Considerados promotores de crescimento alternativos, os acidificantes vêm se destacando ao diminuir problemas sanitários na avicultura e suinocultura
Pressões legislativas, barreiras comerciais e a crescente preocupação dos consumidores acarretaram na redução da utilização de aditivos antibióticos na alimentação animal, fato inicialmente ocorrido na Europa, agora com proporções globais. Na produção de aves e suínos há a necessidade de promotores de crescimento alternativos que sejam economicamente viáveis, sustentáveis e multifuncionais. Os acidificantes se tornam uma alternativa também para potencializar a digestão e absorção da dieta em algumas fases críticas, conduzindo a um melhor desempenho e saúde como um todo.
Os acidificantes estão inseridos no grupo dos aditivos equilibradores da microbiota do trato gastrintestinal, composto por ácidos orgânicos ou inorgânicos que reduzem o pH do meio, com o objetivo de facilitar a digestão e reduzir a proliferação de microrganismos indesejáveis. Os ácidos orgânicos são constituintes de plantas e animais que contém uma ou mais carboxilas em sua molécula. Em produção animal, o termo refere-se aos ácidos fracos de cadeia curta (C1-C7) que produzem menor quantidade de prótons por molécula ao se dissociarem. Podem ser utilizados também na forma de sais ou ésteres.
Há muito tempo, os ácidos orgânicos são amplamente utilizados na indústria alimentícia e nutrição animal, como conservantes de grãos e rações, prevenindo fungos e umidade. Versáteis, hoje também são usados como acidificantes de cama, sanitizantes de carne (aumenta o shelf-life do produto após processamento), e principalmente como aditivo nutricional promotor de crescimento.
Ácidos orgânicos
Os ácidos orgânicos atualmente disponíveis no mercado encontram-se na forma líquida ou pó, oferecida via água ou ração. No mercado atual, observam-se alguns ácidos orgânicos livres, que tendem a atuar na porção anterior do trato gastrintestinal, e outros protegidos por uma matriz de triglicerídios, os quais sofrem a ação de sais biliares e lipases, liberando os ácidos a partir do intestino delgado, sem interferência das enzimas pancreáticas e intestinais. O objetivo a ser alcançado é o equilíbrio da microbiota de intestino grosso com menor produção de gases e nitrogênio, bem como o aumento de bactérias produtoras de ácidos graxos voláteis.
Existem inúmeras hipóteses quanto aos mecanismos de ação dos acidificantes, dentre as quais merecem abordagem: a alteração da microbiota intestinal por ação bactericida ou bacteriostática; redução do pH estomacal (suínos) ou do papo (aves); melhor atividade de enzimas; melhor digestibilidade e retenção de nutrientes; qualidade intestinal, fatores que podem influenciar num bom desempenho do animal. Alguns estudos já mostram evidências de que os ácidos orgânicos podem substituir alguns antibióticos (Gráficos 1 e 2).
Gráficos 1 e 2: Efeito do uso de ácidos orgânicos (mistura de ácido fumárico, cítrico, lático e fórmico) na ração sobre o ganho de peso (GP) e conversão alimentar (CA) de frangos de 1 a 21 dias de idade. Experimento realizado no Laboratório de Estudos e Pesquisa em Produção e Nutrição de Animais Não-Ruminantes (LEPNAN), da Universidade Federal do Paraná (UFPR, Curitiba/PR):
Letras diferentes indicam diferença significativa
T1 – 10 ppm Promotor de crescimento / Com Anticoccidiano (controle positivo) |
T2 – Sem Promotor de crescimento / Sem Anticoccidiano (controle negativo) |
T3 – Sem Promotor de crescimento / Sem Anticoccidiano / Com Acidificante |
T4 – Sem Promotor de crescimento / Com Anticoccidiano / Com Acidificante |
Tanto em aves quanto suínos, a atividade antimicrobiana é semelhante. Sabemos que podem reduzir o pH do meio gastrintestinal, eliminando grande parte das bactérias patogênicas e selecionando as benéficas, as quais sobrevivem em pH ácido. Porém, sua principal ação antimicrobiana acontece sem reduzir o pH do meio. Ácidos orgânicos são facilmente absorvidos pela parede célular das bactérias. Uma vez na célula, a porção aniônica do ácido danifica a estrutura do DNA no núcleo das células e, consequentemente, as bactérias não se dividem ou morrem. A porção catiônica liberada dos ácidos reduz o nível do pH da célula, obrigando a célula bacteriana a utilizar sua energia para liberar os prótons, levando a uma exaustão celular.
