Pesquisa da ESALQ mapeou o que ocorre com o Carbono no solo em diferentes cenários de uso da terra, variando desde a vegetação nativa até áreas de integração lavoura-pecuária
A mudança no uso e manejo da terra é um dos principais fatores que influenciam na emissão de gases do efeito estufa (GEE) no Brasil. A crescente busca por alternativas, visando à mitigação dessas emissões aliada ao sequestro de carbono no solo, são vias fundamentais para o setor agropecuário no país para produzir alimentos, fibras e biocombustíveis com sustentabilidade, sobretudo no aspecto ambiental. Em 2009, os governos federal e paulista estabeleceram metas para redução das emissões de GEE até o ano de 2020, mas o desafio agora está em encontrar estratégias tão ou mais eficientes do que as atuais, visando garantir o cumprimento dessas metas.
Nas últimas décadas, o setor agropecuário no País, especialmente nos biomas Amazônia e Cerrado, vem sofrendo profundas modificações, principalmente devido à conversão de ecossistemas nativos para pastagens e agricultura. “Esse crescimento horizontal do setor agropecuário vem acarretando problemas sérios no que se refere ao uso da terra. Na prática, desmatou-se e, depois de algum tempo, essa área tornou-se degradada e assim houve a necessidade de novos desmatamentos em outras terras. O principal resultado desse modelo é que hoje a mudança de uso da terra somada à agricultura representa cerca de 60% das emissões de GEE no Brasil”, revela João Luís Nunes Carvalho, engenheiro agrônomo autor da tese de doutorado “Dinâmica do carbono e fluxos de gases do efeito estufa em sistemas de integração lavoura-pecuária na Amazônia e no Cerrado”. A pesquisa, defendida no programa de pós-graduação em Solos e Nutrição de Plantas da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (USP/ESALQ), foi orientada pelo professor Carlos Clemente Cerri, do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA/USP), reconstruiu a história do uso da terra nos biomas Amazônia e Cerrado a partir da avaliação das cronossequências, enfocando áreas com vegetação nativa, pastagens, agricultura sob sistema de plantio direto (SPD) e integração lavoura-pecuária (ILP).
Plantio Direto
Segundo o pesquisador, a conversão de vegetação nativa para culturas agrícolas, mesmo em SPD, representou redução de Carbono no solo, mas a magnitude dessas perdas depende, entre outros fatores, do manejo do solo. “A conversão de áreas de cultivo convencional para o SPD significou um dos maiores avanços tecnológicos da agricultura brasileira nas últimas décadas. Dentre os diversos benefícios estão o aumento dos estoques de C do solo e a mitigação das emissões de GEE. Entretanto, em regiões de clima tropical, as condições climáticas, somada à sucessão de cultivos predominantes resultam em quantidade de palha insuficiente para conferir sustentabilidade ao sistema”, explica Carvalho. A implantação de SPD, em área anteriormente sob cultivo convencional, aumenta em média 0,5 tonelada de C por hectare ao ano, mas o pesquisador da ESALQ buscou comprovar que a conversão de áreas sob agricultura para ILP, ambas em SPD, poderia representar um aumento ainda mais significativo nos estoques de carbono do solo.
Integração lavoura-pecuária
No sistema ILP usa-se a terra o ano inteiro. Após a colheita da soja, por exemplo, o agricultor planta o milho, consorciado com braquiária. Assim que o milho é colhido, a braquiária já está pronta para o consumo pelos animais, justamente nos meses de seca, quando a maioria das pastagens apresenta pouca oferta de forragem e ainda material de baixa qualidade. Dessa forma, os animais permanecem por quatro meses nesse pasto de boa qualidade sob ILP. “E quando chega a hora do novo plantio, em outubro, retira-se o gado, o capim cresce um pouco, e em seguida aplica-se herbicidas e planta-se a nova cultura direto na palha da braquiária. Está assim caracterizada a verticalização da produção”, explica o autor da pesquisa, revelando que, a partir de uma demanda do setor produtivo, fora convidado a estudar o sistema ILP, que associa a produção de grãos à pecuária, buscando benefícios mútuos.
Esse sistema vem se mostrando uma tendência no país, mas sua massificação ainda é relativa, já que a sua adoção esbarra em questões culturais e financeiras. Em âmbito econômico, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) tem conduzido vários estudos que mostram que, no ILP, tanto a carne, quanto os grãos são produzidos com custos relativamente mais baixos na comparação com as técnicas convencionais. “A principal limitação é meramente cultural. O pecuarista não se abriu para a integração com as lavouras e o agricultor ainda não demonstra afinidade para trabalhar com o gado. Tecnicamente não existe limitação: o produto final é mais “limpo” e traz benefícios ambientais a custos menores”, comenta Carvalho. O trabalho, financiado pela Fundação de Amparo a Pesquisa no Estado de São Paulo (Fapesp), foi desenvolvido nos estados de Rondônia, Mato Grosso e Goiás. Foram coletadas amostras de solo e de GEE entre os anos de 2005 e 2010, com objetivo de calcular no laboratório os fluxos de GEE e taxas de sequestro de C do solo. Assim, o pesquisador mapeou o que ocorre com o carbono do solo em diferentes cenários de uso da terra, variando desde a vegetação nativa até áreas de integração lavoura-pecuária. “Nós já sabemos que, bem manejada, a pastagem acumula carbono no solo, mas quando associada aos sistemas de ILP não tínhamos os valores exatos”.
