Sistema de produção facilita o cultivo de ora-pro-nóbis para pequenos agricultores, tornando-se boa opção de diversificação de renda
Técnica desenvolvida pela Embrapa Hortaliças e testada com pequenos produtores brasileiros consiste em um sistema de produção própria para cultivar ora-pro-nóbis. A técnica trouxe facilidade nos tratos culturais e permitiu uma colheita escalonada ao longo do tempo.
O pesquisador Nuno Madeira explica que o sistema “consiste em fazer o plantio adensado – para garantir maior produtividade por área – programando colheitas sucessivas para manter a arquitetura da planta controlada e evitar emaranhados de galhos e espinhos”.
Segundo ele, com o crescente interesse dos consumidores pela hortaliça – que é uma PANC (Planta Alimentícia não Convencional) – e, também, por sua inserção em cardápios de restaurantes de alta gastronomia do eixo Rio-São Paulo, surgiu um bom nicho de mercado.
“Para viabilizar a oferta do produto, foi validado o sistema de plantio adensado – até cinco mil plantas por hectare – com colheitas sucessivas que permitem a condução dessa espécie de forma mais simples e eficaz pelo produtor rural. O espaçamento anterior resultou em cerca de 1.250 plantas por hectare.”, relata o pesquisador.
Mais vantagens
Outra vantagem do sistema da Embrapa Hortaliças, de acordo com Madeira, é que ele dispensa a necessidade de tutoramento da planta para colheita das folhas, já que prevê a poda de hastes.
“O ora-pro-nóbis é uma planta muito rústica e com bom potencial produtivo, sendo opção de diversificação de renda e de cultivo, especialmente para o agricultor familiar, uma vez que a produção em larga escala é dificultada pelas próprias características da planta, já que exige intensa mão de obra”, sugere o pesquisador.
Colheitas sucessivas
O pesquisador Nuno Madeira revela que a planta pode chegar a atingir mais de quatro metros de altura, “por isso, as colheitas sucessivas, a cada seis ou dez semanas, dependendo das condições climáticas, devem ser manejadas como podas, pois além de facilitar o manejo da planta espinhosa e garantir ergonomia para o produtor, estimulam o desenvolvimento vegetativo e a produção comercial de folhas”, orienta.
Ele afirma que nos experimentos da Embrapa Hortaliças, a produção atingiu até dois quilos de folhas por planta a cada corte, com quatro a oito cortes anuais – o que equivale a 20 a 40 toneladas por hectare ao ano.
“A planta pode se manter produtiva por até dez anos, mesmo com pressão por alta produtividade, desde que sejam feitas adubações periódicas com matéria orgânica”, sublinha.
Saiba mais dicas sobre o cultivo do ora-pro-nóbis em
Ele acentua que, por ser uma planta da família dos cactos, o ora-pro-nóbis cresce como um arbusto, com espinhos agudos, distribuídos ao longo dos caules e ramos, o que dificulta o caminho pelos agricultores.
“Em geral, os produtores não consideram lavouras de ora-pro-nóbis pela dificuldade de lidar com a planta espinhosa”, frisa.
E completa: “apesar de muito nutritiva, costuma ser utilizada somente como cerca-viva ou, em regiões específicas, como ingrediente de receitas tradicionais em cidades históricas, principalmente as de Minas Gerais, como Diamantina, Tiradentes e Sabará”.
Grande teor de proteína
Neide Botrel, pesquisadora da Embrapa, destaca que o ora-pro-nóbis, também conhecido por lobrobó ou pereskia, é considerado uma planta alimentícia não convencional (PANC) e apresenta um teor relevante de proteína.
“É um alimento de origem vegetal com cerca de três gramas de proteína a cada 100 gramas de folhas”.
