Brasil já está entre os três maiores exportadores de feijão-caupi do mundo, ao lado do Peru e dos EUA
A cultivar de feijão-caupi BRS Guariba já responde por 85% das exportações de feijão para o Oriente Médio, Ásia e Europa. Esta variedade tem excelentes características comerciais: é de cor branca, tem o formato arredondado, alta produtividade e é rica em proteínas, ferro e zinco.
Em 2013, o Brasil exportou 24 mil toneladas de feijão-caupi, num total de US$ 16,5 milhões, segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Os maiores compradores foram a Índia e o Egito. Mas o braço exportador brasileiro alcançou também os Emirados Árabes, Arábia Saudita, Irã e Indonésia. Na Europa, Portugal concentra as importações. Para este ano, a previsão é que os números se repitam.
O maior exportador individual de feijão do Brasil, Paulo Henrique Ribeiro de Aguiar, sócio-gerente da Brasil Agropulses, com sede no município de Sorriso, a 420 quilômetros de Cuiabá, no norte mato-grossense, comercializou, no ano passado, 9,5 mil toneladas. Em 2014, ele chegou a negociar em torno de dez mil toneladas. O exportador vende também internamente para as regiões Norte, Nordeste e Sudeste, com destaque para o Rio de Janeiro e São Paulo.
Paulo Henrique diz que os outros 15% das exportações brasileiras de feijão para o Oriente Médio, Ásia e Europa, foram feitas com a cultivar BRS Novaera, também desenvolvida pela Embrapa Meio-Norte. Todo o feijão exportado pelo Brasil é produzido no Mato Grosso e sai do País pelo porto de Paranaguá, na região metropolitana de Curitiba.
Conhecido também como feijão-macassa e feijão-de-corda, o caupi é cultivado com destaque nos estados do Ceará, Bahia e Piauí, no Nordeste; e Pará, no Norte. Nas duas regiões, a produção é consumida internamente, sendo base da alimentação das famílias principalmente nas áreas semiáridas do Nordeste. Três países se destacam com 80% das exportações de feijão-caupi: Estados Unidos, Peru e Brasil.
O passo a passo no nascimento de uma cultivar
A BRS Guariba foi desenvolvida pela Embrapa Meio-Norte (PI), após oito anos de intensas pesquisas no campo e em laboratório. O desafio para desenvolver a cultivar começou em 1996. O procedimento envolveu cruzamento controlado, e fez parte de projeto coordenado pelo geneticista Francisco Freire Filho. O passo seguinte foi instalar, em regime de sequeiro, 23 ensaios de Valor de Cultivo e Uso, no Piauí e Maranhão, onde foram feitos os testes de campo. Neles, uma revelação animadora: a produtividade média atingiu 1,5 toneladas por hectare. À época, na região, a produtividade média de outras variedades alcançava apenas uma tonelada por hectare.
No trabalho diário, que envolveu diretamente mais cinco pesquisadores e dez auxiliares de pesquisa, o geneticista seguia à risca o ritual dos cruzamentos vegetais, seguindo as seguintes etapas: primeira, retirada dos órgãos masculinos da flor; segunda, coleta do pólen na flor masculina e terceira, polinização do botão floral, do qual foram retirados os órgãos masculinos.
Francisco Freire Filho diz que o desenvolvimento de novas cultivares é sempre prazeroso: “As flores do feijão-caupi são perfeitas e, quando elas abrem no início da manhã, geralmente já estão autopolinizadas. Desse modo, a retirada das anteras — órgãos que abrigam os grãos de pólen da flor feminina — é indispensável para a obtenção de cruzamentos controlados. Contudo, as flores do feijão-caupi são relativamente grandes, o que facilita muito o manuseio desses órgãos no processo de polinização controlada.
Em laboratório, a cultivar passou por testes rigorosos de teores de proteína, ferro, zinco e para determinar o tempo médio de cozimento. Os testes revelaram o seguinte perfil nutricional: proteínas, 22,7%; lipídios, 1,0%; fibras digestivas, 24,9%; carboidratos, 47,3%; ferro, 69 mg/kg e zinco, 33 mg/kg. O tempo médio de cozimento atingiu, no máximo, 21 minutos. Aprovada no campo e em laboratório, a BRS Guariba chegou com força ao mercado em 2004.
