A produção de cafés premium foi a saída encontrada para driblar a queda no preço do grão e as dificuldades de produção em regiões montanhosas, como o Vale do Café. Hoje, fazendas do tempo do Brasil Império estão replantando cafezais e se tornando atrações turísticas
O Estado do Rio de Janeiro já ostentou o título de maior produtor mundial de café. Atualmente, a dificuldade de mão de obra e o relevo acidentado não possibilitam a produção em larga escala.
Entretanto, algumas pequenas propriedades estão começando a gerar ótimos negócios por meio da diferenciação, com a produção dos chamados cafés especiais. Este tipo de produto, também conhecido como “premium”, exige condições singulares de cultivo e preparo, como a agricultura familiar, o cuidado artesanal no plantio, colheita e processamento de frutos, e a maneira de secagem e torra dos grãos.
Outra maneira de movimentar a economia cafeeira fluminense é a união entre a oferta de cafés especiais e o turismo. No Vale do Café, fazendas da época do Brasil Império estão replantando os cafezais e transformando seus casarões centenários em hotéis.
O Vale do Café
Atualmente, cerca de 30 fazendas da região estão abertas à visitação, formando um grande pólo turístico. Na década de 1860, elas chegaram a produziam 75% do café consumido no mundo e garantiam ao Brasil a condição de líder mundial na produção e exportação de café – posição que ocupa até hoje.
Um dos exemplos é o Hotel Fazenda Florença, que fica em Conservatória, distrito de Valença, um dos 15 municípios que compõem o Vale do Café. Na propriedade, é possível visitar os cafezais, a casa grande, e conhecer a gastronomia no restaurante do hotel, onde as comidas caseiras são cozinhadas no fogão a lenha, assim como os deliciosos doces feitos em “tachos” de cobre.
A fazenda, de propriedade de Paulo Roberto Santos, conquistou, no ano passado, o primeiro lugar na terceira edição do Concurso de Cafés Especiais do Rio de Janeiro. O grão apresentado foi do tipo 100% arábica. O prêmio conquistado foi na categoria “natural” — também havia disputa na categoria “úmido”, em que ganhou o Café Ricci, do Sítio Santa Reginalda e Bom Jardim, do produtor Paulo Henrique Ricci.
“Plantamos também pés de figo, jambo, banana, pêssego, jabuticaba, goiaba, acerola, abacate, ingá, tudo isso junto com o café. Tenho certeza de nada, mas, coincidência ou não, o café produzido aqui na Florença tem um sabor frutado maravilhoso, e foi o Café Natural Campeão no Concurso de Cafés Especiais do Estado do Rio”, escreveu Paulo Roberto nas redes sociais do Hotel, ao publicar um vídeo que mostra a florada dos pés de carambola plantados em meio aos de café.
Ressurgimento da cafeicultura fluminense
O concurso é uma das iniciativas do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae-RJ), que junto a outras instituições como a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Rio de Janeiro (Emater-RJ) e as Secretarias de Agricultura dos Municípios, vem fomentando o ressurgimento da cafeicultura no Rio de Janeiro.
No Estado, existem cerca de 2.600 cafeicultores, sendo 80% formados por pequenos produtores. No início dos anos 2000, “éramos 1.300 cafeicultores e o aumento nestes últimos 20 anos, deveu-se principalmente aos esforços emprenhados e na realização de projetos que resultaram em melhores formas de comercialização do produto”, conta Moacyr Carvalho Filho, presidente da Associação dos Cafeicultores do Estado do Rio de Janeiro (ASCARJ), entidade copromotora do concurso.
A produção no Estado
O Rio de Janeiro é o quinto Estado em volume de produção. Em 2018 produziu 346 mil sacas de café commodity, segundo levantamento feito pela Embrapa Café. A predominância no cultivo é do tipo arábica, com a cafeicultura de montanha, o que dificulta e encarece a produção em larga escala.
De acordo com Moacyr Filho, “hoje, o preço do café na bolsa de Nova York está abaixo dos custos de produção nessas regiões”. Por isso, a saída para driblar as perdas com a queda no preço do grão foi o investimento na produção de cafés especiais.
“Eles podem ser comercializados por valores muito acima daqueles referenciados pela bolsa de Nova York. Este segmento cresce cerca de 15% ao ano. E é este mercado de “Cafés Premium” que nos interessa atender”, afirma o presidente da ASCARJ.
No ano passado, devido a condições climáticas desfavoráveis, houve uma redução na produção de cafés especiais, entretanto o Estado é o segundo consumidor nacional da bebida. O consumo per capta fluminense ultrapassa 6,0 Kg por ano.
Qualidade no cultivo
Moacyr Filho explica que, “diferentemente de outras commodities, como soja e milho, o café é uma cultura permanente e é colhido uma vez por ano. O produtor, portanto, precisa estar preparado para as oscilações de preço e continuar sempre cuidando de sua lavoura, otimizando ao máximo a aplicação de seus recursos. É o que está sendo chamado de agricultura de precisão”.
Segundo ele, o foco principal destes projetos de recuperação da cafeicultura fluminense era — e continua sendo ainda hoje — a melhoria da qualidade do café produzido.
No Rio de Janeiro, além do Vale do Café, existem outras duas regiões produtoras do grão: a Noroeste, com mais de 80% da produção, com destaque para os municípios de Varre-Sai, Porciúncula e Bom Jesus de Itabapoana; e a Serrana, com cerca de 19% da produção, concentrada principalmente nos municípios de Bom Jardim, Duas Barras e São José do Vale do Rio Preto.
Diferença entre cafés de Via seca (natural) e Via úmida
Via seca (natural)
A via seca é a mais comum no Brasil. O café é colocado em terreiros para secar, resultando em um café natural, com a casca. Os terreiros costumam ser de cimento ou asfalto, assim os grãos não adquirem gosto de terra. É recomendável um lugar com boa incidência de luz.
Os grãos são espalhados nos pátios em camadas finas, que serão revolvidas várias vezes ao dia para que a secagem seja mais rápida e uniforme. Durante a noite, são reunidos e cobertos com lonas para proteção contra o orvalho. O processo deve ser refeito até que a umidade seja reduzida para aproximadamente 40%.
Ao atingir o teor de umidade adequado, os frutos são transferidos para os secadores, sendo monitorados até que a umidade chegue a 11,5% ou 12%. Antes de ser deixado no terreiro, o café deve ser passado pelo lavador, onde os grãos são separados por densidade: o café boia, que já perdeu umidade no pé, tem densidade menor e por isso flutua; cafés cereja e verde são pesados e afundam, uma forma de controlar a qualidade do café.
Via úmida
O processo por via úmida resulta nos cafés descascados (cereja descascado) e despolpados (ou lavados), após a colheita e limpeza os grãos cereja e verde seguem para o lavador. O despolpamento se faz em máquinas, os despolpadores.
Os grãos são submetidos a uma pressão ao passar entre um cilindro com furos. Nesse processo a casca sai de um lado, os grãos verdes do outro e o café despolpado passa pelos furos. A água é uma auxiliadora na separação da casca. Separada a casca, o café pode ser levado ao terreiro para a secagem, obtendo assim, um café cereja descascado. O processo de secagem deve ser cuidadoso, o café é distribuído em camadas de 2 a 3 cm de altura e mexido com frequência.
O terreiro de chão batido favorece a ocorrência de sujeiras e fermentações. Já o terreiro de piso revestido traz um produto de qualidade superior, já que oferece uma secagem mais eficiente e uniforme, além de reduzir a ocorrência de contaminação por impurezas e fermentações.