Resultados
O estudo verificou que a implantação de ILP em áreas anteriormente sob SPD, baseada no binômio soja-milho, exibiu aumentos no estoque de carbono do solo da ordem de 0,82 a 2,58 toneladas por hectare por ano. Para surpresa dos pesquisadores, a implantação dos sistemas de ILP resultou em taxas de acúmulo de C muitos superiores àquelas observadas após a conversão de cultivo convencional para SPD. Ou seja, a mitigação na emissão de GEE é um efeito direto do ILP e em grandes proporções.
No ILP, há uma soma dos benefícios do SPD, somada aos pontos positivos da pastagem e assim está formada a receita de elevação do C no solo e redução drástica de emissão de GEE. “Claro que a pesquisa precisa ser replicada até que essa tendência se confirme, até porque em alguns casos as taxas de acúmulo se mostraram bastante altas, mas mesmo o menor valor nesse estudo já é considerado extremamente positivo. A ILP se mostra, com esses dados, uma nova revolução verde, uma nova forma de se fazer agricultura e pecuária. Imaginávamos que a ILP seria um sistema eficiente sob o aspecto ambiental, e a pesquisa confirmou essa hipótese”, salienta o agrônomo. O pesquisador espera que o resultado de seu estudo, somado a outros benefícios já evidenciados, possa dar sustentação a programas governamentais de incentivos à implantação dos sistemas de ILP em larga escala.
“Especulou-se sobre como os sistemas de ILP atuaria nas taxas de acúmulo de carbono do solo, agora temos valores. Além destes benefícios, a ILP resulta em diversificação de atividades e garante renda o ano inteiro, possibilitando que muitos produtores saiam do vermelho. Na ponta da cadeia produtiva, haverá ainda o argumento de que o consumidor terá a disposição produtos diferenciados, mais limpos, com menor pegada de carbono e sem restrições ambientais”, finaliza o pesquisador.
Caio Rodrigo Albuquerque – Jornalista USP/ESALQ
Crédito de Carbono: Agronegócio começa a descobrir este mercado lucrativo de US$ 138 bilhões para salvar o planeta
O tema aquecimento global está na pauta do mundo todo, afinal, todos os habitantes do planeta são afetados pelo o que está ocorrendo. Até o momento, o meio mais eficaz para combater o problema é adotar o conjunto de resoluções definidas a partir do Protocolo de Kyoto, quando diversos países desenvolvidos de todo o mundo se comprometeram a reduzir as emissões de gases causadores do efeito estufa em até 5,2% ao final de 2012, prazo final do primeiro período. Porém, não é uma tarefa fácil reduzir a poluição quando população e o consumismo crescem vertiginosamente.
Para que os países signatários do acordo pudessem atender aos objetivos de redução global dos níveis de emissão de gases, foram criadas medidas compensatórias como alternativa, dentre as quais o bem sucedido programa de Créditos de Carbono. Teoricamente, é um mecanismo simples, que consiste em um país ou empresa que não está conseguindo reduzir os seus níveis de emissão de poluentes, poder comprar os créditos de outra nação ou empresa de um país subdesenvolvido que está obtendo êxito na redução.
Com isso, incentiva que diversas localidades do mundo busquem investir em mecanismos limpos de produção e, consequentemente, obtendo ótimos lucros com a comercialização de seus créditos excedentes.
Este é um mercado em franca expansão que, em 2005, movimentou US$ 3 bilhões e, em 2009, US$ 138 bilhões. A expectativa é de um crescimento vertiginoso nos próximos anos mas, apesar do Brasil estar entre os 3 países que mais negociam os créditos, ainda falta capacitação de mão-de-obra para a elaboração dos projetos para serem aprovados pela ONU (Organização das Nações Unidas).
Exemplo
Um aterro sanitário começa a queimar o gás metano produzido pela decomposição do lixo, transformando este em CO2. O metano tem um potencial 21 vezes maior que o CO2 no agravamento do efeito estufa. A metodologia do crédito de carbono definiu um preço para cada tonelada de CO2 que não é jogada na atmosfera que, atualmente, vale cerca de E$15 euros. Com isso, cada tonelada de metano que deixou de poluir o meio ambiente será multiplicado por 21. Com isso, os países signatários do Protocolo de Kyoto, poderão comprá-lo e compensar a não redução de poluentes da sua localidade.
“Este mercado dobra de tamanho todos os anos e ainda existe um enorme potencial de crescimento. Para tanto, é necessário que haja a ligação entre as possíveis empresas produtoras do crédito e as empresas compradoras. Isso só é possível através dos profissionais qualificados para montar o projeto de crédito de carbono”, explica o Dr. Fábio Odaguiri, mestre em Direito Ambiental e Internacional.