Em suínos, na fase de demama
Em suínos, o interesse principal em utilizar acidificantes é na fase de desmama, pelo fato de que leitões têm produção inadequada de ácido clorídrico e baixa capacidade em manter o pH gástrico adequado nessa fase. Durante o aleitamento, o ácido lático é produzido por bactérias as quais utilizam a lactose do leite da porca como substrato. Com a mudança da dieta do leite para a ração, há proliferação de outros microrganismos que geralmente desencadeiam resultados negativos sobre o desempenho do leitão. Ácidos orgânicos ajudam a manter o pH gástrico estabilizado, melhoram a digestão de proteínas, estimulam secreção de bicarbonato e enzimas pancreáticas, que podem auxiliar o processo de esvaziamento gástrico e na absorção de nutrientes no intestino. Devido sua ação antimicrobiana, previne algumas enteropatias como Lawsonia intracellularis, Clostridium sp., E. coli.
Em aves, também auxiliam na redução do pH, beneficiando a ação da pepsina para digestão e absorção de nutrientes, mas sua principal função é a modelação da microbiota do trato gastrintestinal. O papo ou inglúvio (dilatação do esôfago), tem um pH próximo a 5,5, ambiente propício ao crescimento de algumas bactérias acidófilas indesejáveis como a Salmonella sp., que atingem o intestino após vencerem a barreira do papo. O uso de ácidos orgânicos livres aumenta a acidez nesse local e diminui a colonização de bactérias patogênicas e favorece outras bactérias benéficas como Lactobacillus sp.
Os ácidos ôrgânicos têm papel predominante na redução de microrganismos como Escherichia coli, Campylobacter spp. e principalmente Salmonella sp., considerada o um dos principais problemas sanitário avícola atual. Muitos estudos indicam que ácidos orgânicos são uma excelente alternativa no controle dessa enfermidade bacteriana (Gráfico 3).
Gráfico 3: Contagem de Salmonella Enteritidis em papos de frangos de corte. Experimento realizado no Laboratório de Microbiologia e Ornitopatologia (LABMOR) da Universidade Federal do Paraná (UFPR, Curitiba/PR):
Letras diferentes indicam diferença significativa
Práticas de acidificação via água são comuns apenas na fase que antecede o abate, com o objetivo de prevenção na contaminação de carcaças no abatedouro. Entretanto, sabe-se que os efeitos da alteração da microbiota ocorrem não apenas no papo, mas também em toda a extensão intestinal, sendo importante a adoção estratégica de uso contínuo durante todo o período de produção de frangos de corte.
Os resultados do uso dos ácidos orgânicos na alimentação dos animais são dependentes da concentração e das combinações dos ácidos empregados bem como da capacidade tamponante da dieta utilizada. Assim, percebemos a importância do uso de blends de ácidos orgânicos, pois cada classe (butírico, cítrico, fórmico, fumárico, lático, propiônico, entre outros) possui uma determinada função, potencial de dissociação e local de atuação.
Diversos autores também afirmam que os ácidos orgânicos estimulam o desenvolvimento da mucosa intestinal. Possuem ação trófica sobre a estrutura e o desenvolvimento intestinal, aumentando o tamanho dos vilos, profundidades de criptas, massa intestinal e área de absorção de nutrientes.
Ácidos orgânicos têm mostrado excelentes resultados tanto em condições experimentais como no campo. Suas combinações, bem como o uso de outros aditivos alternativos como enzimas, probioticos, prebioticos, extratos, óleos vegetais e imunomoduladores são candidatos com alto potencial na substituição dos antibióticos. Outros estudos devem ser realizados com diversas combinações dos aditivos citados, sempre levando em consideração as necessidades e os desafios sanitários existentes no campo.
Ricardo M. Hayashi – Médico veterinário, responsável pela Pesquisa e Desenvolvimento da Sanex (Curitiba/PR)
Condições bioclimáticas durante o transporte de pintos de um dia
O estudo avaliou os efeitos das condições de transporte dos animais nas respostas produtivas e fisiológicas.