Mais três cultivares chegarão ao mercado em 2015
Até o final do primeiro semestre de 2015, o mercado brasileiro de grãos ganhará mais três cultivares de feijão-caupi: BRS Brancão, BRS Ouroverde e BRS Inhuma, desenvolvidas pela Embrapa Meio-Norte e que serão recomendadas para as regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste.
Coordenadora nacional do Programa de Melhoramento Genético do Feijão-Caupi, a Embrapa Meio-Norte trabalha hoje com quatro projetos com foco na tolerância à seca, na biofortificação e na caracterização de germoplasma. Os estudos buscam melhor produtividade das cultivares, resistência a pragas e doenças e boa qualidade comercial do grão. Entre as novidades estão a redução do impacto de doenças que estão surgindo agora, como as nematoides e as bacterianas, e cultivares com foco em tipos comerciais de cores preta, creme e rajada.
Pesquisa ganha fôlego no Centro-Oeste
Nos últimos meses, o pesquisador José Ângelo Júnior, lotado na Embrapa Agrossilvipastoril (Sinop-MT), vem trabalhando com as linhagens elite do Programa Nacional de Melhoramento Genético do Feijão-Caupi, desenvolvidas em Teresina.
Ele também mira o desenvolvimento de linhagens de feijão-caupi no próprio estado do Mato Grosso, já que elas são desenvolvidas em Teresina e apenas testadas no Centro-Oeste.
O pesquisador ressalta que com o desenvolvimento das linhagens no próprio local onde elas serão cultivadas, “as chances de sucesso serão maiores”. A partir dos bons resultados, a perspectiva de desenvolver novas cultivares com adaptabilidade e estabilidade de produção para o agronegócio empresarial e familiar no Mato Grosso cresce.
Avança a produção de sementes
Com a conquista do mercado externo nos últimos anos e a consolidação da preferência na mesa do brasileiro, o feijão-caupi abre outro espaço na atividade agrícola: a produção de sementes certificadas pela Embrapa. No estado do Mato Grosso, por exemplo, são esperadas para este ano 3,6 mil toneladas de sementes, numa área de 2,6 mil hectares, segundo o fiscal agropecuário Ubiratan Figueiredo, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
E é no município de Sorriso que o gaúcho Leandro Lodéa, de 38 anos, aposta tudo no avanço da produção de sementes de feijão-caupi. Este ano, na safrinha de fevereiro a maio, ele plantou 1.150 hectares com a variedade BRS Tumucumaque, também desenvolvida pela Embrapa Meio-Norte. A expectativa é de uma produção de, pelo menos, 1,2 toneladas. “Essa produção vem para organizar o mercado de feijão no Mato Grosso”, garante o produtor.
Pioneirismo
Mais adiante, a 486 quilômetros de Sorriso, em Primavera do Leste, no Sudeste mato-grossense, o também gaúcho Moacir Tomazetti, de 66 anos, pioneiro na produção de sementes de feijão-caupi no Centro-Oeste, continua firme. Em 2009, ele foi o maior produtor de sementes do País. Este ano, Tomazetti espera produzir 1,8 mil toneladas de sementes básicas em parceria com a Embrapa Produtos e Mercados, numa área de mil hectares. As variedades cultivadas são a BRS Guariba, BRS Novaera e BRS Tumucumaque.
O avanço no cultivo de sementes e grãos no estado do Mato Grosso tem valorizado muito o hectare de terra nos municípios com forte vocação agrícola. Em Sorriso, por exemplo, um hectare de terra agricultável varia de R$ 15 mil a R$ 67 mil. A escala de preço sobe ou desce de acordo com a qualidade do solo e a proximidade com áreas estruturadas — asfalto, armazéns, postos de saúde, de combustíveis e escolas.
Para o consultor Andre Reiguel, 42 anos, engenheiro agrônomo paranaense que trabalha no estado há 10 anos, o feijão-caupi tem potencial para se tornar uma commodity. “Ele tem ampla adaptabilidade às regiões tropicais e baixo custo de produção”, destaca. Segundo ele, o produto não compete com a agricultura familiar do Nordeste. “O mercado internacional paga um preço menor, mas em compensação, é mais regular em volume movimentado”.