Trio de variedades convencionais de algodão do Brasil apresenta competitividade produtiva a baixos custos, em três regiões dos Estados Unidos, onde prevalecem cultivo do produto transgênico
A “Terra do Tio Sam” tem se mostrado produtiva em relação ao cultivo de três variedades convencionais de algodão – BRS 286, BRS 293 e BRS 335, desenvolvidas pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Os testes, que já apresentam baixos custos de produção, vêm sendo realizados nos estados de Mississipi, Tennessee e Texas, nos Estados Unidos.
“Os primeiros testes demonstraram a excelente qualidade da genética da Embrapa”, garante o engenheiro agrônomo Rafael Vivian, gerente-adjunto de Mercado da Embrapa Produtos e Mercado (GO).
Conforme o especialista, que também é mestre em Fitotecnia e doutor em Agronomia, “a introdução de cultivares convencionais nos EUA, onde 98% dos plantios são do produto transgênico, é uma conquista para o Brasil participar do mercado internacional de sementes de algodão”.
Para ele, é importante um produto nacional adentrar em um território onde prevalece a transgenia: “Além de introduzir a genética brasileira em um país com longo histórico no cultivo de algodão, estamos rompendo barreiras culturais na adoção de uma tecnologia genuinamente tradicional”.
Parceria
Um contrato de licenciamento para multiplicação e exploração comercial, em território norte-americano, de sementes das BRS’s 286, 293 e 335, foi firmado em janeiro de 2017, entre a Internacional Seed Tecnology (IST) e a Embrapa, por meio da unidade da estatal de Produtos e Mercado.
Essa parceria entre as duas empresas começou em julho de 2015, quando foi assinado um Acordo de Cooperação Técnica com o objetivo de avaliar, selecionar e finalizar o desenvolvimento de cultivares BRS ou linhagens convencionais de algodão da Embrapa, para registro e exploração comercial nos EUA. Foi dessa forma que as três variedades da estatal brasileira foram cultivadas, pela primeira vez, em solo norte-americano
Relação custo-benefício
O interesse pelas sementes não transgênicas do Brasil, conforme o engenheiro agrônomo Rafael Vivian, se deve ao fato de que os produtores rurais dos EUA encontraram, nas cultivares convencionais brasileiras, uma excelente oportunidade para voltar a cultivar o produto tradicional. O principal incentivo está na relação custo-benefício.
De acordo com o pesquisador da Embrapa Produtos e Mercado, o custo de semear um hectare de algodão geneticamente modificado, nos EUA, gira em torno de 250 dólares por hectare, incluindo uma taxa tecnológica de 200 dólares na mesma medida, que representa os royalties que as empresas de sementes cobram do produtor pelo uso da transgenia, mais o valor das sementes que é de 50 dólares por hectare.
“Quanto às cultivares convencionais (não transgênicas), essa despesa não chega a 50 dólares por hectare, que é o custo da semente, apenas”, compara o agrônomo Valdinei Sofiatti, chefe-adjunto de Transferência de Tecnologia da Embrapa Algodão (PB), unidade responsável pelo desenvolvimento das três cultivares de algodão brasileiro.
Opção atraente
As cultivares convencionais fornecidas pela Embrapa são mais atraentes, porque as transgênicas, comuns na “Terra do Tio Sam”, já não apresentam os mesmos benefícios de antes, especialmente no que diz respeito ao manejo de lagartas e de plantas daninhas.
Mestre em Ciência e Tecnologia de Sementes e doutor em Fitotecnia na área de Produção Vegetal, Sofiatti explica que as lagartas deixaram de ser um problema sério, mas a planta daninha Amaranthus palmeri vem resistindo ao herbicida glifosato, utilizado para esse tipo de controle no campo, no passado.
“Alguns agricultores norte-americanos já não veem razão para pagar caro por uma tecnologia que não resolve seus problemas mais sérios, antes controlados com eficiência pela transgenia”, reforça o pesquisador.
Pragas
Nos EUA, a baixa incidência de lagartas nas lavouras de algodão está ligada à erradicação de outra praga: o bicudodo-algodoeiro. livres desse principal inseto, que assolava a cotonicultura estadunidense, os produtores rurais reduziram a quantidade de aplicações de inseticidas no meio rural.
Como consequência, outros insetos inimigos naturais das lagartas, antes dizimados pelo inseticida, foram preservados. Agora, conforme explica Sofiatti, eles promovem um controle natural das lagartas, cuja incidência permanece abaixo do nível de dano econômico.
“A única forma de ser competitivo em qualquer mercado é ter um custo de produção mais baixo”, ressalta o pesquisador, salientando que os benefícios da transgenia são insuficientes para cobrir o custo da taxa tecnológica.
Alguns cotonicultores norte-americanos, por isso, estão procurando plantar as variedades convencionais, hoje muito raras em seus territórios. “Daí a oportunidade para nossos materiais”, reforça Sofiatti.
Fortalecimento da marca
Na visão do pesquisador Rafael Vivian, da Embrapa Produtos e Mercado, a introdução das cultivares nacionais nas lavouras norte-americanas deve fortalecer a marca da estatal. isso porque os materiais brasileiros estão protegidos, naquele país, pelo Departamento de Agricultura dos Estados unidos (USDA, sigla em inglês), órgão equivalente ao Ministério da Agricultura brasileiro, que regulamenta o registro de cultivares na “Terra do Tio Sam”.
De acordo com Vivian, os benefícios também serão financeiros, graças aos recursos provenientes da propriedade intelectual dessas cultivares de algodão. Ele acredita que, nos próximos anos, os plantios da Embrapa devem ocupar maior número de áreas, especialmente no Texas, principal produtor dos EUA, com cerca de dois milhões de hectares e uma produtividade média que, hoje, não ultrapassa os 1,5 mil quilos por hectare.
“É um índice produtivo baixo, porque chove muito pouco e de forma irregular”, relata o pesquisador.
Mesmo com a falta de chuvas, as variedades de algodão do Brasil têm potencial produtivo semelhante às norte-americanas. Por causa disso, Vivian confia que as cultivares nacionais possam, em curto prazo, ser boas opções para a exploração comercial nas regiões que integram o chamado “Cinturão Algodoeiro dos Estados Unidos”.
Fontes: Embrapa Algodão e Embrapa Produtos e Mercado