Bebida tradicional da região Sul, o mate já entrou na rotina de muitos brasileiros, acompanhando um pão de queijo ou até o almoço. Contudo, a empresa paranaense Mate Herbal chega com mais uma opção: o mate solúvel orgânico. Mais do que o sabor, a bebida tem propriedades antioxidantes e estimulantes, que a empresa procura preservar ao máximo em seus processos de produção. A Lavoura conversou com Paola Ceni, responsável pelo marketing e vendas, que também planeja levar o “astro do chimarrão” para muitas outras mesas no Brasil e no exterior.
A Lavoura – Como foi o início da Mate Herbal e seus integrantes?
Iniciamos a plantação do nosso erval há 20 anos e em 2005 recebemos a certificação do USDA e IFOAM pelo Instituto Biodinâmico como 100% orgânicos. Nossa empresa é familiar, e conta comigo e meu pai, Vilmar Ceni, no setor administrativo; na manutenção do erval, há dois funcionários permanentes e outros contratados temporariamente para a colheita. Já Eremar Ceni, que é engenheiro florestal, foi o responsável pela seleção genética de mudas com baixo teor de cafeína e padrão mais suave, que se transformou no padrão de nosso produto. Nesse processo, ele aproveitou variedades locais de mata nativa. Também contamos com o trabalho do consultor técnico Juarez Lorenzon, responsável pela manutenção e melhorias da propriedade.
Lavoura – A área de produção é própria ou adquirem a erva de terceiros?
Temos uma área própria, certificada, de 87 hectares, em Chopinzinho, Paraná.
A Lavoura – Foi preciso recuperar solos para a produção orgânica?
Não foi necessário, pois nunca se havia utilizado nenhum adubo químico, inseticida ou herbicida na propriedade, por esse motivo optamos pelo plantio do erval nessa área, além disso, a localização é perfeita para o cultivo da erva mate: solo profundo e de terra vermelha, na altitude ideal de 780 a 820m e clima subtropical.
A Lavoura – As áreas produtivas são acompanhadas de que forma?
Pelo nosso consultor Juarez, que indica os insumos orgânicos corretos e manejos, por exemplo. Nesse sistema, também mantemos ovelhas da raça Santa Inês, cujos excrementos são utilizados para enriquecer o solo. Dividimos o erval em talhões; nas partes fora de produção elas se alimentam do capim – que é invasor, – e as fezes dos animais ao mesmo tempo adubam o solo. Outro animal que utilizamos é a galinha d’angola, que é criada solta para comer formiga e outros insetos que estiverem infestando algum local.
A Lavoura – Qual é o volume de produção atual?
O erval produz de 600 toneladas de erva verde por ano, com potencial de duplicação por meio do aperfeiçoamento de manejo, e aplicação de calcário de concha, fosfato e sulfato naturais.
A Lavoura – Como enfrentam a sazonalidade?
Ela ocorre na produção, pois a colheita é realizada duas vezes ao ano; já no fornecimento ao consumidor podemos fazer um planejamento para que não falte produto ao longo do ano.
A Lavoura – Pode descrever como é esse planejamento?
A colheita é realizada duas vezes ao ano, de maio a agosto e dezembro a fevereiro. O erval está dividido em talhões e a colheita em cada talhão acontece de dois em dois anos. A época ideal é no inverno porque confere a característica de um sabor mais suave e menor teor de cafeína à bebida. É um processo trabalhoso, pois mesmo na colheita há parâmetros orgânicos a serem seguidos. Depois, realizamos o sapeco e a secagem, fundamental para a conservação das folhas, que se deterioram quando não “seca”, ou seja, com mínima umidade. Só desta maneira elas poderão ser estocadas para a elaboração futura dos diversos produtos.
A Lavoura – Quais foram os investimentos mais pesados e específicos à produção orgânica?
Todo o processo fica mais oneroso: o preparo do solo, a produção das mudas, a implantação e o preparo do erval, o zelo com as condições de trabalho das pessoas que trabalham no projeto. E apesar de todo o cuidado em atender às normas da produção orgânica, trabalhamos constantemente com riscos, como exemplo de contato das folhas com poluentes nas rodovias, por isso precisamos de caminhões adequados para o transporte e de motoristas treinados.
A Lavoura – As embalagens também influenciam nos custos?
Bastante. Há o fator dos pedidos mínimos, que ficam por volta de 20 mil unidades. Enfrentamos também a questão da sustentabilidade, não há uma boa oferta de opções. Apesar disso, lançamos um produto embalado a vácuo, que mantém ótimas condições de cor e sabor por um período prolongado, além da inovação do formato. Isso concorda com um dos nossos propósitos principais: manter as propriedades de uma erva que, sem cuidado, é altamente perecível.
A Lavoura – Como avalia o acesso à informação sobre orgânicos para o consumidor?
