A suplementação mineral bem utilizada possibilita que todo potencial produtivo da forragem seja aproveitado
Uma técnica usada há décadas na pecuária de corte brasileira é a mineralização do rebanho. Apesar disto, parece que algumas informações distorcidas ainda prevalecem no meio.
O objetivo da lista abaixo é, ao esclarecê-las, contribuir para o melhor uso da técnica. São dez pontos que elencamos como “mitos”, ou seja, algo “que não tem existência real ou passível de ser provada”, conforme uma das definições do dicionário “Caldas Aulete”. Vamos a eles:
Mito 1: “Sal mineral é tudo igual!”
Um sal mineral é uma mistura de vários elementos, óxidos e sais à disposição no mercado. Comprá-los e misturá-los é algo dentro das possibilidades de quase qualquer terráqueo. Mas, então, por que isso é mito? O que pode diferenciar um sal mineral de outro? O primeiro ponto seria a formulação do sal (as quantidades de cada matéria-prima visando à determinadas concentrações finais dos nutrientes no produto). Um produto mal formulado, isto é, com níveis de garantia furados e consumo mal planejado, não será eficaz. Assim, mesmo que o animal o consuma, não será atingido o objetivo de atender suas exigências minerais.
Outra questão, ainda muito mais comprometedora, é que existem inúmeras armadilhas no mercado em relação à matéria-prima. Ainda que algumas delas possam ser evitadas com uma análise de laboratório, outras podem ter um laudo perfeito do laboratório, mas o nutriente não ser assimilável (não ser biodisponível, no jargão técnico).
Outros diferenciais seriam a qualidade da mistura, fontes mais nobres de matéria-prima, tipo de apresentação (granulado, floculado), resistência ao empedramento e algo que tem feito muita diferença: apoio técnico da empresa ao produtor.
Mito 2: “O animal sabe que mineral precisa!”
Este é um dos mitos mais difusos e duradouros. Já foi amplamente comprovado por pesquisas que o animal, voluntariamente, não seleciona minerais dos quais esteja deficiente.
Exatamente por isto que precisamos colocar todos juntos, de maneira bem formulada para que eles os consumam. Como o sódio é o único mineral que efetivamente o animal mostra desejo em consumir, o cloreto de sódio virou o veículo ideal para ajudar nesta tarefa (Ver Mito 5).
Mito 3: “O mineral que importa no sal, mesmo, é o fósforo”
Segundo um extenso levantamento realizado pela Embrapa Gado de Corte, 100% das forrageiras analisadas teriam valores muito baixo de sódio (< 0,1% da matéria seca), que predisporiam deficiência. Nesta mesma pesquisa, o fósforo ficou em quarto lugar, com 72% das amostras abaixo de 0,12% da matéria seca, zinco, com 96% das amostras menor do que 20 ppm (2º lugar), cobre com 82% menor que 4 ppm (3º lugar) e cálcio com 38% menor que 0,2% da matéria seca (5º lugar), completam a lista.
Não foram avaliados nesta pesquisa cobalto, iodo e selênio, todos com histórico de deficiência e resposta a suplementação no Brasil. Fica claro, então, que o fósforo não é o único mineral que devemos nos preocupar.
Como todos podem limitar a produção, devemos nos preocupar com cada um deles, bem como nos preocupar que estejam balanceados, sem grandes excessos que possam predispor a problemas de absorção (um mineral em excesso, prejudica a absorção de outro).
Mito 4: “Quanto maior a concentração em minerais, melhor é o sal! Esse é o critério que eu uso na compra!”
Ao comparar dois produtos, é comum o produtor optar por aquele que tenha valores de níveis de garantia dos nutrientes mais altos. A lógica seria que, se eles têm maiores concentrações, o animal vai ter mais deste mineral à disposição.
O que “fura” esta lógica é o consumo. Se o sal tem 90 gramas de fósforo por quilograma do produto, isto apenas significa qual a concentração dele e não o quanto está à disposição do animal, o que vai depender da quantia que ele ingere deste sal mineral.
Assim, se este sal tem um consumo de 60 gramas/cabeça/dia, o consumo de fósforo pelo animal é de 5,4 g/cabeça/dia. Um sal com 88 de fósforo por quilograma do produto, mas com consumo de 70 gramas/cabeça/dia, suprirá com 6,16 gramas de fósforo por dia ao animal, quase 1 g a mais do que o de 90.
Lembre-se: o animal não come concentração, ele come o sal!
Mito 5: “Só o sódio basta para acertar o consumo”
Este é um mito que todo nutricionista gostaria de acreditar, pois a única forma de formular o sal é considerar que isto seja verdade. Enfim, precisamos de uma referência e a melhor que temos é o teor de sódio. Esta referência até funciona bem, no sentido de que, ao fazermos a média de muitos dados de consumo, há uma convergência para que o valor obtido se aproxime daquele que atenda às exigências de sódio.
Assim, para estimar o consumo de um mineral, basta identificar qual o consumo necessário para atender às necessidades de sódio. Por exemplo, considerando como 10 g de Sódio a exigência de uma unidade animal (um animal com 450 kg), se o sal fornecido a ele tem 200 g de sódio por quilograma do produto, o consumo esperado deste produto é de 50 gramas/cabeça/dia.
