De olho na saúde, consumidores mais interessados em gastronomia e valores nutricionais dos alimentos têm procurado consumir mais produtos orgânicos. E um dos destaques desse cenário são as novas variedades de tomate
A oferta de hortaliças, verduras e legumes no Brasil vem passando por mudanças nos últimos anos, seguindo uma tendência dos consumidores, observada aqui e lá fora, que prioriza mais a qualidade dos alimentos que vão ao prato, valorizando suas propriedades nutracêuticas, atribuídas a alguns produtos classificados como funcionais.
“No País, essa tendência tem sido impulsionada pelo crescente interesse pela gastronomia e pela busca, por boa parte da população, de excelência na qualidade de vida e melhor saúde, que inclui, necessariamente, uma alimentação mais saudável e equilibrada”, ressalta o engenheiro agrônomo Carlos Antônio dos Santos, doutorando em Fitotecnia pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ).
Segundo ele, a difusão da agrobiodiversidade oriunda da agricultura orgânica tem criado uma clientela de consumidores receptivos a novidades e lançado novidades que ofereçam mais valor aos alimentos diferenciados, não só quanto ao aspecto e sabor, mas também às boas práticas no campo.
“Hoje em dia, os grandes destaques nas prateleiras dos mercados e nos cardápios dos restaurantes têm sido as hortaliças, além de outros produtos orgânicos, como as mini-hortaliças, alguns alimentos de elevado valor nutricional ou biofortificados e algumas plantas alimentícias não convencionais (PANCs) ou pouco conhecidas pela maioria dos consumidores”, pontua Santos.
Diferenças
De acordo com o engenheiro agrônomo, essas hortaliças se diferenciam pelas cores, formatos e sabores marcantes e inusitados. “Muitos consumidores aprovam tais novidades e se dispõem a pagar um pouco mais por elas.”
Um grande exemplo é o tomate. “As prateleiras dos mercados, atualmente, são repletas de belos frutos vermelhos e graúdos, com excelente aparência e conservação pós-colheita. Este padrão de frutos foi obtido graças a um longo e exaustivo trabalho de melhoramento genético, que levou ao desenvolvimento de várias cultivares híbridas de excelente desempenho agronômico e que produzem frutos de maior longevidade após a colheita”, destaca a engenheira agrônoma Margarida Goréte Ferreira do Carmo, professora titular da UFRRJ.
Apesar dessas virtudes agronômicas e comerciais e de algumas pequenas variações de formato e classificação, seus frutos não têm o sabor “original” do tomate e todos podem ser muito parecidos entre si.
“Em geral, são destinados apenas para consumo em saladas cruas, não possuem sabor pronunciado e não produzem molhos de boa qualidade. Ou seja, apesar dos muitos avanços tecnológicos, não foram obtidos ganhos em termos de sabor e de qualidade culinária. Beneficiou-se toda a cadeia de produção e comercialização, mas não se atentou para a satisfação dos consumidores”, avalia Margarida.
Investir para atrair consumidores
De olho nos interesses dos consumidores, também é preciso melhorar suas características como sabor, textura, cor e versatilidade culinária.
“Para se vislumbrar e obter ganhos nesses quesitos, precisamos revisitar o ‘tomate antigo’, pois algumas variedades antigas produzem frutos com sabores mais ricos e mais doces, além de outros componentes que foram perdidos ao longo do tempo”, comenta o engenheiro agrônomo Antonio Carlos de Souza Abboud, professor titular da UFRRJ.
Segundo o docente, hoje há um espaço ou nicho aberto que precisa ser preenchido com o resgate ao “sabor original” do tomate. “Nicho esse formado por consumidores que valorizam sabor, valor nutritivo, riqueza estética e, na maioria das vezes, também a forma como foram produzidos.”
Variabilidade genética
Embora a grande maioria dos produtores rurais e consumidores desconheça, existe uma grande variabilidade genética na espécie de tomate Solanum lycopersicum, com características diferenciadas, que precisam ser divulgadas e melhor aproveitadas, dentre elas a diversidade de seus frutos.
