Cientistas encontram uma levedura capaz de controlar a ação do Botryosphaeria dothidea, fungo causador da podridão peduncular da manga. Por substituir a aplicação de químicos, o biocontrole também viabiliza exportação do fruto a vários países
Uma levedura que inibe o Botryosphaeria dothidea, importante fungo responsável pela podridão peduncular da manga, acaba de ser descoberta pelos pesquisadores Bernardo Halfeld Vieira, Daniel Terao e Kátia Nechet, da Unidade Meio Ambiente da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).
O microrganismo não é controlado por métodos convencionais de aplicação de químicos ou tratamento térmico pós-colheita. Por essa razão, a descoberta dos cientistas é capaz de gerar uma solução para o problema sem deixar resíduos químicos nos frutos o que, além de ser mais saudável à saúde humana, evita barreiras internacionais de países que não aceitam tratamentos químicos.
Vieira ressalta que esse patógeno é capaz de inviabilizar a exportação de manga no primeiro semestre do ano. Isso depende das condições climáticas, principalmente das chuvas na época da floração e início de frutificação.
O biocontrole por meio do uso da levedura mostrou ser mais eficiente que o tratamento químico com o fungicida tiabendazol, normalmente utilizado. Não foi detectada produção de nenhuma substância inibitória pela levedura, portanto, não há envolvimento de um princípio ativo.
Controle biológico
O agente de controle biológico Candida membranifaciens foi a levedura que apresentou maior eficácia quando comparado ao fruto tratado com fungicida durante o período de armazenamento de onze dias.
Em contraste, os frutos-controle (sem tratamento com o fungicida e sem aplicação da levedura) estavam completamente podres antes do fim do experimento.
“Não há ainda uma previsão de custo porque foram feitos apenas testes experimentais, não existe ainda um produto formulado”, explica o pesquisador.
O tratamento convencional é feito apenas à base de fungicidas. O que é usado atualmente combina o hidrotérmico, por imersão da fruta em água quente, com o uso de fungicidas, que deixa resíduos químicos e não tem se mostrado eficaz no controle da doença.
“O estudo demostrou que a competição, assim como a formação de uma camada de levedura nos possíveis locais de infecção após a colonização, desempenha um papel importante na redução da severidade da podridão peduncular da manga”, conta Vieira.
A aplicação
O pesquisador Daniel Terao prevê que seja feito um tratamento combinado entre o hidrotérmico com a aplicação posterior do produto biológico.
Os frutos seriam tratados primeiro por aspersão de água quente, sobre escovas rolantes, a uma temperatura adequada e por curto intervalo de tempo, para controlar o fungo sem afetar a qualidade da fruta, seguido de resfriamento com água fria, para interromper o efeito da temperatura elevada.
Em seguida, seria feita a aplicação do biocontrolador, por aspersão da suspensão da levedura via spray, na concentração recomendada. O especialista frisa que os parâmetros e o protocolo de tratamento estão em fase de desenvolvimento.
Levedura forma barreira contra fungo
Os resultados mostram que o mecanismo responsável pelo controle da doença por leveduras não está relacionado nem à antibiose (atuação de substâncias produzidas pela levedura) nem ao parasitismo.
Os cientistas explicam que o resultado é obtido porque a levedura realiza uma competição com o fungo da podridão, formando um filme no local onde o patógeno faz a infecção. Isso forma uma barreira mecânica entre a superfície de um ocasional ferimento na casca e o patógeno, promovendo um controle biológico eficaz contra patógenos pós-colheita.
“As leveduras são capazes de competir pelos recursos essenciais necessários para o crescimento do fungo da podridão, em uma etapa antes da penetração do patógeno, afetando a sua capacidade em causar infecção”, detalha o pesquisador da Embrapa.
Como o fungo causador da podridão peduncular permanece quiescente, ou seja, dormente no fruto até que ele comece a amadurecer, a levedura será mais eficiente se estiver presente na casca do fruto ainda verde. Por isso, só se observam os sintomas na fase de pós-colheita.
Dessa forma, a melhor maneira de fazer o tratamento seria pela aplicação de uma suspensão de células do microrganismo por aspersão nos frutos ainda não maduros, promovendo o controle da doença e garantindo a ausência de resíduos tóxicos do fungicida nos frutos.
Vieira explica que foram selecionadas algumas leveduras que já tinham demonstrado atividade de controle biológico a partir da coleção da Embrapa Meio Ambiente.
“Resolvemos fazer os testes para essa doença em manga, que está se tornando muito importante. Além dos testes, tínhamos de saber como elas exercem esse controle, por isso, o trabalho foi feito nessa linha.”
Os pesquisadores trabalharam com a célula viva em laboratório. Por isso, o produto ainda não está fomulado. “Em tese não é complicado, seria o mesmo sachê, preservado a longo prazo e desenvolvido para dissolver na água e ser usado em spray. O mais importante é a levedura estar viva”, enfatiza Vieira.
Pelo histórico registrado na pesquisa, essa doença é causada por um fungo que resiste ao tratamento por temperaturas mais altas. “O fungicida usado para uma doença parecida não está funcionando”, informa o pesquisador, destacando a vantagem de a levedura não deixar resíduos por não produzir metabólitos.