O cálculo é uma “regra de três”: Se em 1 kg do produto temos 200 g, quantos quilos do produto preciso para ter esses 10 g ou, simplesmente, 10 g/cab/dia dividido por 200 g Sódio/kg produto = 0,05 kg produto.
Mito 6: “Regulando o consumo pelo teor de sódio, não há necessidade de monitorar o consumo”
O problema de os nutricionistas precisarem tanto desta referência é que ela passa, muitas vezes, a ser uma referência absoluta. A realidade nos mostra que o consumo de minerais é muito variável e que tal variabilidade é pouco previsível. O que esta realidade nos impõe é monitorarmos o consumo, de preferência, de piquete à piquete e, na pior das hipóteses, ter a média da fazenda no ano. (neste link há um exemplo deste cálculo: http://sites.beefpoint.com.br/sergioraposo/2013/12/26/cinco-dicas-basicas-para-ter-uma-producao-melhor-em-2014/)
Mito 7: “As empresas usam palatabilizantes para aumentar consumo”
O consumo de minerais interessa, sim, às empresas, pois quanto maior for o consumo, maiores serão suas vendas. Todavia, não há pior propaganda para uma empresa do que ela ter sais minerais com fama de alto consumo, pois isto é um fator altamente desestimulante para os compradores. Aliás, nunca há reclamação por consumo abaixo do valor recomendado, apenas quando ele fica acima.
Ocorre que o maior prejuízo ao pecuarista, em geral, acontece pelo não aproveitamento total do benefício de “zerar” as deficiências minerais. Desta forma, é interessante que algum palatabilizante seja utilizado na formulação.
Adicionalmente, resultados de pesquisas mostram que ele ajuda a uniformizar o consumo, o que é muito desejável. (Mais informações sobre consumo uniforme do lote no texto: http://sites.beefpoint.com.br/sergioraposo/2013/09/17/mineralizacao-
de-animais-em-pastagem-assunto-encerrado/ )
Mito 8: “Mineralizar faz diferença mesmo na seca!”
As vendas de sal mineral crescem na época que antecede a estiagem, mostrando claramente que o produtor tem elevada sua preocupação com os pastos mais pobres da seca.
A crença por trás disso seria que, uma vez que a pastagem estaria com níveis mais baixos de minerais (o que é fato), consequentemente, seria necessário dar mais minerais ao animal para compensar. Todavia, o que ocorre na seca é que não adianta fornecer apenas os minerais, porque o nutriente mais limitante é a proteína.
Há, inclusive, dados de pesquisas mostrando não haver diferença entre fornecer sal mineralizado e apenas sal branco aos animais na época da seca.
A lógica é que a exigência dos minerais para manter ou perder peso na seca é tão baixa que o pouco existente na pastagem já resolve. O conceito importante aqui é o seguinte: quanto maior a produção, maior a necessidade de nutrientes (inclusive minerais). Por isto, a época que mais merece preocupação do produtor com a suplementação de minerais é nas águas. Na seca, também devemos estar atentos, mas usando sal com ureia e proteinado, resolvendo primeiro o fator mais limitante.
Mito 9: “Se não usar cocho coberto, melhor nem mineralizar!”
Cochos cobertos, bem assentados, bem localizados, que não fiquem ilhados por acúmulo de água ajudam muito os lotes por eles atendidos a terem bom consumo e devem ser o padrão a ser alcançado. Todavia, o pior cenário não é ter o sal mineral molhado pela chuva, mas a falta de espaço linear mínimo de cocho.
Recomenda-se oferecer, no mínimo, seis centímetros lineares de cocho para cada unidade animal atendida por este cocho.
Entre ter o sal preservado da chuva e dar acesso ao sal a todos os animais, mesmo que molhado, dê preferência à segunda opção. Ainda assim, ao usar cochos não cobertos, é aconselhável ter um monitoramento (e abastecimento) mais intensivo, uma vez que a umidade ajuda a empedrar o sal, o que prejudica seu consumo.
Mito 10: “Bobagem gastar com sal mineral! Um amigo parou de mineralizar e não notou diferença nenhuma!”
Este é um mito para o qual basta o tempo para que seja derrubado. Às vezes, nos deparamos com alguém que está fazendo este “teste” e é possível que, em algum lugar no Brasil, de fertilidade natural muito alta e cujo produtor se contente com índices produtivos medíocres, que o “teste” funcione por um bom tempo, alongando a “vida útil” do mito.
O confronto entre os níveis usualmente encontrados dos minerais nas forragens brasileiras e a exigência cada vez maior, à medida que melhoramos o manejo das pastagens e a genética dos animais fazem com que possamos esperar que gradativamente este tipo de “teste” dure cada vez menos.
Um bom uso da técnica de suplementação mineral permite o aproveitamento de todo o potencial produtivo da forragem. Ajudar este aliado da produção a nos facilitar é altamente compensador. Ter estes conceitos corretos “na ponta da língua” ajudam a deixar o sal na ponta da língua dos animais e “o azul mais vivo” na conta da fazenda.