Estudo realizado em parceria entre a USP e a Unesp destaca a eficiência da combinação desses produtos para controlar a infestação do gorgulho no grão
Estimativas do mercado dão conta que pelo menos 30% dos grãos produzidos em todo o mundo sejam perdidos pro conta das infestações de pragas durante o armazenamento. Uma dessas pragas é o Sitophilus zeamais, conhecido como gorgulho do milho, que atinge os grãos no campo, antes da colheita, e no armazenamento.
Esse inseto pode diminuir o peso, o valor nutricional, a taxa de germinação e o valor comercial dos grãos, além de aumentar a vulnerabilidade à infestação de fungos. Mas os pesquisadores brasileiros podem ter encontrado a solução ao testar combinações de óleos essenciais, principalmente o obtido da erva-de-santa-maria, conhecida popularmente como menstruz, mastruz ou mastruço. Os resultados se mostraram promissores para o combate do inseto nos grãos armazenados.
Os resultados estão no artigo “Synergism between essential oils: a promising alternative to control Sitophilus zeamais (Coleoptera: Curculionidae)”, publicado na revista científica Crop Protection. O estudo foi realizado na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP, em colaboração com uma equipe da Faculdade de Ciências Agronômicas da Universidade Estadual Paulista (Unesp) em Botucatu, ambas em São Paulo
O Brasil ocupa o terceiro lugar no ranking mundial da produção de milho, ficando atrás somente dos Estados Unidos e da China. A expectativa é que o País alcance 116 milhões de toneladas na safra 2021/2022, segundo dados do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) e da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Mas a safra pode estar sujeita a pragas, o que prejudica a produção final.
Atualmente, o combate ao gorgulho do milho é feito com a fosfina, inseticida sintético que é dispersado sobre os grãos, mas que tem sido cada vez menos eficaz, por causa do desenvolvimento de resistência, o que mostra a necessidade de se buscar alternativas para o manejo dessa e de inúmeras outras pragas que têm se mostrado mais resistentes com o uso constante de inseticidas.
Nesse sentido, o uso de óleos essenciais traz ainda vantagens, de acordo com o professor Antônio Eduardo Miller Crotti, do Departamento de Química da FFCLRP e um dos autores do estudo. “Como os óleos essenciais são misturas de substâncias, a probabilidade do desenvolvimento de resistência por parte do gorgulho do milho é bem menor”, afirma.
As espécies
Para a realização do estudo, foram coletadas e identificadas seis espécies de plantas; duas delas bastante conhecidas pela população, a erva-de-santa-maria, Dysphania ambrosioides, e o gerânio, Pelargonium graveolens. As outras quatro espécies, segundo Crotti, são do gênero Piper, o mesmo da pimenta-longa.
Os pesquisadores extraíram os óleos essenciais das folhas dessas plantas e identificaram quais substâncias estavam presentes. Em seguida, realizaram alguns ensaios para investigar a repelência e a toxicidade por fumigação (processo de vapor ou fumaça) desses óleos. Dessa forma, foram avaliados o quão tóxicos foram os óleos essenciais testados quando eles penetraram pelas vias aéreas do gorgulho do milho.
Os pesquisadores testaram 15 combinações de seis óleos essenciais. “Com exceção do óleo essencial da erva-de-santa-maria, todos os demais, quando testados individualmente, não apresentaram toxicidade por fumigação sobre o gorgulho do milho. No entanto, em combinações binárias com o óleo essencial da erva-de-santa-maria, a toxicidade por fumigação das misturas foi bem maior que a soma das atividades dos dois óleos testados individualmente”, relata o professor.
Conforme explica Crotti, o óleo essencial da erva-de-santa-maria não apenas apresentou atividade repelente e fumegante, como também potencializou a toxicidade dos demais óleos essenciais testados frente ao gorgulho do milho.
“Nossos ensaios foram realizados em quintuplicata, com 50 insetos por replicata. Basicamente, dispomos esses 50 insetos em uma câmara de fumigação (um recipiente de acrílico fechado, em cuja tampa encontrava-se o óleo essencial, ou a mistura de óleos essenciais, em diferentes concentrações)”, detalha o professor.
Erva-de-santa-maria
Outra vantagem, segundo o professor, é que a cuja obtenção de grandes quantidades do óleo essencial de erva-de-santa-maria é “relativamente fácil” sem prejuízos à biodiversidade. Além disso, por vir de uma fonte natural, o óleo essencial da erva não agride a biodiversidade. Segundo o professor, “como os óleos essenciais são voláteis, eles possuem baixa persistência no meio ambiente”.
Crotti conta que já existem, na literatura científica, inúmeros estudos sobre atividades biológicas dos óleos essenciais investigados neste trabalho. Contudo, a bioatividade desses óleos frente ao gorgulho do milho nunca havia sido explorada. “Por isso, eu acredito que, além de reportar atividades promissoras, nosso trabalho também reforça a importância da pesquisa por alternativas que sejam economicamente viáveis para a solução de problemas da nossa sociedade e que não fiquem apenas no âmbito acadêmico”, observa o professor.
Além do professor Crotti, também assinam o artigo as pesquisadoras da FFCLRP Lívia Stenico Tanajura e Tatiana Manzini Vieira, e pelos pesquisadores da Faculdade de Ciências Agronômicas da Unesp em Botucatu Edson Luiz Lopes Baldin, Alisson da Silva Santana, Thais Lohaine Braga dos Santos, Yago Alves Baptista, Maria Clezia dos Santos e Ana Paula Santana Lima.