Sistema hidropônico reduz tempo de produção de mudas de banana nas biofábricas. Além disso, é mais sustentável que o convencional pela redução do consumo de água e fertilizantes e menor demanda de mão de obra
A redução de 30 para 18 dias, em média, no tempo de produção de mudas de banana em biofábrica foi conseguida graças a um trabalho inédito da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária-Embrapa, em parceria com a Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB).
A novidade é a utilização da hidroponia, uma técnica de cultivo de plantas sem solo, em que as raízes recebem uma solução nutritiva balanceada que contém água e os nutrientes essenciais ao desenvolvimento da planta. O emprego dessa tecnologia, na fase de aclimatização do processo, conseguiu elevar de 12 para 20, o número de ciclos de produção no ano, um acréscimo de aproximadamente 65% na quantidade de mudas.
O aumento da produtividade é alcançado com a combinação de dois fatores: a diminuição do tempo que a muda leva para atingir o ponto de colheita e a redução das perdas. A mortalidade de plantas ficou em torno de 4% com a nova técnica, enquanto no sistema convencional, a taxa é de 18%.
Sustentável
Depois de mais de dois anos de execução, ficou comprovado por esta pesquisa que a hidroponia é mais sustentável que o sistema convencional. Os pesquisadores registraram redução do uso de água, diminuição na aplicação de fertilizantes e, com a automatização do sistema, a necessidade de mão de obra foi bastante reduzida.
Maurício Coelho, pesquisador da Embrapa Mandioca e Fruticultura, entidade sediada na Bahia, explica que a hidroponia é utilizada normalmente em cultivos intensivos de hortaliças, “mas não há referências do uso da técnica para a produção de mudas micropropagadas de banana”.
Ele relata que a inovação está na adaptação do sistema especificamente para a produção de mudas. “Deu muito certo com as mudas de banana. O objetivo agora é ampliar a técnica para outras culturas. Já começamos a testar com mandioca, por exemplo, e com muito êxito,” revela.
Trabalho inédito
Essa nova tecnologia surgiu a partir de demandas de pesquisas desta Unidade, que trabalha com fruteiras tropicais e mandioca. “Há muito tempo verificamos a dificuldade de se obter mudas de forma rápida para os nossos experimentos de tolerância à seca. Foi preciso, então, multiplicar e ter esse material disponível para realizarmos com maior agilidade os trabalhos com as diversas culturas de nossa unidade. Começamos a realizar testes com citros, mandioca e com a banana, já conseguimos fechar todo o ciclo. Uma técnica que foi desenvolvida a princípio para atender a uma necessidade interna da Embrapa, pode agora beneficiar a produção de biofábricas de banana País afora”, comemora Coelho.
A pesquisa integra a dissertação de mestrado em Engenharia Agrícola na UFRB de Iumi Toyosumi e se insere no escopo do Programa de Melhoramento Genético da Banana e Plátanos da Embrapa. Atualmente, Toyosumi continua os estudos nessa área em seu doutorado, na mesma universidade, sob a orientação de Coelho.
O pesquisador da Embrapa salienta que os resultados podem variar de acordo com a cultivar utilizada. “No caso desses experimentos, optou-se pela Prata Anã, por ser a banana mais consumida no País e que apresenta maior demanda nas biofábricas”, esclarece.
Qualidade superior das mudas
Segundo Maurício Coelho, a hidroponia viabiliza também uma condição ótima de trabalho, uma vez que evita a ocorrência de deficiência nutricional e também de estresse hídrico, já que a água e os nutrientes necessários para a produção estão presentes o tempo todo no sistema. “Assim, a planta consegue absorver exatamente o que necessita para seu desenvolvimento.
“A vantagem de trabalhar com a hidroponia é exatamente a possibilidade de padronizar as condições de água e nutrientes.” Ele explica que a técnica garante uma solução equilibrada, com pH, condutividade elétrica (concentração de sais na solução) e todos os nutrientes. Desta forma, você tem uma planta com mais raiz e, portanto, crescimento mais rápido, o que aumenta — e muito — a produtividade,” detalha o cientista.
Ele revela que a ausência de estresse hídrico ou nutricional gera mudas maiores, mais vigorosas e bonitas. “Por isso, a gente acaba obtendo uma qualidade superior das mudas, que ficam mais uniformes, e com menor uso de insumos”, avalia.
Como funciona o sistema
As mudas produzidas em laboratório são micropropagadas, ou seja, obtidas por meio da clonagem de plantas. Depois de passar pelo processo de multiplicação in vitro, os chamados explantes, que são as mudas ainda em formação, vão para a aclimatização em estufa, fase em que entra a hidroponia. Quando saem do laboratório, as mudas micropropagadas apresentam tamanho reduzido, sendo necessária a aclimatação até que alcancem 30 centímetros de altura para, daí, irem para o plantio no campo.
A engenheira Iumi Toyosumi explica que, na estufa, os explantes são transplantados para bandejas que contêm um substrato inerte (que não fornece nutrientes para planta, apenas viabiliza um ambiente para o crescimento das raízes) — no estudo foi utilizada a fibra de coco.
