do solo. É importante ressaltar que essas informações acumuladas no decorrer de várias safras permitem entender como está evoluindo a fertilidade e fazer aprimoramentos, com intervenções mais efetivas para incrementar o potencial produtivo das lavouras. Ainda não é rotina nas fazendas se proceder à integração de informações associando o manejo de corretivos e fertilizantes, o estado de fertilidade obtido no solo e a resposta em produtividade das culturas ao longo do tempo.
A Lavoura: As recomendações oficiais de adubação têm sido seguidas pelos produtores e têm se mostrado adequadas atualmente?
Álvaro Resende: As adubações praticadas pelos agricultores que vêm obtendo maiores tetos de produtividade não condizem com o que está prescrito nos boletins oficiais de recomendação de corretivos e fertilizantes. É provável que estejam cometendo excessos. Por outro lado, os boletins oficiais precisam ser atualizados, considerando as especificidades decorrentes da adoção do plantio direto, das diferentes combinações de culturas e do elevado potencial produtivo de cultivares mais modernas. Esses aspectos são objeto de pesquisas em andamento na Embrapa e instituições parceiras.
A Lavoura: O nitrogênio é o nutriente que mais onera a produção de milho. Como seu uso pode ser mais eficiente?
Álvaro Resende: Na recomendação de adubação deve se levar em conta os principais fatores determinantes da necessidade de nitrogênio a ser aplicado para o milho: a expectativa de produtividade a ser alcançada, o teor de matéria orgânica no solo e as culturas antecessoras ao milho. Há oportunidades para refinamentos na prática de adubação nitrogenada, sobretudo quanto à consideração dos efeitos dos dois últimos fatores, os quais estão diretamente relacionados à adoção do plantio direto. Temos exemplos claros de que a sequência de culturas afeta a qualidade da matéria orgânica e os estoques de nitrogênio no solo. O caso típico é que o milho cultivado após soja ou outra leguminosa necessita de menos nitrogênio na forma de fertilizante. Também algumas áreas de integração lavoura-pecuária envolvendo soja, braquiária e milho têm proporcionado elevada produtividade com doses modestas de nitrogênio. Portanto, ganhos de eficiência e redução de custo no uso desse nutriente são possíveis em determinadas situações, mas requerem interpretações mais elaboradas e assistência técnica de qualidade.
A Lavoura: As correções de acidez de solo têm sido bem adotadas? Qual é a importância do uso de corretivos?
Álvaro Resende: A otimização do aproveitamento de fertilizantes NPK (nitrogênio, fósforo e potássio) pelas culturas depende de condições favoráveis ao crescimento e funcionamento das raízes. Condições apropriadas de pH e disponibilidade de cálcio e magnésio são obtidas mediante o uso de produtos corretivos da acidez do solo. Assim, aplicações de calcário e, eventualmente, gesso são requeridas periodicamente. Apesar de serem insumos baratos em comparação aos fertilizantes NPK, a necessidade de corretivos costuma ser relegada. Tem se verificado que mesmo lavouras consideradas tecnificadas podem, em determinados momentos, apresentar saturação por bases abaixo da ideal para as culturas de grãos. Além de restringir ganhos de produtividade, o uso insuficiente de corretivos acaba por diminuir a eficiência de uso do adubo NPK, redundando em pior desempenho econômico da propriedade.
A Lavoura: Quais são benefícios, além da redução de gastos do agricultor, de uma maior eficiência do uso de fertilizantes?
Álvaro Resende: O Brasil depende de importações maciças de fertilizantes. Ganhos globais de eficiência de seu uso na agricultura brasileira certamente resultarão em maior segurança estratégica para o País, incluindo o equilíbrio na balança comercial e o prolongamento da duração de nossas reservas minerais de fontes de nutrientes. Além disso, o nosso agricultor é cada vez mais pressionado em relação às questões ambientais associadas à exploração agrícola. Nesse aspecto, uma maior eficiência de uso de fertilizantes significa menor risco de contaminação ambiental por nutrientes. Se a adubação for dimensionada na medida do que é requerido/absorvido pela cultura, não há poluição.