Para tanto, a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro mantém, desde a década de 90, em seu Instituto de Agronomia, uma coleção com mais de 400 acessos de tomateiros que são, em grande parte, “tomates antigos” e tradicionais, que foram preservados e passados de geração em geração.
“Além da preservação desse valioso material genético, vários trabalhos de pesquisa e de divulgação vêm sendo feitos. Dentre as principais pesquisas desenvolvidas estão trabalhos de caracterização dos atributos morfológicas das plantas e de seus frutos, de avaliação da resistência genética das plantas às principais doenças da cultura e de métodos de cultivo e de manejo, especialmente em sistemas orgânicos de produção”, informa a professora Margarete Ferreira do Carmo.
Como atividade de pesquisa e de divulgação, “também têm sido feitas avaliações sensoriais e de aceitabilidade por consumidores e chefs de cozinha”.
Projetos de pesquisa e divulgação
Os projetos de pesquisa e divulgação desenvolvidos na UFRRJ envolvem alunos de graduação, mestrado e doutorado, além das parcerias com outras instituições, como a Empresa de Pesquisa Agropecuária do Rio de Janeiro (Pesagro) e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).
“Como exemplo, podemos citar a tese ‘Variabilidade fenotípica de acessos de tomate cereja sob manejo orgânico: características agronômicas, físico-quí micas e sensoriais’, desenvolvida pela engenheira agrônoma Mariella Camargo Rocha, uma parceria da equipe da Universidade com a Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ)”, informa o professor.
Tomate cereja orgânico
Nesse trabalho, foi possível identificar acessos de tomate cereja, promissores para o cultivo orgânico, por apresentarem características diferenciadas em coloração (rosa, amarelo, marrom, bicolores, tricolores), formato (oblongo, pera, achatado, globular, alongado e ameixa), além de alto teor de sólidos solúveis (expresso em °Brix) e de carotenoides.
“Os frutos redondos e com coloração vermelha a rósea foram os mais aceitos pelos consumidores, possivelmente pelo conservadorismo. Entretanto, formatos menos comuns (como o de pera) e oblongos e cores atípicas (como amarelo e alaranjado) também agradaram aos consumidores e, principalmente, chefs de cozinha”, informa o engenheiro agrônomo Carlos Antônio dos Santos, doutorando em Fitotecnia pela UFRRJ.
Mais doce e mais vermelho
Frutos com maior doçura e mais vermelhos, devido ao maior teor de licopeno, conhecido por suas propriedades antioxidantes, são os mais conhecidos e valorizados.
“Outros sabores e cores passam a ganhar espaço com a expansão da alta gastronomia e da arte na decoração dos pratos”, diz Santos.
O aumento da demanda por frutos variados tem incentivado algumas empresas produtoras de sementes, no Brasil, a investirem nesse segmento e a disponibilizarem linhas especializadas de tomates ou diferenciados quanto à cor, formato e sabor mais pronunciados.
“O trabalho de preservação e divulgação desta riqueza genética, porém, precisam ser incentivados e financiados”, alerta a professora Margarete.
Opções de mercado
Conforme Santos, tomates diferenciados – com cores, formatos e sabores inusitados – são novas e excelentes opções para o mercado: “Essas variedades, no entanto, são próprias para circuitos curtos de comercialização, pois apresentam peles mais delgadas, polpas mais finas e doces, o que resulta em menor tempo de pós-colheita”.
Para o pequeno produtor, são opções interessantes por apresentarem alta demanda e elevado valor agregado. Carlos Antônio dos Santos explica que para os consumidores, elas representam oportunidade de desfrutarem de novos sabores e experiências.
A produção e o preparo de alimentos também podem ser vistos como uma arte, na medida em que despertam e aguçam diferentes sentidos, desde o tato à visão e olfato, mas principalmente o paladar, com a oferta de diferentes texturas, cores, formatos, aromas e sabores”, finaliza Santos.