Ela completa que “embora esse valor seja equivalente em outras hortaliças, como rúcula e agrião e, também, em folhas de cores verde-escuras, a qualidade da proteína do ora-pro-nóbis é melhor porque apresenta mais complexidade nutricional e maior valor biológico para o organismo porque contém aminoácidos essenciais em quantidade e comportamentos adequados”, destaca a pesquisadora Neide Botrel.
Confira mais sobre o valor nutricional do ora-pro-nóbis em:
Além da parte agronômica, a pesquisa também obteve resultados na área de pós-colheita, com testes que indicaram a condição ideal para prolongar a vida útil das folhas de ora-pro-nóbis. De acordo com Neide, quando embaladas em bandejas de isopor com filme de plástico e armazenadas à temperatura de 10ºC, as folhas preservam a qualidade por até 15 dias.
Matéria-prima para a indústria alimentícia
Se em Minas Gerais, toda a tradição da receita do frango ensopado com as suculentas folhas de ora-pro-nóbis, nos demais estados do Brasil essa hortaliça ainda é pouco explorada na agricultura e na culinária, seja na forma fresca ou processada.
“Contudo, uma parceria firmada entre a Embrapa Hortaliças e a empresa Proteios, da área de nutrição funcional, pretende mudar esse cenário”, acredita o pesquisador Madeira.
A partir do sistema de produção validado pela pesquisa, agricultores familiares da região do município de Palmeira, distante 80 km de Curitiba, capital do Paraná, iniciaram o cultivo da hortaliça para oferecer à empresa, que fabrica um produto denominado Complemento Nutricional Funcional (CNF), uma proteína vegetal em pó composta, principalmente, por folhas de ora-pro-nóbis.
“Esse produto é uma espécie de farinha utilizada para enriquecer bebidas e alimentos como pães, massas e barras de cereais. O destaque da composição nutricional é a concentração elevada de proteína, que gira em torno de 28% da matéria seca”, ele explica.
Produção integrada
Segundo Madeira, o trabalho realizado em 2017, apresentou bons resultados “porque a produção está integrada com a indústria e próxima da fábrica processadora”.
Durante um estudo na época, cerca de 50 produtores realizaram a colheita em, pelo menos, oito municípios do Paraná e Santa Catarina. Sendo um hectare por família, com o ora-pro-nóbis entrando como alternativa de diversificação de renda.
O pesquisador esclarece que a grande maioria desses produtores cultivava fumo e, além do histórico de vender para a indústria em sistema de produção contratada, eles também tinham experiência com o processo de secagem das folhas em estufas para desidratação.
No sistema de produção validado pela Embrapa, a projeção de rendimento era de até R$ 4 mil por hectare cultivado, no caso da folha verde, em valores corrigidos de 2023.
Na comparação, oito quilos de folhas verdes rendem um quilo de folhas desidratadas. Nesse caso, investir em equipamentos de secagem é o indicado, pois agrega valor ao produto.
Na época do estudo, a empresa pagava R$ 24,5 por quilo de folha seca (em valores corrigidos), enquanto a folha verde rendia somente 8% desse valor – cerca de R$ 2 por quilo.
Segurança alimentar
Madeira destaca ainda que, quanto à segurança alimentar, a Embrapa recomenda fazer a poda apical ou “quebra da ponta” dez dias antes da colheita da pressa para consumo dos próprios agricultores.
Em sua opinião, essa prática, além de oferecer um alimento nutritivo para o produtor, permite maior rendimento das folhas da pressa pelo aporte de nutrientes direcionados para elas e não mais para o ápice, que foi podado.
“Antes, o potencial do ora-pro-nóbis era subutilizado, já que na Região Sul não havia tradição de consumir a planta”, ressalta.
Além do ora-pro-nóbis, outras hortaliças não convencionais” são estudadas pela Embrapa, como almeirão-de-árvore, amaranto, anredera, azedinha, beldroega, bertalha, capuchinha, cará-do-ar, caruru, fisális, jambu, major-gomes, mangarito, maxixe-do-reino, muricato, peixinho , serralha, taioba e vinagreira.