É preciso ainda muita divulgação, pois muitas pessoas não têm ideia nem do que significa a palavra – até no próprio meio empresarial! Creio que por trazer o nome de “erva”, haja uma ideia que seja automaticamente orgânica, o que pode não ocorrer devido aos insumos químicos, herbicidas, fungicidas, inseticidas, higiene não adequada, uso de insumos, embalagens, armazenagem, transporte e processamento não adequados.
A Lavoura – Existem variedades da planta?
Basicamente as variedades conhecidas são ilex paraguariensis e a vestita, Dentro da variedade ilex paraguariesis existem muitas sub-variedades. Dependendo da qualidade do solo, da época de colheita, do manejo, a erva mate pode sofrer variações muito significativas no sabor. Há diferenças também entre a erva mate plantada e a nativa. Nossas mudas foram plantadas numa região de araucárias, mas foram selecionadas a partir de mudas nativas.
A Lavoura – Quais as principais doenças que afetam a planta? Como preveni-las num manejo orgânico?
A principal praga que ataca o nosso erval é o “corintiano”, que é considerada uma das principais pragas da erva mate. Tomamos algumas medidas preventivas, como podas moderadas com ferramentas adequadas, proteção das raízes, além da catação manual dos adultos.
A Lavoura – Os trabalhadores têm que passar por alguma adaptação para o manejo orgânico?
Sim, principalmente os temporários, pois é uma mão-de-obra bastante variada. Isso traz uma dificuldade a mais para o nosso consultor, pois algumas pessoas não entendem o conceito. Elas estão habituadas a práticas que não utilizamos aqui, por exemplo, de colher as folhas evitando contaminações. Assim, é preciso dar treinamento, mostrando o uso de tesoura e de lonas, por exemplo, que não deixam as folhas em contato direto com o chão, trazendo impurezas e contaminação.
A Lavoura – Por que a decisão de atuar na linha orgânica?
Acredito que já esteja no sangue da família, o amor pela natureza a admiração pelo equilíbrio ecológico. A produção orgânica nos dá as diretrizes de como colocar em prática esse nosso sonho, nos fornecendo os passos para trabalhar de forma correta. É muito gratificante saber que todos os envolvidos, incluindo as ovelhas, o riacho, os consumidores, todos, estão sendo beneficiados com o nosso trabalho.
A Lavoura – Como está avaliando o mercado orgânico?
Tenho observado uma maior procura do consumidor por certificados, uma certa necessidade crescente. De fato, isso já ocorre nas vendas para o Oriente Médio, Estados Unidos e Alemanha, particularmente esta última. Lá, na Biofach (N.: a principal feira orgânica do mundo) percebi que o público gostou muito do chimarrão, uma novidade para eles, que consideraram o produto exótico – e na verdade é, pois a erva mate só é cultivada no sul da América do Sul. Já no Brasil, tomamos as providências para nos ajustarmos à nova regulamentação dos orgânicos, com autorização do IBD. As embalagens atuais agora têm um adesivo com o selo padrão do governo, mas, posteriormente, serão impressas de acordo com as normas vigentes.
A Lavoura – Quais são os produtos da empresa?
Consideramos o chimarrão o principal, além do sachê – natural tostado e verde, – e o solúvel, lançado há dois meses que é uma inovação na linha orgânica, porque não é necessário fazer a infusão, basta misturar em água quente ou gelada e a bebida está pronta para beber. Nosso público é variado, mas há muitas crianças e jovens, com a ideia de um produto de rápido preparo e consumo. Contudo, também vemos potencial para fornecimento a escolas e hospitais. O nosso propósito é manter o verdadeiro sabor do mate e todas as suas propriedades. Por isso optamos por não misturar muitas essências aos produtos, que mesmo sendo orgânicas influenciam no sabor do mate.
A Lavoura – Qual é o meio de vendas mais importante?
Atuamos no atacado e varejo, com algumas diferenças. O produto a granel, que é a erva em sacas, é vendido direto a indústrias como a Mate Leão (Coca Cola) e Vate; já os produtos finais são comercializados no varejo por meio de representantes comerciais.
A Lavoura – Já tiveram ou puderam contar com algum programa governamental para sua atividade produtiva?
Sim, somos afiliados a Organics Brasil, projeto da Apex, IPD e Fiep, que nos auxilia na participação de feiras internacionais. Eventos organizados pelo Sebrae, como o Fomenta, também nos ajudam a alavancar as vendas para o governo.
A Lavoura – Quais são os projetos e perspectivas da empresa para 2011?
Já estamos na reta de lançamento de nossa loja virtual, o que deve incrementar nossas vendas num meio em crescimento. Pretendemos também uma expansão do mate solúvel para a merenda escolar, além de projetos ligados à Copa de 2014.