A avicultura brasileira tem enfrentado diversos desafios nos últimos anos para manter-se na liderança mundial. As preocupações com a lucratividade têm aumentado nos últimos anos, aliadas com a baixa quantidade de pesquisas no setor.
“Há escassez de informações relacionadas à logística pré-porteira da avicultura de corte, principalmente quanto ao conforto térmico de pintos de um dia em trânsito”, afirma Frederico Márcio Corrêa Vieira, pesquisador da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (USP/ESALQ) e do Núcleo de Pesquisa em Ambiência (NUPEA). “A área de logística de transporte de carga viva é carente de informações no Brasil, aumentando os prejuízos da avicultura brasileira”, explica.
Demanda
Baseado nesta demanda, o zootecnista desenvolveu sua tese de doutorado “Transporte animal: influência das condições bioclimáticas no desempenho produtivo e fisiológico de pintos de um dia”. Orientada pelo professor Iran José Oliveira da Silva, do Departamento de Engenharia de Biossistemas (LEB), a pesquisa avaliou os efeitos das condições simuladas de transporte dos animais, submetidos aos diferentes níveis de estresse térmico e posição das caixas de transporte, nas respostas produtivas e fisiológicas.
Segundo o estudo, durante o transporte de pintos de um dia, foi observada pouca padronização, principalmente no que se refere ao conforto térmico dos animais. “Sabe-se que os caminhões climatizados possuem grande heterogeneidade térmica ao longo do perfil da carroceria. A densidade de animais por caminhão também é variável, podendo chegar a 60.000 pintos transportados nas laterais e no corredor da carroceria, aumentando os núcleos térmicos em diversos pontos da carga”, afirma o pesquisador.
O fator tempo de exposição também é levantado pelo autor. “Ele determina a intensidade dos efeitos negativos nos animais em jejum, sendo que a duração da viagem pode ultrapassar 36 horas”. Outros fatores importantes também podem contribuir para a desuniformidade do lote e perdas antes do alojamento. De acordo com Vieira, a distância, vibração da carga, qualidade das estradas, tempo de viagem, tipos de caixas e de carrocerias climatizadas também interferem no processo.
Pesquisa
A pesquisa concluiu que, mesmo em situação de conforto, recomenda-se que o transporte de pintos de um dia não ultrapasse 3 horas, visando ao elevado bem estar, conforto térmico e sobrevivência destes animais até a chegada à granja. “É muito importante a escolha de granjas que sejam relativamente próximas ao incubatório, obedecendo obviamente a uma distância mínima relacionada a aspectos de biosseguridade”, explica.
Além disso, a condição térmica deve ser observada rigorosamente nos baús climatizados utilizados no transporte de pintos, para evitar o estresse, tanto por frio quanto por calor excessivo, durante o transporte e alojamento nas granjas. “A faixa ideal de temperatura no interior do caminhão deve estar entre 29 e 34,6°C e com umidade relativa em torno de 60%, considerando que existe um gradiente de temperatura entre o ambiente interno das caixas e o ambiente do baú climatizado entre 0,7 e 1,6°C para esta faixa térmica”, explica o pesquisador. Apesar do frio ser a maior preocupação nesta fase, o estresse por calor de pintos de um dia também merece atenção no setor, para evitar perdas.
Termotolerância
A necessidade de se padronizar a temperatura durante o transporte dos animais advém da baixa termotolerância dos pintos, termo que denomina a resistência do indivíduo às condições hipertérmicas. Segundo Frederico Márcio Corrêa Vieira, sabe-se que as aves jovens possuem maior tolerância às altas temperaturas do que às baixas. “esse fato está relacionado com a imaturidade da termorregulação corporal. A ave possui maior necessidade de manter sua temperatura corporal elevada”. O pesquisador afirma que o aumento da temperatura ambiente corresponde ao aumento da temperatura superficial das aves. “Este fato é consequência de que a capacidade de perda de calor sensível pelas aves jovens ser reduzida com o aumento da temperatura, resultando em aumento da temperatura cloacal e utilização de mecanismos de perda de calor latente”, conclui.