Sistemas agroflorestais diversificados são uma opção para a recuperação de áreas degradadas, produção de alimentos, de serviços ambientais e geração de renda
Sistemas agroflorestais diversificados (SAFs) são formas de uso da terra que envolvem arranjos de plantas, combinando o plantio de diferentes espécies de árvores e arbustos com cultivos agrícolas e/ou criação de animais, ao mesmo tempo, ou ao longo do tempo, seguindo princípios agroecológicos.
Sistemas agroflorestais de base agrícola
Nesses sistemas podem ser utilizadas diferentes espécies de árvores e arbustos, preferencialmente nativas da região, incluindo frutíferas, madeireiras, oleaginosas, medicinais, entre outras, para atender a diferentes finalidades e necessidades do homem.
Quanto às culturas, há diversas opções, como feijão-comum, milho, feijão-caupi (catador), arroz, mandioca, abacaxi, olerícolas, banana, entre muitas outras, dependendo da região, da base cultural da família e seus objetivos.
Não há um modelo de SAF considerado ideal que possa ser divulgado de forma generalizada, pois são vários fatores e componentes envolvidos. A composição desses sistemas é baseada nos interesses de cada agricultor e sua família, sua experiência acumulada, seus objetivos, disponibilidade de mão de obra, bem como das características de cada região.
Para cada situação deve ser encontrado um arranjo específico e, preferencialmente, baseado em princípios agroecológicos, buscando produzir alimentos de alta qualidade biológica, aliada à melhoria ambiental e socioeconômica das famílias ao longo do tempo.
Esses sistemas aumentam as alternativas alimentares das famílias, com maiores chances de garantir a segurança alimentar, bem como as possibilidades de renda, além de favorecer o equilíbrio ambiental, despontando como alternativa altamente promissora aos agricultores.
Esses sistemas também são importantes na recuperação de áreas degradadas, como “reserva legal”, e podem auxiliar – e até viabilizar – a recuperação de áreas de reserva permanente. Há muitas experiências de agricultores em todas as regiões do Brasil que possuem SAFs e expressiva variedade de serviços ambientais. Apesar desse importante serviço prestado à sociedade, há grande carência de políticas públicas que reconheçam esses serviços ecossistêmicos e beneficiem os agricultores responsáveis por essa revolução agroambiental no campo, e que também incentivem outros agricultores a adotarem esses sistemas.
Base agroecológica
Entre os serviços ambientais produzidos por SAFs de base agroecológica podem ser destacados:
- Grande aumento da diversidade vegetal (árvores, arbustos e plantas herbáceas)
- Diminuição da erosão e até extinção de processos erosivos,
- Oferta contínua de matéria orgânica ao solo, com expressiva melhoria de atributos químicos e físicos do solo,
- Grande aumento da biota do solo, melhoria da infiltração de água e manutenção da umidade do solo durante maior tempo durante estiagens,
- Supressão total do uso de adubos químicos e agrotóxicos,
- Aumento da biodiversidade funcional no agroecossistema (baixa ocorrência de pragas e doenças nos cultivos),
- Sequestro de carbono na biomassa vegetal e no solo,
- Segurança alimentar para famílias de agricultores, além da produção de alimentos sem resíduos de produtos químicos.
Sistemas silvipastoris sob bases agroecológicas e a produção animal
É um tipo de sistema agroflorestal diversificado, no qual se implanta a pastagem utilizando-se diferentes espécies de gramíneas nativas ou exóticas, que podem ser consorciadas com leguminosas rasteiras ou arbustivas, juntamente com espécies de árvores, preferencialmente nativas da região.
As árvores podem ser plantadas em fileiras, para facilitar o manejo, ou dispostas ao acaso; mas é importante que estejam bem distribuídas nas áreas de pastagens. É uma boa opção para melhorar as condições dos pastos, além de proporcionar maior conforto aos animais, aumentando sua resistência às adversidades climáticas e eventuais enfermidades, possibilitando a obtenção de maiores produtividades de leite ou carne.
Destaca-se que, além de melhorar o ambiente para a produção animal, esses sistemas têm grande potencial para produzirem boa diversidade de serviços ambientais.
A escolha das espécies de árvores é muito importante, pois pode render lucros com a venda de frutas nativas ou outros produtos com valor agregado (exemplo: jatobá, jenipapo, pequi, baru, bocaiúva, entre outras), da madeira (cedro, cerejeira, canafístola, ipê, peroba, angico, guatambu etc), além de outras possibilidades de geração de renda.
Planejamento do sistema
No planejamento do sistema silvipastoril deve-se escolher árvores que possibilitem o bom desenvolvimento das pastagens, evitando o excesso de sombreamento. Assim, é importante priorizar espécies leguminosas (fixam o nitrogênio do ar a partir de associações com microrganismos do solo), espécies que facilitem a passagem parcial da radiação solar por dentro da copa até atingir o solo, além de possuírem raízes profundas para promoverem a ciclagem de nutrientes com mais eficiência.
Alguns passos importantes para começar um SAF sucessional de base agrícola
Os SAFs sucessionais caracterizam-se por diferentes consórcios, onde a combinação entre espécies varia para cada formação vegetal ou cada fase do sistema. Esses SAFs, inicialmente, podem ser compostos por plantas tipicamente pioneiras, secundárias e tardias. Os representantes de todas as fases crescem juntos, porém, em cada fase da sucessão haverá uma comunidade dominando, direcionando a sucessão. Para cada consórcio, os indivíduos das espécies mais avançadas na sucessão não se desenvolvem satisfatoriamente enquanto as iniciais não dominam. Assim, as plantas de crescimento mais rápido criam condições ambientais mais favoráveis àquelas que se desenvolvem mais lentamente.