“As bandejas são acondicionadas nas bancadas seguindo a forma de cultivo hidropônico denominada NFT (Nutrient Film Technology), em que as plantas têm o seu sistema radicular imerso em um canal. As raízes ficam, então, em contato com a solução nutritiva composta de água e nutrientes, que seguem um fluxo intermitente com alta frequência, formando um filme muito fino. Esse sistema requer a existência de um reservatório. A solução nutritiva é bombeada desse reservatório para as bandejas e entra em tubos de PVC com perfurações, sendo distribuída de forma a preencher toda a bancada”.
De acordo com Iumi, essa solução nutritiva faz o papel do solo. “Porque não é só a água. É água mais nitrogênio, potássio, fósforo e todos os outros nutrientes necessários para o crescimento e desenvolvimento das plantas. Produzimos, então, essa solução da forma mais balanceada possível para permitir o maior crescimento das mudas”, conta a cientista. Segundo ela, a água com os nutrientes é bombeada por 15 minutos. Depois, para economizar energia, a bomba se desliga automaticamente por mais 15 minutos. “Testes mostraram que esse intervalo de tempo é o ideal para as plantas obterem melhores respostas”, pondera.
Menos 60% de água
Uma das principais vantagens da hidroponia é a redução do consumo hídrico. Iumi Toyosumi relata que, como o sistema é fechado, a água recircula, por isso, não há nenhuma perda. “No sistema hidropônico, o ciclo de produção da muda de banana, que é de 18 dias, necessita apenas de 64 mililitros de água. Já no convencional, com ciclo de 30 dias, o consumo de água fica em 163 mililitros. Logo, a hidroponia garante uma redução de 60% da quantidade de água utilizada. Levando-se em consideração que, atualmente, a maior parte dos trabalhos visa justamente economizar água, esse resultado revela-se bastante interessante” comemora.
Analisando a eficiência do uso da água, na hidroponia, para cada litro de água, são produzidas 2,22 gramas de massa seca (massa vegetal depois de retirada toda a umidade) de parte aérea. Já no sistema convencional, com um litro de água só se produz 1,27 grama de massa seca. “Portanto, nesse quesito, em termos percentuais, a hidroponia representa um ganho de 74%”, afirma Toyosumi.
Redução do custo com água e fertilizante
Apesar de a solução nutritiva no sistema hidropônico necessitar de mais fertilizantes no total, verifica-se, contudo, uma redução do custo final de água e fertilizantes, porque o consumo pela planta é muito menor. “Se compararmos a solução preparada inicialmente, a quantidade de fertilizantes é alta. No somatório, no entanto, o custo da solução nutritiva no sistema hidropônico, para a produção de dez mil mudas, é de R$ 20,81, enquanto que no convencional, fica em R$ 14,22. Só que grande parte dessa solução nutritiva não é utilizada. Aos 18 dias, na verdade, a solução só teve uma redução de 9% da sua condutividade elétrica, causado pelo consumo da planta”, explica a cientista.
O consumo de fertilizante pela planta é obtido multiplicando-se essa redução pela quantidade de fertilizante aplicada. Iumi comprovou que o custo final com esse tipo de insumo ficou em seis reais por dez mil plantas, uma redução de 57% em relação ao sistema convencional.
Menor necessidade de mão de obra
Na hidroponia, tudo é automatizado. A irrigação é realizada automaticamente, com o sistema de recirculação de água, que contém a solução nutritiva. Já, no convencional, a aplicação do fertilizante acontece de forma manual, mais sujeita a erros e desperdícios. Com o agravante de que a quantidade de fertilizante em excesso pode ser tóxica à planta.
O mesmo acontece com a água. Quando a planta é regada, há uma parcela de água que simplesmente é jogada fora, por não ser aproveitada pela planta. Assim, o consumo hídrico no modo convencional torna-se mais elevado.
Para as biofábricas, a redução da necessidade de mão de obra é uma das principais vantagens do sistema. “Não só pelo custo em si, mas, quando se tem um sistema de produção automatizado, diminui muito o risco de erro e aumenta bastante a eficiência do processo. Elimina, por exemplo, a aplicação preventiva de defensivos agrícolas. Se, por alguma falha humana, as mudas receberem mais água do que necessitam, aparecem fungos oportunistas por causa da umidade excessiva, que acabam apodrecendo as plantas. Isso não acontece na hidroponia por haver um fluxo de alta frequência de água em sistema aerado”, compara o pesquisador da Embrapa Maurício Coelho.
Segundo os especialistas, na hidroponia, a mão de obra necessária é apenas para a produção da solução nutritiva e seu monitoramento, que deve acontecer a cada dois dias.
Maior dependência de energia
A única desvantagem do processo apontada pelo pesquisador é a dependência de energia, pois, no caso de algum corte no fornecimento, a água com a solução nutritiva para de circular, colocando em risco a produção. Problema, como ele mesmo afirma, “que pode ser contornado com a instalação de geradores”.
O cientista sugere a adoção de placas solares para o acionamento do sistema de bombeamento. “Se considerarmos que o sistema de produção de mudas é realizado em ambientes fechados, em casas de vegetação, ocorre pleno controle dos gastos. E é possível ser incrementado, por exemplo, com o uso de uma energia limpa, como a solar, melhorando a eficiência do sistema, tornando-o ainda mais sustentável”, recomenda o pesquisador da Embrapa.