Em 1992, em Santa Catarina, a tradição bem europeia da união entre produtores produziu uma nova semente, a Gemüse Fest. Numa época de dificuldades econômicas, a festa serviu para trazer de volta à região produtores para debaterem formas de desenvolvimento local. Apenas quatro anos se passaram para que a Associação dos Agricultores Ecológicos das Encostas da Serra Geral (Agreco) fosse fundada, integrando cada vez mais agricultores em torno da produção orgânica.
Recentemente, a Associação também se tornou um dos mais novos filiados do projeto OrganicsNet, e nesta edição A LAVOURA conversou com Adilson Lunardi, gerente comercial, para mostrar a trajetória da Agreco – um exemplo de que é possível a união de produtores com uma meta em comum: dividir despesas, trabalho mas também o desenvolvimento econômico, aliado à conservação de toda uma região.
A Lavoura: Como foi o início da Agreco?
A Associação dos Agricultores Ecológicos das Encostas da Serra Geral foi fundada no município de Santa Rosa de Lima, em Santa Catarina, 130 km ao sul de Florianópolis. Ela surgiu do desejo de mudança de agricultores e lideranças que discutiam soluções para as crises econômicas cíclicas na cidade. Em 1992, foi realizada a primeira Gemüse Fest com o objetivo de chamar os que haviam saído de Santa Rosa de Lima para realizar um congraçamento entre urbano e rural, além de discutir alternativas para o desenvolvimento rural. Em 1996, já com várias edições da Gemüse Fest, foi fundada a Agreco.
A Lavoura: Por que decidiram optar pela produção orgânica, apesar das peculiaridades deste mercado? Comente sua experiência até agora.
Com o relevo montanhoso da região das Encostas da Serra Geral e com as pequenas propriedades, a estratégia de viabilidade foi o trabalho com produtos diferenciados. Em uma edição da Gemüse, um empresário de uma rede de super mercados fez uma proposta de compra para produtos orgânicos, pois já havia visto tal tendência em uma viagem à Europa.
A Lavoura: Onde se localizam as principais áreas de produção?
Após dois anos de atividade e cresci mento, a AGRECO expandiu suas atividades para além de Santa Rosa de Lima. Hoje são oito municípios das encostas da Serra Geral que têm agroindústrias e lavouras com produção orgânica. Este território tem uma Mata Atlântica abundante, com mais nascentes e rios do que habitantes. Todas as agroindústrias são localizadas no meio rural como estratégia de levar infraestrutura a áreas até então desfavorecidas, além de ocupar a região com atividades limpas para preservar as riquezas naturais.
A Lavoura: Como foi o processo de atrair e organizar os diferentes anseios dos produtores?
Inicialmente o associativismo foi em torno da viabilidade de uma atividade. Após, foi se construindo um espírito de solidariedade entre os agricultores em torno das relações sociais e meio ambiente. Em 1998, um projeto com apoio dos governos e outras parcerias, como Universidade Federal de Santa Catarina, estruturou uma rede de agroindústrias para a agregação de valor à produção. Hoje são 22 agroindústrias de pequeno porte, todas como propriedade das famílias de agricultores.
A Lavoura: Ainda existem áreas com produção convencional, mas há planos ou possibilidade de ampliação das certificações orgânicas?
Ano a ano a Agreco cresce em produção e número de associados. A ampliação é feita de forma consistente, observando a demanda para garantir que a produção terá venda garantida.
A Lavoura: Como lidam com os custos de certificação?
Considero o ano de 2003 como um marco, pois a Agreco recebeu sua primeira certificação. Ela é realizada pela Ecocert-Brasil, no sistema de auditoria m grupo. Somamos todos os custos e dividimos por cada projeto (produtor individual ou agroindústria) para chegar ao valor anual do rateio. Em 2009, tivemos um custo para cada projeto de R$ 175,00.
Lavoura: Como está a produtividade das áreas orgânicas?
Temos presenciado aumento de produtividade ano a ano. Muito deste resultado está ligado à experiência do agricultor que aprende no dia-a-dia e busca aperfeiçoamento constante. Com alguns produtos, como hortaliças, alcançamos uma produtividade similar ao convencional, e muitas vezes com custo mais baixo. Culturas mais exigentes em manejo, como o tomate, também estão atingindo níveis de produtividade satisfatórios. O frango orgânico é um exemplo de produto que tem produtividade muito diferente em comparação ao convencional. A criação das aves soltas é o fator que mais contribui para o aumento do tempo de produção e maior consumo de ração por quilo de carne.
A Lavoura: Como é feita a adaptação dos produtores nas práticas orgânicas?
Com cursos, intercâmbios e assistência técnica. O Ministério da Agricultura é o maior parceiro na viabilização de recursos para estas ações.
A Lavoura: O que esperam ao se juntar ao OrganicsNet?
Esperamos fortalecer a marca Agreco e acessar informações de merca dos e práticas do setor de orgânicos. Em 2010 queremos iniciar exportações e certamente o auxílio da OrganicsNet será valioso.
A Lavoura: Quais as vantagens que você vê numa associação de produtores?
Na nossa realidade, é a única maneira de viabilizar a comercialização. Com a associação é possível ganhar escala para assumir contratos comerciais, otimizar a logística e captar recursos para qualificar a produção.
A Lavoura: Quais são os principais produtos da Associação?
Mel, melado, açúcar mascavo, conservas de legumes, geleias de frutas, molho tomate, frango e hortaliças.
A Lavoura: Como avaliam o potencial produtivo de cada região?
Cada comunidade já indica sua vocação. Nosso trabalho implica em comunicar as demandas do mercado e mobilizar a produção para gerar renda com uma atividade limpa que agrade o produtor.
A Lavoura: Foi necessário algum trabalho de recuperação de áreas degradadas? Como procederam?
Temos solos exauridos pelo manejo convencional em algumas propriedades. O trabalho de recuperação se deu de forma lenta e simples com o uso de adubação verde e esterco no manejo da produção orgânica.
A Lavoura: Comente um pouco sobre os projetos da Agreco.
Observamos que existe uma grande oportunidade de crescimento neste momento. Nossa estratégia é diversificar os nichos de mercado aproveitando a grande variedade de produtos marca Agreco.
A comercialização em redes de Supermercado é nosso principal segmento, seguido pelo Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS). Em 2010 queremos realizar a primeira exportação, fortalecer nossa entrega em domicílio e a venda para lojas de pequeno e médio porte.
Acredito também que a lei 11.947, que trata sobre a compra de alimentação escolar de produtos da agricultura familiar, também será um segmento importante.
Lavoura: Como é feita a divulgação dos orgânicos da Agreco para o público?
Temos um site com muitas informações, participação em feiras e publicidade espontânea em várias mídias.
Lavoura: Quais os maiores obstáculos ao comércio de alimentos em sua região? Transportes, preços, economia, etc.?
O consumo de orgânicos em Santa Catarina está concentrado nas maiores cidades. O transporte para outros estados ainda é um desafio, pelo alto custo e atrasos nas entregas.