Alguns passos a serem seguidos para iniciar um SAF sucessional
1º ano – Plantio de culturas anuais como mandioca, milho, feijão-comum, soja, feijão-catador, entre outras, dependendo das condições de solo e clima da localidade – bem como da preferência de cada agricultor – intercaladas com mudas de árvores nativas da região, como sangra d’água, candiúva, embaúba, capixingui, mutambo, amendoim, leiteira, alecrim, tucaneiro, tarumã, guapuruvu, pimenta-de-macaco, açoita-cavalo e ingá, por exemplo. Estudos desenvolvidos pela Embrapa Agropecuária Oeste constataram que essas espécies apresentaram excelente desenvolvimento inicial em ecossistema de Floresta Semidecidual no Mato Grosso do Sul. É importante plantar a maior variedade possível de árvores.
2º e 3º anos – Rotação de culturas agrícolas anuais, colheita e a venda de produtos para gerar renda, enquanto as árvores crescem. Outras culturas de interesse econômico que se desenvolvem bem em condições de semi-sombreamento podem ser introduzidas, como abacaxizeiro, cafeeiro, maracujazeiro, urucum, bananeira, entre outras.
3º ano em diante – Está formado um bosque jovem, onde o agricultor pode plantar outras espécies de árvores que crescem bem na sombra (árvores de madeira de lei, como ipês, cedro, aroeira, canafístola, peroba, guatambu, entre outras), ou apenas aguardar o crescimento das árvores. Estas árvores (madeiras de lei) também podem ser plantadas junto com as pioneiras, no início do sistema agroflorestal.
Cuidados na composição e condução de sistemas agroflorestais diversificados
As mudas a serem plantadas nos SAFs devem ser produzidas, preferencialmente, a partir de sementes coletadas de árvores existentes em fragmentos de vegetação nativa na região, porque são mais adaptadas às condições ambientais locais, cuidando para que a colheita das sementes seja feita em diferentes matrizes (árvores e arbustos).
O plantio de árvores e arbustos produtores de frutos comestíveis pelos pássaros, morcegos e outros animais, também é uma estratégia recomendada para atraí-los ao sistema, melhorar a diversidade vegetal nos SAFs, e contribuir para a dispersão de sementes de várias espécies trazidas de outras localidades na região. O uso de espécies melíferas nos SAFs, da mesma forma, é importante para atrair abelhas e outros insetos polinizadores.Na composição de SAFs diversificados, recomenda-se o plantio de espécies arbóreas pioneiras, secundárias e clímax, favorecendo a sucessão ecológica.
As árvores pioneiras – também conhecidas como primárias – têm crescimento rápido, se desenvolvem bem a céu aberto e possuem tempo de vida curto (em geral, entre 3 a 15 anos). As pioneiras, normalmente são árvores de porte médio a alto, chegando a pouco menos de 20 metros, em média, e sua madeira é considerada leve. Como as pioneiras se desenvolvem rapidamente, elas formam um sombreamento que servirá como proteção (microclima), favorecendo o crescimento das árvores secundárias. São exemplos de espécies pioneiras: sangra-d’água, candiúva, embaúba, capixingui, mutambo, amendoim, leiteira, alecrim, tucaneiro, guapuruvu, pimenta-de-macaco, açoita-cavalo, ingá, entre outras.
As espécies arbóreas secundárias iniciais têm crescimento um pouco mais lento que as pioneiras e necessitam de sombreamento parcial para o melhor desenvolvimento inicial, mas seu tempo de vida útil na floresta gira de 15 a 20 anos. Alguns exemplos de árvores com essas características são cedro, ipês, angico, aroeira e jenipapo.
Já as árvores caracterizadas como clímax (também conhecidas como secundárias ou tardias) são de crescimento lento, necessitam de sombreamento para seu bom desenvolvimento inicial e possuem ciclo de vida longo. Nos sistemas naturais, são as plantas que se desenvolvem quando a floresta primária já está formada. Peroba, guatambu, erva-mate, jequitibá, jatobá, faveiro e canjerana são alguns bons exemplos.
Outro aspecto a considerar é que a implantação de sistemas agroflorestais visando à recuperação de áreas degradadas deve ser orientado para a utilização, preferencialmente, de sistemas de baixo uso de insumos, seguindo princípios agroecológicos.
Acompanhamento é importante
Após a implantação de SAFs, é importante acompanhar no dia a dia a evolução do sistema; monitorar a ocorrência de formigas cortadeiras de folhas e controlá-las, se necessário, preferencialmente com produtos não agressivos ao meio ambiente.
Deve-se, ainda, manter a área sem concorrência de plantas espontâneas agressivas (ervas daninhas), especialmente as gramíneas, que dificultam, e até impedem, o estabelecimento das mudas e a emergência de sementes de espécies arbustivas e arbóreas trazidas por pássaros e outros agentes de disseminação, que são estratégicas para a aceleração da recuperação da área degradada. Outra prática importante para que o SAF se mantenha produtivo refere-se à necessidade de podas – e até abate – das árvores que estejam promovendo excesso de sombreamento nas culturas agrícolas.
As experimentações da Embrapa Agropecuária Oeste visam conhecer o desempenho de espécies arbóreas para identificar as árvores pioneiras, aquelas que possuem crescimento mais rápido, que sejam mais adequadas para diferentes regiões; identificar e mensurar serviços ambientais produzidos pelos SAFs; avaliar as produções obtidas e fazer análise econômica dos SAFs.